Com os Movimentos na Igreja

D. Ilídio Leandro, Bispo de Viseu

Os Movimentos na Igreja. Presença do Espírito e Esperança para os Homens” – é o título da tradução portuguesa de uma pequena reflexão sobre este tema, feita pelo Papa Bento XVI, no Pentecostes de 2006. Gosto deste título – traduz o que penso dos Movimentos, aponta, com clareza, o lugar que lhes pertence na Igreja e o que podem significar, olhando o futuro de uma Igreja que quer anunciar a Boa Nova de Jesus Cristo.

Os Movimentos na Igreja podem ler-se e interpretar-se à luz do capítulo XII da Primeira Carta de S. Paulo aos Coríntios. Procedem, todos, do Espírito Santo; orientam-se, todos, para o bem da Igreja; estão na Igreja como os membros no corpo humano. Estes são critérios que ajudam ao seu discernimento – missão dos Pastores nas Comunidades Cristãs. Aliás, o Papa Bento XVI, aquando da sua visita a Portugal, em Fátima, no dia 13 de Maio passado, aponta aos Bispos uma nota importantíssima: «Os portadores de um carisma particular devem sentir-se fundamentalmente responsáveis pela comunhão, pela fé comum da Igreja e devem submeter-se à guia dos Pastores. São estes que devem garantir a eclesialidade dos Movimentos. Os Pastores não são apenas pessoas que ocupam um cargo, mas eles próprios são carismáticos, são responsáveis pela abertura da Igreja à acção do Espírito Santo».

Todos, de alguma forma, sabíamos isto: os Bispos e os Responsáveis e seguidores de um Movimento. Penso que, nem uns nem outros temos tido coragem e consciência para reconhecer e, sobretudo, actuar de que é nesta abertura, nesta clareza e nesta confiança que, para bem e fidelidade ao Espírito e à Igreja devemos agir. Tudo isto, numa docilidade, simples e obediente, ao Espírito Santo. No mesmo discurso, dizia Bento XVI: «A propósito, confesso-vos a agradável surpresa que tive ao contactar com os Movimentos e novas Comunidades Eclesiais. Observando-os, tive a alegria e a graça de ver como, num momento de fadiga da Igreja, num momento em que se falava de «Inverno da Igreja», o Espírito Santo criava uma nova primavera, fazendo despertar nos jovens e adultos a alegria de serem cristãos, de viverem na Igreja que é o Corpo vivo de Cristo. Graças aos carismas, a radicalidade do Evangelho, o conteúdo objectivo da fé, o fluxo vivo da sua tradição comunicam-se persuasivamente e são acolhidos como experiência pessoal, como adesão da liberdade ao evento presente de Cristo».

Está aqui, no meu entendimento, a doutrina fundamental sobre a sua importância, o seu lugar e a sua missão na Igreja. Ainda, o tempo da sua vigência e actualidade. De facto, não são “eternos”, no sentido de cada um ser indispensável. Indispensável é a presença do Espírito Santo que suscita, em cada tempo, a forma concreta de ser acção e força renovadora e transformadora, ao serviço da salvação. Em cada tempo, surgem outros novos, com novas expressões, com nova vitalidade e provocando novo entusiasmo. Tenhamos a consciência e a certeza de uma coisa importante: o Espírito Santo não se repete, não envelhece, não pára na Sua missão e não desiste de renovar a face da terra.

Creio firmemente que, enquanto manifestação do Espírito em cada tempo, os Movimentos são indispensáveis à vida da Igreja e têm um lugar insubstituível na Iniciação Cristã de muitos baptizados, levando-os ao encontro pessoal com Jesus Cristo. É o que Bento XVI disse aos Bispos Portugueses. A “agradável surpresa”, atrás citada e que o Papa partilhou, estava na sequência de um desejo de João Paulo II que citou no discurso. O seu Antecessor falava da necessidade que a Igreja tem de “grandes correntes, movimentos e testemunhos de santidade entre os fiéis”, acrescentando Bento XVI que poderia alguém dizer: «É certo que a Igreja tem necessidade de grandes correntes, movimentos e testemunhos de santidade…, mas não os há»! Porque os Movimentos são essenciais e indispensáveis à Igreja e porque o Espírito Santo não pára e não desiste, não O extingamos, com a nossa inacção, com a nossa intolerância ou vontade de controlo ou com a nossa falta de discernimento positivo, exigente e responsável, no amor e serviço à mesma Igreja!…

Tudo o que o Papa disse aos Bispos, no mesmo discurso, parece ter em pensamento esta mesma ideia. Enuncio, apenas, alguns pontos concretos em que o Papa parece apontar, ainda que não expressamente, a importância dos Movimentos: a Iniciação Cristã, “exigente e atractiva”; a “necessidade de verdadeiras testemunhas de Jesus Cristo, sobretudo nos meios humanos onde o silêncio da fé é mais amplo e profundo”; o apelo a que se continuem a estimular os que, nos lugares ‘difíceis’, “defendem com coragem um pensamento católico vigoroso e fiel ao Magistério”; a urgência de “inculcar em todos os agentes evangelizadores um verdadeiro ardor de santidade”; a certeza de que “aquilo que fascina é sobretudo o encontro com pessoas crentes que, pela sua fé, atraem para a graça de Cristo dando testemunho d’Ele”, etc.

Na Pastoral da Igreja e, no momento em que a Conferência Episcopal Portuguesa está apostada em “repensar a Igreja em Portugal”, os Movimentos e as novas Comunidades Eclesiais são chamados a ter um lugar muito importante neste caminho. Há aspectos na renovação da Igreja e na sinodalidade que se sente urgente incrementar nas Dioceses do nosso País e que são já prática de acção de muitos carismas e de muitas experiências que muitos Movimentos vão fazendo. Precisamos de contar mais uns com os outros e de praticar o acolhimento, o diálogo e a comunhão, de forma concreta, aceitando que é o mesmo Espírito a conduzir a Igreja onde todos nos situamos.

Neste caminho, verdadeiramente iluminadora e orientadora é a “condição necessária” apontada por Bento XVI aos Bispos: «que estas novas realidades queiram viver na Igreja comum, embora com espaços de algum modo reservados para a sua vida, de maneira que esta se torne depois fecunda para todos os outros». Entender esta condição é decisivo – para os Bispos e Sacerdotes e para todas estas “novas realidades”. Há que fazer caminho, com muita humildade, conhecendo-nos e escutando-nos mutuamente, prosseguindo este necessário e urgente equilíbrio.

Uma nota final: ninguém deverá invocar que o ‘seu’ é o melhor e que os outros são dispensáveis… S. Paulo, com a imagem do corpo humano, explica a hierarquia, o lugar e a necessidade de todos para o bem comum. Bento XVI dizia, no Pentecostes de 2006, que os Movimentos na Igreja contribuíam para “proclamar a alegria de crer em Jesus Cristo e renovar o compromisso de Lhe ser discípulo fiel neste nosso tempo” (cf Os Movimentos na Igreja, p. 7). Este nosso tempo não pode nem deve perder as oportunidades do Espírito.

D. Ilídio Leandro, Bispo de Viseu

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