Clonagem Humana Terapêutica

Luís Archer – Biólogo Clonagem Humana Terapêutica De que se trata? A clonagem não-reprodutiva com finalidade terapêutica começa, tal como a clonagem reprodutiva, pela transferência do núcleo de uma célula somática (isto é, não sexual) de um adulto para um ovócito (ou óvulo) a que previamente se havia extraído o seu núcleo. Se esse ovócito transnucleado entrar em divisão celular e originar um “embrião”, este, em vez de ser transferido para o útero de uma mulher (como na clonagem reprodutiva), será desenvolvido in vitro até à fase de blastocisto com cerca de centena e meia de células, para se extrairem então, do seu interior, umas células especiais chamadas estaminais (stem cells). Estas são ainda suficientemente indiferenciadas. Em determinados meios podem multiplicar-se in vitro indefinidamente, mantendo a sua indiferenciação. Mas, cultivadas noutros meios, podem diferenciar-se in vitro de modo a produzirem, à imitação do que sucede in vivo, os vários tecidos do adulto (tecido nervoso, muscular, cartilagíneo, ósseo, etc.) que são então transplantados para o dador do núcleo com a esperança de o curar de doenças como Alzheimer, Parkinson, imunodeficiências primárias, afecções de ossos ou cartilagens, paraplegias, cancro e muitas outras. Nestas transplantações não haverá o problema de imuno-rejeição, visto haver identidade genética entre os tecidos do dador e os do receptor. Dificuldades. São várias. Em primeiro lugar, para obter um “embrião” por este método, são necessárias centenas de tentativas fracassadas, o que exige que muitas mulheres estejam na disposição de fornecerem ingloriamente os seus ovócitos, com o perigo de que se caminhe para o sacrifício injusto da mulher ou para a tão condenada comercialização de gâmetas femininos. Em segundo lugar, os clones de mamíferos até agora obtidos (ovelha Dolly e muitos outros) sofrem de várias doenças e malformações. É de supor que as mesmas deficiências afectem os tecidos obtidos pela clonagem não-reprodutiva, que poderão ter efeitos negativos no paciente. Finalmente, até o próprio “pai” da ovelha Dolly, Ian Wilmut, acha que a técnica de clonagem não-reprodutiva é demasiado complexa e dispendiosa para se aplicar a cada paciente. Será mais viável partir das células estaminais dos muitos embriões que sobram de técnicas de reprodução assistida. Só que, nesse caso, não haverá identidade genética entre essas células e as do paciente, e será preciso ultrapassar o problema da imuno-rejeição. Perplexidades éticas. Trata-se de, para benefício próprio, interromper e desviar um processo embrionário que poderia dar origem a um ser humano como eu. Sacrifico uma vida humana em embrião, para a transformar num stock de tecidos meus, sobresselentes, que me curem a mim. Soa-me a atroz egoísmo e quase neo-escravatura. Mas mesmo entre os autores que não subscrevem esta objecção, muitos se mostram preocupados com a transformação do estatuto da vida humana incoativa em algo semelhante a uma fábrica de produtos úteis. E essa preocupação aumenta ao constatarem-se as pressões comerciais que impulsionam a investigação em embriões humanos. Pode caminhar-se para a erosão do respeito pela dignidade intrínseca da vida humana. Melhor alternativa. As células estaminais não existem apenas nos embriões. Encontram-se também, ainda que em menor número, em órgãos do adulto. Há claras indicações de que elas se podem diferenciar in vitro em tecidos vários, diferentes daquele de que são originárias. Esta é uma alternativa válida, contra a qual não há objecções éticas, e em que o paciente é tratado com tecidos obtidos a partir das suas próprias células estaminais, evitando-se assim os problemas de imuno-rejeição. É possível que não seja economicamente tão rentável como a utilização de embriões, e por isso seja preterida, já que o poder económico domina hoje o progresso da ciência. Luís Archer Biólogo

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