Cinema: Mel – O murmúrio dos afectos…

É numa das magníficas florestas da Turquia que vive Yusuf, um rapazinho imerso no seu mundo, alheado das brincadeiras dos seus pares e sempre de olhos postos no seu pai, apicultor e, certamente, o seu melhor amigo.

Apesar do enorme esforço para ler como os outros, o que é dificultado pela sua gaguez, os olhos de Yusuf não escondem que a sua maior paixão está muito longe dos bancos da escola e das páginas longínquas dos cadernos que passam, hesitantes, pelas suas pequenas mãos.

Ela está mesmo ali, concentrada em torno da sua casa, da vida em família e sobretudo, na figura do seu Pai: os instrumentos que ele faz para a apicultura, o tratamento que dá às colmeias, a recolha dos cortiços, o modo como transforma pequenos pedaços de madeira, a histórias que conta, as orações que reza, os passeios pelo campo… ensinamentos expressos com ou sem palavras que Yusuf dificilmente encontrará na escola. Como aquele que o Pai lhe sussurra quando Yusuf lhe quer contar um sonho: “…os sonhos não devem ser espalhados. Conta-me ao ouvido…”. E é somente neste sussurro que Yusuf consegue falar, fluentemente, sem qualquer hesitação.

Um dia, porém, este pai parte em trabalho e tarda em voltar.

Que fará Yusuf com esta ausência?…

Arrecadando sem margem para dúvidas o Urso de Ouro de Berlim 2010 e o Prémio Signis da Associação Católica Internacional para a Comunicação no mesmo festival, “Mel” é, decididamente um dos mais belos e extraordinários filmes do ano! Não admira pois que, além dos referidos, venha colhendo a admiração e o aplauso por todo o lado por onde tem passado.

Além do admirável pequeno grande actor que é Bora Altas, o menino que dá vida a Yusuf – e a quem se deseja que nunca perca esta incrível naturalidade, é extraordinária a forma equilibrada com que o realizador turco Semih Kaplanoglu gere a sua narrativa: lisura, poesia combinam-se neste conto que, em muito poucas palavras mas riquíssimas imagens e fortíssima mensagem nos mergulha na profundidade de temas como o amor ou a ausência e releva a importância da transcendência na busca de um sentido para a vida.

Margarida Ataíde

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