Bragança-Miranda: Homilia de D. Nuno Almeida na Missa Vespertina da Ceia do Senhor

Foto Diocese Bragança-Miranda

A Eucaristia faz da Igreja família e de cada família uma pequena Igreja

1.Irmãos caríssimos: A celebração da Eucaristia da Ceia do Senhor introduz-nos sacramentalmente no Tríduo Pascal, de Cristo morto, sepultado e ressuscitado. Nesta celebração, recordamos e atualizamos sacramentalmente, a instituição da Eucaristia e do sacramento da Ordem, o mandamento novo do amor e o gesto profético do lava-pés, que aponta para o despojamento de Cristo na Cruz e nos desafia à humildade do serviço. Jesus antecipou, na Ceia, o acontecimento do seu Corpo dado e do seu sangue derramado por nós, na Cruz! Sem Cristo vivo, toda a celebração seria impossível. Mas o Senhor vivo é o mesmo que esteve morto na cruz. Por isso, “nesta Missa de 5ª feira santa, vemos a Ceia gerando a Cruz”. Deixemo-nos tocar e envolver pelos sentimentos de Jesus, que Se faz Servo e nos torna servidores do Seu mistério de amor.

2.Os judeus, pastores e agricultores, deitavam mão dos seus cordeiros e das primeiras espigas, para de maneira viva, celebrar a Páscoa, que trazia à memória a libertação da escravidão do Egipto e faz com que o povo de Israel se ponha em marcha em direção à Terra da Promessa. Tudo isto nos recordou a Primeira Leitura do Livro do Êxodo.
S. Paulo, na Segunda Leitura proclamada da 1ª Carta aos Coríntios, dá-nos conta do relato mais antigo da instituição da Eucaristia. Ela celebra a entrega do Senhor, antecipada de forma sacramental e visível no convívio da Ceia Pascal. Cada vez que celebramos a Eucaristia celebramos a Páscoa, ou seja, a passagem de Jesus do mundo para o Pai, a entrega, a paixão, morte e ressurreição do Senhor até que Ele venha.

3.A Quinta-Feira Santa é, pois, um dia de gratidão e de alegria, pelo grande dom do amor até ao extremo, que o Senhor nos fez. Como testemunho do seu amor aos seus discípulos e à humanidade, na hora da despedida, Jesus não nos deixou uma lembrança, uma imagem, um dom memorável, um objeto querido de estimação, à maneira humana. O seu testamento é o seu sacrifício. E o seu sacrifício é Ele mesmo.

Eis o mistério admirável, maravilhoso da nossa fé: do Deus connosco, Deus para nós e Deus por nós! Que mais podia fazer Jesus por nós? Verdadeiramente, na Eucaristia mostra-nos um amor que chega “até ao extremo” “amou-os até ao fim” (Jo 13,1), “um amor que não conhece medida“ (João Paulo II, Ecclesia de Eucharistia, n.11). Amor que dá a própria vida para a vida do mundo, também do nosso mundo, de cada um de nós!

4.“Fazei isto em memória de Mim”! Desde há dois mil anos, a Igreja vive da memória da Páscoa de Jesus, memória que não é, apenas, recordação do passado e da morte, mas um presente vivo e empenhativo, pois a Igreja guarda no seu coração o calor redentor desse dom de Jesus Cristo da sua própria vida, «na hora de passar deste mundo para o Pai» (Jo.13, 1).

Os cristãos foram dispersos pela perseguição, partiram para longínquas terras em missão, dispersaram-se no meio do mundo, qual fermento na massa, mas em todas as circunstâncias celebraram a Eucaristia, encontrando nela a força para viver em comunidade, na comunhão fraterna. Aí aumentaram a firmeza da fé, na fidelidade à tradição apostólica, aí beberam a energia para partir em missão, aí interiorizaram o sentido novo da fraternidade. Realmente a Eucaristia faz a Igreja. Esta afirma-se e subsiste nas comunidades que se congregam para celebrar a Páscoa do Senhor. São elas que consolidam a tradição viva, em que uma geração comunica à outra o tesouro vivo da salvação, mantendo-a em contacto com a nascente da graça, que é Cristo ressuscitado.

5.Ao congregar semanalmente os cristãos como família de Deus à volta da mesa da Palavra e do Pão de vida, a Eucaristia dominical é também o antídoto (remédio) mais natural contra o isolamento; é o lugar privilegiado, onde a comunhão é constantemente anunciada e fomentada. Precisamente através da participação eucarística, o dia do Senhor torna-se também o dia da Igreja” (cf. N.M.I. 36).  O dia em que a Igreja se manifesta e acontece. A Eucaristia faz da Igreja família e de cada família uma pequena Igreja. Não é só a Igreja, que cresce como grande família, à volta da mesa da Eucaristia. É também a família de cada um de nós, que cresce como pequena igreja (igreja doméstica), sempre que participa na Eucaristia!

Cada vez que sai de casa, para participar na Eucaristia, a família cristã toma consciência de que não se basta a si própria, não se constrói pelas suas próprias mãos e habilidades, e que, sozinha, não é capaz de dar resposta à sede de amor e de sentido para a vida, que está no coração de cada um! Ao participar na Eucaristia, a família lança as suas raízes no amor de Cristo, alimentando-se na mesa da Palavra e do Pão! É esta nova e larga mesa que dará novo sabor e sentido pleno ao sentimento do amor, às palavras e ao alimento, compartilhado em casa e à mesa!

Mais ainda: participando na Eucaristia, a família dedica espaço e tempo, oferece energias e recursos, e aprende que a vida não é feita unicamente de necessidades básicas a atender, mas sobretudo de relações de intimidade, de gratuidade e de amor, a construir! Na Eucaristia, a família encontra o segredo da sua unidade e do seu amor! Quanto mais a família se aproxima desta poderosa fonte de amor, mais ela protegerá a sua estabilidade! Na medida em que a Eucaristia introduz a família no coração de Deus, ela faz a família! E a família, no seio da comunidade cristã, de certo modo, faz a Eucaristia!

6.Nesta noite de Quinta-Feira Santa, queremos, em intimidade familiar com Cristo, lembrar e propor às famílias: Sede um Cenáculo em miniatura, como o de Maria e dos discípulos, com Jesus no meio de vós, onde se vive a unidade, a gratuidade, a comunhão, a oração. E vós, os mais jovens, deixai que a Eucaristia plasme, no dom e na alegria da comunhão, a vossa vida e a vida das famílias, que haveis de formar.

Peçamos ao Senhor que, a partir da celebração fiel da Eucaristia, cada vez mais as nossas famílias se tornem uma pequena e verdadeira “Igreja doméstica”, e a Igreja de Jesus cresça e apareça no mundo como uma “grande família”. Deste modo, também cada paróquia, nutrida e reunida à volta desta mesa da Eucaristia, se tornará sempre, e cada vez mais, uma família de famílias, e a nossa Diocese seja realmente comunidade de comunidades com um rosto sinodal e samaritano!

 

Recordando, Senhor, o que fizeste naquela tarde,

em que lavaste os pés aos Teus amigos,

temos o essencial do ser cristão,

que é servir, cuidar, amar e facilitar a vida.

 

ConTigo aprendemos logo a viver,

porque o ensinas com o Teu agir,

porque pões a toalha à cintura,

lanças-Te por terra

e lavas um a um,

a parte mais suja do corpo,

os pés suados e com a poeira dos caminhos.

 

A nós pedes que vivamos sempre em atitude de serviço,

para ajudar quem precisa,

para dar a mão,

para partilhar as dores,

para festejar as alegrias,

para rezar e celebrar juntos,

para suavizar o peso da vida.

“Como Eu fiz, fazei vós também!”

Do sacramento ao exemplo!

Somos discípulos de Jesus Cristo que está sempre connosco.

Precisamos de um novo encanto e amor a Jesus Eucaristia.

Urge sermos testemunhas deste amor!

 

“Como Eu fiz, fazei vós também!”

Do sacramento ao exemplo!

Digamos sim à Vontade do Pai, amando até ao fim! Ámen!

+Nuno Almeida
Bispo de Bragança-Miranda

Catedral de Bragança, Quinta-Feira Santa, 28.03.2024

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