Boas Vindas ao Cinema Francês

Ao longo de muitos anos o cinema policial francês fixou-se entre os melhores da Europa e, mesmo que em estilo diferente, fazia sombra aos congéneres americanos. Entre os seus autores, mesmo que já na época de redução deste cinema em França, Claude Chabrol tornou-se inevitável para os apreciadores do género. «O Carniceiro» (1970), «A Década Prodigiosa» (1971) ou «Núpcias Vermelhas» (1973), entre muitos outros, fizeram as delícias dos apreciadores do mistério ou dos intrincados puzzles que rodeiam a execução de um crime premeditado. Mas Chabrol tinha uma outra vertente em todos os seus filmes: a crítica da burguesia e dos seus vícios. «A Rapariga Cortada em Dois» vem precisamente cruzar os dois elementos preferidos de Chabrol. O filme começa como uma cuidadosa análise da sociedade, pondo em confronto dois homens que pretendem a mesma mulher, um dos quais é um escritor com uma mente pervertida, enquanto o outro, vivendo de largos rendimentos, tem uma ponta de loucura no seu comportamento. Ambos se movimentam numa sociedade sem grandes preocupações, em vidas abastadas ou, no mínimo, sem dificuldades financeiras ou preocupações com terceiros. E é entre os dois que a protagonista se divide, fica “cortada” na sua atracção, mas não fisicamente numa sequência sanguinolenta que título deixaria prever e que, apenas simbolicamente, se sugere no final num bem conhecido número de circo. Entretanto, quando a narrativa se encaminha para o seu termo, introduz-se a componente policial, em que o crime terá de ser punido mas numa proporção e de uma forma que não é precisamente a que se esperaria. Sempre rigoroso na realização, com uma impecável direcção de actores, Chabrol continua, aos 77 anos, a revelar uma excelente forma e uma ginástica mental capaz de construir caminhos intrincados sem quebra da lógica ou da verosimilhança. Francisco Perestrello

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