Açores: Romarias quaresmais de São Miguel canceladas por causa da pandemia

João Carlos Leite afirma que é uma «teologia dos afetos que fica adiada»

Angra do Heroísmo, Açores, 12 jan 2021 (Ecclesia) – O presidente da Associação Movimento de Romeiros de São Miguel, na Diocese de Angra, anunciou o cancelamento das romarias da Quaresma de 2021, por causa da pandemia de Covid-19.

“Estamos a falar de muito mais do que de uma caminhada física de sete dias; trata-se de toda a uma teologia dos afetos que fica adiada”, explica João Carlos Leite ao sítio online ‘Igreja Açores’.

O responsável assinala que, pelo segundo ano consecutivo, a Covid-19 obriga a este cancelamento e cerca de 2500 homens ficam impedidos de percorrer as estradas da ilha açoriana de São Miguel.

O confinamento em março de 2020 cancelou as saídas dos ranchos de romeiros na terceira semana da Quaresma mas, antes, alguns grupos ainda deram a volta à maior ilha do Arquipélago dos Açores numa semana onde “há toda uma envolvência da comunidade micaelense desde o intercâmbio de orações e rezas”.

“Inúmeras famílias a rezarem pelos romeiros e estes pelas famílias; o acolhimento nas paróquias; a entreajuda entre grupos de homens sem atender à profissão ao estatuto social, tudo isso fica diminuído”, lembra João Carlos Leite.

Os romeiros que “não ficam nas paróquias e vão para salões, nomeadamente na Povoação e no Nordeste”, recebem apoio de “grupos de senhoras”.

“Tudo isto se perde. Neste momento todas as nossas atividades estão suspensas”, indica o presidente da Associação Movimento de Romeiros de São Miguel, referindo que também já cancelaram o retiro anual, no terceiro fim de semana de janeiro, e que já tinha sido adiado por causa das eleições presidenciais, e reúnem “mensalmente na primeira segunda-feira de cada mês de forma virtual”.

A associação está a desenvolver um plano de resgate do património das romarias que pretende registar as Romarias Quaresmais de São Miguel no Património Cultural e Imaterial Nacional e João Carlos Leite realça que “este trabalho tem de continuar”.

“Os Romeiros são uma prática de vivência de Igreja única e para além do aspeto cultural há todo um legado que tem de ser deixado. Para além da vivência religiosa há um humanismo que as romarias proporcionam através da amizade, da partilha, da ajuda ao irmão, do acolhimento social. Para alguns é uma semana em que sentem que são tratados com a dignidade que merecem”, salientou.

A Igreja Católica começa a viver um “ano especial” dedicado à família, a partir de 19 de março, ainda no tempo da Quaresma, e o presidente da Associação Movimento de Romeiros de São Miguel destaca que “o intercâmbio das famílias também fica cancelado”.

“Há famílias que quando os seus romeiros estão na rua não dormem, levantam-se de madrugada para levarem o pequeno-almoço, para dizerem presente. Há teias de amizade entre famílias que se tecem no movimento. Não se trata só da caminhada física, que é cancelada; é o intercâmbio das famílias que fica adiado”, explicou ao ‘Igreja Açores’, sítio online informativo da Diocese de Angra

As romarias quaresmais de São Miguel completam 500 anos em 2022; segundo a tradição, tiveram origem na sequência de terramotos e erupções vulcânicas registados no século XVI na ilha, que arrasaram Vila Franca do Campo e causaram grande destruição na Ribeira Grande.

Os ranchos tradicionais, onde só homens podem participar (surgiram entretanto romarias de mulheres, em São Miguel e na ilha Terceira), são organizados e devem cumprir um percurso, sempre com mar pela esquerda, passando pelo maior número possível de igrejas e ermidas de S. Miguel; existem também na ilha Terceira e na Graciosa, no Canadá e nos Estados Unidos da América.

CB/OC

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Agência ECCLESIA

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