A responsabilidade social das Organizações

I Parte 1 – Existe uma forte consciencialização internacional, claramente expressa nas resoluções das Nações Unidas, quanto à necessidade de haver a nível global, um modelo de desenvolvimento sustentável, que articule de forma equilibrada, o crescimento económico com a equidade social e a protecção ambiental. É também assumido que o desenvolvimento sustentável só é possível se alguns princípios básicos forem interiorizados e assumidos pelos actores sociais na sua esfera de acção, com especial relevo para as empresas como actores sociais decisivos, mas também de toda a sociedade civil. 2 – A nível europeu é de destacar a participação da Comissão Europeia na promoção da RSE (Responsabilidade Social da Empresa), nomeadamente através da apresentação do Livro Verde, da integração do tema em todas as políticas da U.E. e do desenvolvimento de um conjunto de acções orientadas para apoio à implementação da RSE ao nível empresarial. Em Portugal, no âmbito dos acordos estabelecidos a nível mundial e perante estratégias definidas pela União Europeia, a RS surge com carácter de sistematização nas directrizes inscritas no PNEDS (Plano Nacional de Emprego para o Desenvolvimento Sustentável) e no PNE (Plano Nacional de Emprego), que de forma directa ou indirecta, visam a sua promoção. 3 – A prática de RSE tem surgido frequentemente associada às grandes empresas sendo o envolvimento das PME menos conhecido. Estudos internacionais mostram uma especificidade própria, tanto no que respeita às suas motivações, como ao contorno das práticas de SER utilizadas. As análises efectuadas em países europeus, evidenciam que as PME estão implicadas, embora em graus diferentes, nas questões de RSE, assumindo que têm responsabilidade para com os seus trabalhadores, a comunidade e o ambiente. Todavia esta preocupação não surge explicitada formalmente. Assume antes um carácter informal, não estruturado e que nem sempre se apresenta para os empresários de forma muito clara e consciente. Além disso, ao contrário das grandes empresas, nas PME, a RSE está fundamentalmente dirigida à dimensão interna e enquadrada no processo quotidiano de gestão. A RSE situa-se no cruzamento da procura de eficácia de gestão com a ética empresarial, conjugando a lógica gestionária com a afirmação de cidadania empresarial. 4 – A análise do inquérito feito às PME em Portugal mostra que a situação portuguesa não é significativamente diferente da das suas congéneres europeias. Predominam práticas informais de carácter ocasional, não estruturadas formalmente, e não integradas na estratégia da empresa. Verifica-se um certo desconhecimento do tema. Enquanto conceito está associado ao cumprimento das normas legais, todavia enquanto prática, está bastante presente na realidade das PME portuguesas, sendo um importante recurso de gestão interna. Esta dualidade, reflecte o facto da RSE ser adoptada predominantemente numa lógica de obrigação, por obrigação legal ou por imposição das regras de mercado. O exercício de RSE assume-se sobretudo como um reflexo de procura de melhoria dos indicadores de gestão e secundariamente, está associado a questões éticas e de boa cidadania, sempre presentes, mas nem sempre assumidas de forma clara e consciente. Existe uma clara percepção nas PME estudadas de que a RS tem um valor económico directo, surgindo como um importante factor de competitividade. 5 – Encarar a RSE como parte integrante de sustentabilidade, a longo prazo, onde exista evidência de que esta é levada a sério, marcando uma posição pró-activa no sentido de fazer face a problemas significativos de pobreza, exclusão social e degradação ambiental, consideradas no âmbito da gestão é ainda incipiente. Os casos mais significativos deste posicionamento, são as Redes de parceria entre diferentes organizações orientadas para a RSE, onde alguns projectos são desenvolvidos com esta vertente. A criação de Redes de Parceria social ganha, no actual contexto um novo espaço de intervenção. A complexidade das situações, a que importa dar resposta, e a escassez de recursos financeiros, não possibilita que uma organização consiga intervir de forma adequada na resolução de problemas sócio económicos ou ambientais. Assim, novas formas de parceria surgem como instrumento de acção fundamental, permitindo agrupar sinergias e potenciar acções que ultrapassam o âmbito de cada organização/parceiro individualmente. Os casos conhecidos mostram que as recentes formas de parcerias estabelecidas entre empresas, actores públicos e outras organizações da sociedade civil, podem constituir uma importante via para a promoção e desenvolvimento da SER, potenciando soluções benéficas para as organizações que dela fazem parte e para a comunidade em geral. Foi referido de forma especial o “Programa da Oeiras Solidária” que envolve a C. M. de Oeiras e um número elevado de empresas. 6 – Os vários conceitos associados ao desenvolvimento sustentável e à RSE, devem estar presentes desde o ensino básico, às licenciaturas e pós-graduações. De igual modo, os conceitos de desenvolvimento sustentável e RSE devem estar incluídos nos programas de aprendizagem ao longo da vida (formação contínua), estimulando a introdução e o incremento de novas formas práticas de RSE. Fomento de princípios de equidade e de honestidade nas relações entre as empresas entre si e com o Estado, e de igual modo com os “stake holders” no sentido de haver uma sanção predominantemente social e moral para os prevaricadores para além de outras formas de sanção de carácter jurisdicional, fortemente valorizadas por todos. Uma atitude de cooperação Institucional entre Estado, empresas e Organizações da sociedade civil é essencial para uma efectiva promoção da RSE. II Parte 7 – Face à crise ambiental extremamente grave e a grandes desequilíbrios sociais, o caminho para um desenvolvimento sustentável exige uma mudança urgente nas atitudes e nas instituições. No entanto, a mudança que se vem processando nas atitudes e nas instituições não são coerentes, dado que se processam em sentidos opostos. 8 – Por um lado, um sentimento de responsabilidade individual e colectivo em relação à natureza e à sociedade tem-se vindo a desenvolver, fazendo nascer não só uma maior base de apoio a politicas sociais e ambientais, mas também, aumentando a disposição individual para cumprir normas e condutas favoráveis ao ambiente e à sociedade. Por outro lado, o mundo vem testemunhando uma transformação no capitalismo, que no fundamental se traduz numa deslocação do controlo das empresas da gestão para os mercados financeiros o que implica o domínio da valorização accionista, relativamente a outro tipo de considerações ou valores. 9 – Dado que a evolução futura do desenvolvimento sustentável depende, de forma crítica, das estratégias empresariais, os apelos à responsabilidade social das empresas são cada vez mais fortes. Contudo, num contexto em que as empresas estão cada vez mais sujeitas às pressões dos mercados financeiros, esses apelos podem ser em vão. 10 – A responsabilidade Social individual ou da empresa pressupõe um contexto institucional em que as preocupações éticas dos indivíduos sejam cultivadas. Isto pressupõe um realinhamento das empresas/instituições do capitalismo de modo a que as mesmas sejam levadas a partilhar os valores da sustentabilidade. Boas instituições, com respeito pela responsabilidade social, serão aquelas em que os gestores tenham autonomia para decidir da liquidez accionista e ao mesmo tempo incluir nas preocupações de gestão o efeito desta, junto dos múltiplos “stake holders”, (accionistas, trabalhadores, clientes, fornecedores, credores, ambiente e comunidade local). Nesta situação o gestor teria um papel político de mediação entre múltiplos objectivos em oposição à soberania absoluta da remuneração accionista, muitas vezes utilizada para avaliar a performance do gestor e a correspondente remuneração. 11 – Para restaurar a autonomia de gestão relativamente aos accionistas líquidos e torna-los responsáveis perante os múltiplos interesses presentes na empresa, incluindo os da comunidade de pertença, seria indispensável uma reforma institucional que assegurasse a responsabilidade social e ambiental. Isto requereria uma transformação em três domínios institucionais: (a) regime de financiamento das empresas; (b) regime de governo das instituições; (c) regimes de prestação de contas. 12 – No que respeita ao regime de financiamento da empresa, a principal preocupação deveria ser a redução da liquidez dos activos e o estabelecimento de compromissos mais estáveis, de longa duração, dos proprietários para com a empresa. 13 – No que diz respeito aos regimes de governo das sociedades, a reforma deveria envolver a transformação do actual regime de incentivos aos gestores. A performance do gestor não deverá ser avaliada apenas em função da sua contribuição para a valorização accionista, mas sim pelas múltiplas dimensões e objectivos que envolvem a empresa. Autonomia deverá ir de mão dada com a contabilização das melhorias introduzidas noutras dimensões e objectivos da empresa, relativamente aos accionistas, trabalhadores, aos clientes, aos fornecedores, aos credores, ao ambiente e à comunidade local. A institucionalização da participação de múltiplos “stake holders” no processo de decisão, seria um elemento crucial na reforma das instituições. 14 – Em consequência os regimes de prestação de contas, deveriam ser modificados com o objectivo de reforçar a sua transparência e o espectro de valores considerados. Novos regimes de prestação de contas, envolvendo não só aspectos económicos e financeiros, mas também as práticas sociais e ambientais, tendo em vista o escrutínio dos mais directamente interessados e do publico em geral. 15 – Estas e outras propostas de reforma igualmente prudentes e moderadas, são invariavelmente silenciadas ou encaradas com indiferença. Na ausência de uma ampla mobilização cívica, a possibilidade de prevalecerem sobre o silêncio ou a hostilidade é limitada. E no entanto, a actual crise ambiental e social só poderá ser ultrapassada se a mudança de valores e atitudes for apoiada por uma reforma das instituições do capitalismo, que permita efectivar o nosso compromisso para com a vida. Grupo de Trabalho “Economia e sociedade” – Comissão Nacional Justiça e Paz

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