A noção conciliar de Igreja

Conceitos que orientam a acção de Bento XVI A Igreja católica tornou-se, nestes últimos dias, objecto de grandes reportagens na comunicação social. Foi primeiro a morte de um Papa, conhecido pessoalmente em grande número de países, e depois a eleição de um novo Papa, com tudo aquilo que essa eleição tem de surpresa, de satisfação ou de desilusão para as várias expectativas das pessoas dentro e fora da Igreja. Que realidade é esta da Igreja? Igreja é a tradução de uma palavra grega – ekklesia – que significa assembleia convocada. A Igreja, portanto, é a assembleia dos povos de todo o mundo, convocada por Deus, como tinha sido convocado o primeiro Israel. Trata-se agora de um novo Israel, do novo povo de Deus, fundado sobre a pessoa e a mensagem de Jesus, como tinha sido anunciado pelos vários profetas do Antigo Testamento. Assim chegou ao seu cumprimento definitivo a escolha de Deus de um povo que fosse o “Seu povo”. A promessa feita a Abraão de que nele seriam abençoados todos os povos, chegava à sua realização definitiva. Agora, para pertencer a este povo já não é necessária a circuncisão, mas a fé na palavra de Deus, em Jesus Cristo, como diz S. Paulo. O homem não vive mais isolado a sua fé, porque se encontra incorporado na comunhão do novo povo de Deus, como “participante de Cristo”. Diz o Concílio na Lúmen gentium: “Aprouve a Deus salvar e santificar os homens, não individualmente, excluída qualquer ligação entre eles, mas constituindo-os em povo, que O conhecesse na verdade e O servisse santamente… É condição deste povo a dignidade e a liberdade dos filhos de Deus, em cujos corações o Espírito Santo habita como num templo. A sua lei é o novo mandamento, o de amar como o próprio Cristo nos amou. Por último, tem por fim o Reino de Deus… por Ele consumado no fim dos séculos”. A Igreja, como povo de Deus é um organismo, constituído por homens e vivificado por um princípio vital, como acontece com os demais seres vivos que conhecemos, princípio que é o Espírito divino. Por isso, também se diz que a Igreja é o corpo místico de Cristo, de que Ele é a cabeço e nós os seus membros. Ora assim como em Cristo há duas naturezas – a divina e a humana – também na Igreja há duas realidades: a humana, o povo de Deus que somos todos nós, e a divina, que é o princípio vital, que lhe dá a vida e que é o próprio Deus. Na Igreja, o elemento humano carrega com todas as suas limitações e imperfeições, por vezes bem visíveis. O princípio vital, que é divino, corrige e aperfeiçoa o humano, para que possa realizar-se o desígnio final de Deus, que é a salvação de todos os homens. Sendo um organismo, a Igreja é também um corpo organizado, com tarefas desiguais. Lê-se no Catecismo da Igreja Católica: “Os fieis de Cristo são aqueles que, incorporados em Cristo pelo baptismo, constituem o povo de Deus, e que, por esta razão, participam a seu modo na função sacerdotal, profética e real de Cristo, sendo chamados a exercer, cada qual segundo a sua própria condição, a missão que Deus confiou à Igreja para cumprir neste mundo”. Por isso, os fieis cristãos nunca podem desinteressar-se das tarefas que pertence à Igreja desempenhar neste mundo. A missão que Jesus Cristo confiou à Sua Igreja compromete-nos a todos nós. Não pode haver um grupo de fieis passivos, apenas objecto das várias funções exercidas pela hierarquia. Somos todos activos e participantes, ainda que de maneira diferente, da acção salvífica de Jesus Cristo, actualizada no tempo. Por outro lado, também a hierarquia não pode absorver todas as funções e exercer um poder absoluto, que minimize o papel do conjunto do povo de Deus. Como num corpo há membros diferentes, com diferentes funções, também neste corpo, que é a Igreja, existem diferenças, como quis o Senhor, mas que devem servir a unidade da missão confiada a este corpo. Diz o Catecismo da Igreja Católica: “Há na Igreja diversidade de ministérios, mas unidade de missão. Cristo confiou aos apóstolos e aos seus sucessores o encargo de ensinar, santificar e governar em Seu nome e pelo Seu poder”. Mas os fieis cristãos participam, à sua maneira, desta missão. Eles devem levar, para os meios em que vivem e trabalham, o testemunho da sua fé na salvação de Jesus Cristo. Assim, também, eles devem, de certa forma, ensinar, santificar e governar. É ainda na Lúmen gentium que se diz: “Cristo nosso Senhor, para apascentar e aumentar continuamente o povo de Deus, instituiu na Igreja vários ministérios, para bem de todo o corpo. Com efeito, os ministros que detêm o poder sagrado estão ao serviço dos seus irmãos, para que todos quantos pertencem ao povo de Deus… alcancem a salvação”. Este carácter de serviço na Igreja é de natureza hierárquica, conforme à vontade de Cristo, que escolheu doze, a quem chamou apóstolos e a quem conferiu o poder de baptizar, de perdoar os pecados, de impor as mãos, para comunicar o Espírito e transferir poderes para os seus sucessores, e em Sua memória abençoar e partir o pão, como Ele tinha feito na última ceia. Dentro do grupo dos doze, distinguiu Pedro, a quem confiou “as chaves do reino dos céus”. Hoje, nesta Igreja, que ultrapassou as fronteiras de Israel, para se tornar universal, segundo os desígnios do seu Mestre, os bispos, que presidem às igrejas particulares, são os sucessores dos “doze” e o Papa é o sucessor de Pedro, para presidir à Igreja universal e ser sinal e sacramento da unidade de todo o povo de Deus. Gonçalves Moreira

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