A cruz escondida

Síria. A Campanha de Natal da Fundação AIS também apoia os escuteiros

O orgulho de Madj

Tinha apenas 2 anos quando começou a guerra na Síria. Começou a falar e a dar os primeiros passos ao mesmo tempo que milhares de pessoas fugiam da morte, das bombas que caíam ameaçadoras dos céus, das cidades que se transformaram em campos de batalha. Aprendeu a crescer num país marcado pela destruição e pobreza. Madj tem hoje 12 anos e é escuteiro. Talvez não haja no mundo outra criança mais feliz e orgulhosa do que ele. É que, finalmente, consegue ser criança…

“Tenho 12 anos e sinto muito orgulho em ser escuteiro.” Madj apresenta-se com um sorriso bonito, junto aos pais, sentado no sofá, na sala. Percebe-se pela imagem que a casa não tem quase mobília. Percebe-se no rosto cavado do pai, no olhar cansado da mãe, que a vida tem sido muito dura, demasiado dura. Quando Madj nasceu, ninguém conseguia imaginar o tormento em que se transformaria a Síria. Com a guerra civil, o país foi tomado por grupos armados, milícias, exércitos, bandos de terroristas. As ruas passaram a ser campos de batalha em que morreram milhares de pessoas. Milhões fugiram do país. Madj nunca soube o que era ser criança num país normal, com prédios inteiros, ruas limpas, sem destroços, parques infantis para brincar, comida na mesa. A sua memória está cheia de estrondos, de bombas, de silvos das balas, de gritos de dor, de corpos manchados de sangue. De morte. Durante toda a sua vida, Madj nunca teve oportunidade para ser uma criança por inteiro. A sua infância foi roubada numa guerra que começou tinha apenas 2 anos de idade. Mesmo agora, que não se escutam os estrondos das bombas, as ruas continuam a ser locais perigosos. Foi-se a guerra, mas ficou a violência. Há toda uma geração que cresceu debaixo de fogo, fugindo da morte, escapando aos tiroteios. Há toda uma geração que aprendeu a ver prédios a ruir, arrastando para a morte famílias inteiras. Há toda uma geração que nasceu e viveu quase sem electricidade em casa, sem aquecimento no Inverno, quase sem comida na mesa, quase sem saber o que é o amor e a fraternidade. Até que Madj descobriu que tudo podia ser diferente.

Uma criança feliz

Foi na Igreja que lhe falaram em ser escuteiro. E Madj renasceu. Quando sai de casa, com os calções azuis, a camisa castanho-clara, o lenço azul e amarelo ao pescoço, e o chapéu na cabeça, todos se voltam para o ver. A rua continua na mesma, ainda com marcas de destruição, os prédios continuam também esventrados, as pessoas continuam a viver uma pobreza escandalosa, mas tudo isso desaparece como por magia perante os passos confiantes do escuteiro Madj. A responsável pelo agrupamento de escuteiros em Damasco, Miray George Tawaify, tem lutado pelo ressurgimento deste movimento católico destinado aos mais novos. E ela tem contado com a parceria da Fundação AIS não só para que os jovens tenham os seus uniformes, mas também para a realização de Campos de Verão, para as peregrinações e retiros. “Quero agradecer a todas as pessoas que nos ajudaram com os nossos uniformes de escuteiros, porque estamos a esforçar-nos por dar esperança às nossas crianças a fim de continuarem a lutar pela vida”, diz-nos Miray. “Se não mudarmos a mentalidade desta geração, ela será, sem dúvida, uma geração vazia, sem sonhos. Isso iria levá-los a abandonar o país no futuro… estamos muito gratos – diz ainda – por fazerem algo por nós.” Os uniformes dos escuteiros são oferecidos pela Fundação AIS. Seria, aliás, praticamente impossível aos pais comprá-los. Às vezes, nem trabalhando em dois ou três sítios diferentes conseguem pôr comida na mesa todos os dias. Quanto mais terem dinheiro para os uniformes dos escuteiros. A guerra roubou vidas, sonhos e esperança e quase roubava também a infância de Madj. Quase… É que um simples uniforme de escuteiro devolveu-lhe o sorriso e a alegria. Talvez não haja no mundo outra criança mais feliz e orgulhosa do que ele. É que, finalmente, Madj consegue ser criança…

Paulo Aido | www.fundacao-ais.pt

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