Igreja/Luto: A morte prepara-se todos os dias

Padre Paulo Malícia fala da experiência de acompanhar um sacerdote amigo na última fase da vida

Lisboa, 02 nov 2015 (Ecclesia) – O padre Paulo Malícia abraçou a missão de pároco da comunidade de Santo António do Estoril, prosseguindo a caminhada pastoral do seu amigo padre Ricardo Neves, que faleceu há três meses, vítima de doença prolongada.

À Agência ECCLESIA, o sacerdote de 48 anos recordou os momentos mais difíceis dessa jornada, desde o “diagnóstico exato” da doença até à morte, mas também a memória de alguém com quem viveu alguns dos momentos mais importantes da sua vida.

Quase seis anos mais velho do que o padre Ricardo Neves, o atual pároco do Estoril conheceu o amigo ainda no seminário e juntos fizeram o seu percurso de formação e foram ordenados também no mesmo dia, 29 de junho de 1997.

“O que mais me custou foi sentir que ia perder alguém de quem eu precisava para dar estabilidade à minha vida. É um sentimento um bocado egoísta, um sacerdote revolta-se, pergunta porquê, às vezes até vacila e muitas vezes treme na fé. Mas isso não é de estranhar, a fé também passa por esses abanões”, admite o padre Paulo Malícia.

Para o padre Paulo Malícia, “a morte prepara-se e até se deve preparar todos os dias”, e no caso do padre Ricardo Neves, “ele preparou-a na forma como viveu antes da doença e na forma como viveu a doença”.

A fase mais complicada foi já no hospital, desde que o amigo foi internado até aos “últimos tempos”, já “inconsciente”.

“O não poder falar, não poder dizer nada, o não se saber o que é que se estava a passar ali, foi uma fase de sofrimento”, lembra.

O padre Paulo Malícia guarda no seu gabinete, uma fotografia do amigo Ricardo Neves e recorda uma das muitas conversas e partilhas que foram fazendo, ao longo dos anos.

Nos últimos dias, as conversas versavam sobretudo à volta da “Igreja e dos desafios da Igreja”.

Foi nesse espírito, e também impulsionado pelo cardeal-patriarca de Lisboa, que o sacerdote assumiu a paróquia de Santo António do Estoril, tendo o amigo como referência para o seu trabalho pastoral no futuro.

“Olhar para a frente, é o que esta memória nos pode ajudar, dar passos em frente e é isso que aqui temos tentado fazer, mas não é um caminho fácil”, salienta.

Numa comunidade ainda a viver o luto, o padre Paulo Malícia procura que o quotidiano das pessoas seja marcado pela esperança e olha para o seu trabalho com uma responsabilidade acrescida.

“Substituir alguém que era muito querido não é fácil, porque o padre Ricardo era uma referência para muita gente”, enfatiza o sacerdote, para quem poder estar agora na mesma paróquia que o amigo é “especial, sem dúvida”.

Um testemunho que pode ser escutado hoje no programa ECCLESIA, na Antena 1 da rádio pública, pelas 22h45.

SN/JCP

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