25 de Abril:  Revolução integrou rede de «oposicionismo católico» ao regime, diz António Araújo

Especialista destaca importância da Vigília da Capela do Rato, «gesto mais emblemático e mais simbólico» desta resistência

Foto: Agência ECCLESIA

Lisboa, 21 abr 2024 (Ecclesia) – O investigador António Araújo afirmou que, no final do regime do Estado Novo, “havia já uma rede de oposicionismo católico muito desenvolvida”, que ajudou na preparação e consolidação da democracia.

“Acho que, do ponto de vista eclesial, o acontecimento decisivo é o Vaticano II e depois os pontificados de João XXIII e de Paulo VI”, indicou o convidado da entrevista semana conjunta Ecclesia/Renascença, emitida e publicada aos domingos.

António Araújo é membro da Comissão Executiva e do Conselho de Administração da Fundação Francisco Manuel dos Santos; com vários livros publicados sobre o período do Estado Novo, é autor de uma tese académica sobre a Vigília da Capela do Rato, na passagem de ano de 1972 para 1973.

“Foi talvez o gesto mais emblemático e mais simbólico de manifestação de uma espécie de resistência católica ao regime do Estado Novo e de questionamento por parte dos crentes, de uma minoria de crentes”, sustenta.

Para o investigador, o “fator mais decisivo” no impacto desta vigília terá sido “a entrada da polícia na Capela”, em Lisboa.

“Tudo isso teve uma repercussão muito grande nos meios políticos, por via da chamada ala liberal dos deputados, sobretudo Francisco Sá Carneiro e Miller Guerra, que levaram a questão da entrada da polícia num templo religioso a debate na Assembleia Nacional”, recorda.

O especialista acrescenta que, a nível político, a reeleição de Américo Tomás, em 1972, representou o “sinal mais emblemático de que o regime era incapaz de se reformar por dentro”.

Um ano depois, o episcopado português publicou uma nota no 10.º aniversário da encíclica ‘Pacem in Terris’, de João XXIII.

“Vejam o significado de haver uma encíclica papal a falar da necessidade da paz na terra. Era algo já de si subversivo”, sustenta.

Apesar de assinalar que, “durante muito tempo, uma parte substancial da hierarquia foi conivente com o Estado Novo”, segundo o investigador, na reta final do regime “já havia da parte de alguns prelados, alguns bispos, uma consciência de que o regime não podia prosseguir com aquele esforço de guerra”.

Destacando a ação do cardeal D. António Ribeiro, inclusive em confronto com a PIDE após a detenção de sacerdotes na Capela do Rato, o entrevistado evoca também a figura de D. António Ferreira Gomes, bispo do Porto, como “uma grande referência”.

“A sua poderosíssima escrita foi sempre uma referência, até uma referência moral para um certo oposicionismo católico do Porto”, acrescenta.

O especialista fala numa “revolução cultural”, que precede a mudança política e social, por força de “uma transformação da juventude” que tem efeito nas crises académicas, em Portugal.

Do ponto de vista social, o 25 de Abril, de certa forma, já tinha acontecido. A rutura de uma parte significativa da juventude com o regime, até por efeito da guerra da África já tinha acontecido”.

50 anos depois do 25 de Abril, António Araújo defende uma “visão distanciada da história”, sem “saudosismo”, e propõe uma “pedagogia da liberdade e da democracia”.

“Para fazer a desconstrução de uma série de mitos políticos do presente, acho que o passado ajuda muito”, conclui.

Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)

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Agência ECCLESIA

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