Moçambique: Bispos católicos condenam violência

Os bispos católicos moçambicanos repudiaram o “uso da violência” nos protestos registados em várias cidades do país e alertaram que novos tumultos podem eclodir se não forem adoptadas “medidas políticas” para reduzir desigualdades sociais. “O povo está cansado de assistir à ostentação do poder económico de uma minoria misteriosamente super rica perante a privação desse poder por parte da minoria desprovida do mínimo necessário e que é obrigada a levar uma vida infra-humana”, afirmam os bispos, lembrando que se não forem tomadas medidas políticas para inverter esta situação pode generalizar-se a violência no país. Na mensagem, intitulada “Justiça sim, violência não”, a Conferência Episcopal de Moçambique (CEM) começa por lembrar que “a queixa do cidadão” se prende com “o custo insuportável de vida, que se manifesta pela subida generalizada dos preços de artigos de primeira necessidade”. A CEM defende, no entanto, que esta insatisfação popular “não autoriza o uso da violência, por parte de quem quer que seja”. “Nós os bispos não aprovamos essa via. Se as manifestações são justas e cobertas pela lei, há mecanismos legais para o seu uso. Lamentamos que tais manifestações tenham redundado em violência gerando mortes e feridos e aumentando o grau do sofrimento do mesmo povo. Não ignoramos que o nível elevado de sofrimento pode excitar os ânimos e mesmo interferir no normal funcionamento da razão, mas nem por isso podemos aprovar exageros e violências”, escrevem. A polícia não foi também esquecida na mensagem dos prelados moçambicanos, criticada por recorrer de forma “às vezes excessiva” à força para repor a ordem pública. “Usar balas de chumbo para dispersar manifestantes é incompreensível e inaceitável porque coloca em risco a vida de muitas pessoas. Usar balas de chumbo é pretender dar a entender, com obras, que o povo não tem direito à manifestação e que se uma bala atingir alguém não há questão, a culpa é de quem se põe na manifestação”, lê-se na nota. O Governo é, por seu turno, interpelado a “procurar as soluções dos problemas que afligem os seus cidadãos, garantindo-lhes uma vida de bem-estar e harmonia, sem exclusão de qualquer camada social”, adianta. “O Governo deve compreender o sofrimento do seu povo. No nosso modo de entender os acontecimentos de violência ocorridos no dia 06 de Fevereiro e seguintes não foram uma simples greve, mas revelam a saturação de um povo martirizado pela situação de penúria, privações e injustiça”, escrevem os bispos, aconselhando o executivo a fortalecer o diálogo com a sociedade civil. “Ignorar esta situação”, enfatizam, “seria uma violência ainda maior” por parte do Governo “do que a violência das populações”. “Apelamos a todos os membros do Governo que tomem a peito o sofrimento do povo e procurem sempre melhores vias para amainá-lo. No lugar de silenciar o povo que se revela impaciente ou apresentar soluções que só podem aumentar a sua desilusão, o Governo, consciente que também é responsável pela situação que se criou, não se deve eximir do seu papel de mandatário do povo na procura de melhores soluções para o seu bem-estar. Deve agir com urgência, mas sabiamente”, aconselham os líderes religiosos católicos. Em Dezembro do ano passado, os bispos católicos de Moçambique tinham-se manifestado preocupados com o ambiente social no país. “A igreja, como sempre, acompanha a situação da nossa sociedade. Olhando para ela, no momento actual, vemo-la mergulhada em mil e um problemas: a pobreza, a degradação dos valores morais e do tecido social, a insegurança, corrupção galopante, desavergonhada e impune”, escreviam então numa mensagem. “Em vários pontos do país vão sendo construídas infra-estruturas sociais, levam-se a cabo obras de manutenção de vias de comunicação e impulsiona-se o associativismo no meio das populações (…) No entanto, somos também testemunhas do facto de que a vida do povo continua a ser dramaticamente dura, devido a graves carências de todo tipo e a deficiente capacidade de compra por parte do povo”, apontavam. A capital moçambicana foi palco a 05 de Fevereiro de confrontos entre polícia e manifestantes, que reclamavam contra o aumento verificado nesse dia do preço dos transportes privados de passageiros (“chapas”). Desde então, têm-se registado incidentes análogos, embora de muito menor dimensão, em localidades no sul do país. No Sábado, o Chimoio (centro) foi palco de uma tentativa de linchamento popular, que terá começado quando um grupo de habitantes da cidade exigiu a entrega pela polícia de 12 alegados assaltantes acusados de assaltos e violações, capturados nesse dia pelas forças de segurança.

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