Congresso Missionário 2022: «Perspetivas da fraternidade sem fronteiras» partilhadas por um católico e um muçulmano

Para Pedro Gil e Khalid Sacoor  Jamal «é importante restituir a dignidade às religiões e aos crentes» na sociedade

Agência ECCLESIA/HM

Lisboa, 14 out 2022 (Ecclesia) – Pedro Gil, católico, e Khalid Sacoor  Jamal, muçulmano, refletiram e apresentaram hoje ‘Perspetivas da Fraternidade sem Fronteiras’, no primeiro painel do Congresso Missionário 2022, que está a decorrer na Universidade Católica Portuguesa (UCP), em Lisboa.

“Não vejo que ser missionário seja incompatível com a fraternidade, ser missionário em nada me impede de ser respeitoso com os valores do próximo”, disse Khalid Sacoor Jamal, esta tarde no auditório Cardeal Medeiros da UCP.

O Congresso Missionário ‘Fraternidade sem Fronteiras’, esta sexta-feira e sábado, dias 14 e 15 deste mês, realiza-se de forma presencial e por transmissão online, organizado pela Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), Conferência dos Institutos Religiosos de Portugal (CIRP), Institutos Missionários Ad Gentes (IMAG) e Obras Missionárias Pontifícias (OMP).

Khalid Sacoor Jamal; Agência ECCLESIA/HM

Khalid Sacoor Jamal, dirigente da Comunidade Islâmica de Lisboa assinalou que há uns anos se instalou “na esfera pública a convicção de que as religiões pouco importam para as civilizações”.

“É importante restituir a dignidade às religiões e aos crentes, e não retirá-los da esfera pública e da discussão pública”, realçou o representante do Islamismo.

Segundo Khalid Sacoor Jamal criou-se “uma convicção pública que o proselitismo é uma coisa errada ou deve ser completamente batido”, mas, na sua opinião, deve-se “impor limites evidentemente” e é preciso ter “respeito pelas convicções do próximo”.

“O diálogo inter-religioso não pode ser darmos todos as mãos e fingirmos que somos amigos ou iguais”, acrescentou o dirigente da Comunidade Islâmica de Lisboa.

Para Pedro Gil, consultor de comunicação da Igreja Católica, “é muito importante voltar a ganhar confiança de que é possível voltar a falar da religião”: “Da própria religião, de Deus como questão, e que é possível ganhar respeito para com esse tema”.

“Hoje criamos uma perceção de incompatibilidade entre possuir uma identidade e ao mesmo tempo respeitar a diversidade, porque entramos numa época um bocado curiosa em que o valor da tolerância tem um significado que não se pode dizer imensas coisas: ‘Olha aí a tolerância, não magoes quem não pensa como tu, não digas aquilo que tu pensas’”, exemplificou.

Segundo o diretor do gabinete de imprensa do Opus Dei, o desafio agora “é voltar a devolver dignidade à questão de Deus, saber voltar a falar sobre Deus”, quanto ao diálogo inter-religioso afirmou que “o segredo maior” tem a ver com “a afirmação da verdade, cada um o mais honestamente possível”.

Pedro Gil; Agência ECCLESIA/HM

“Não se pode de maneira nenhuma tratar da religião à base da violência, haveria sempre uma traição ao tema. Deus é alguma coisa que tem de ser convincente por si própria e tem de ser motivo de atração, para que a pessoa quando se aproxima do tema sente-se liberto pelo tema, não subjugado”, desenvolveu

Pedro Gil e Khalid Jamal integraram um programa de diálogo inter-religioso, “E Deus criou o mundo”, na Antena 1, também com participação de Isaac Assor (representante judaico), com moderação de Henrique Mota, e produção de Carlos Quevedo.

Os dois intervenientes estiveram em Abu Dhabi no dia 4 de fevereiro de 2019, na assinatura da declaração sobre a fraternidade humana que uniu o Papa Francisco e o grande-imã de Al-Azhar, abrindo caminho à nova jornada da ONU; A 21 de dezembro de 2020, a Assembleia Geral das Nações Unidas declarou unanimemente o dia 4 de fevereiro como Dia Internacional da Fraternidade Humana.

Khalid Sacoor Jamal recordou que na declaração lê-se que “o discurso deve evitar discussões inúteis”, realçou que, muitas vezes, dialogam com as pessoas mas não fazem esse esforço “porque inevitavelmente o ego toma conta” e só querem “ter razão ou para rebater”, e lembrou que não se discutem as pessoas mas as “ideias”, porque “a dignidade de cada um, a idoneidade, está a acima da discussão”, e o “fervor religioso tem de ter limites”.

“Aqui o grande desafio é encontrar o equilíbrio, quando estamos a discutir ou dialogar. A pessoa não me está a atacar, está a atacar a minha ideia, o meu princípio”, sublinhou.

Guilherme d’Oliveira Martins; Agência ECCLESIA/HM

Na terceira e última conferência do primeiro dia de Congresso Missionário, Guilherme d’Oliveira Martins refletiu sobre ‘A Fraternidade na Política, na Economia e no Modelo Social’.

“É importante compreender que não há uma política cristã mas há cristãos na política. Há cristãos na política e a responsabilidade dos cristãos na vida política”, disse o administrador-executivo da Fundação Calouste Gulbenkian.

Neste contexto, explicou que político é o que a ver com a cidade, “a relação com os outros”, tem a ver com a organização da sociedade”, e, como contraponto, tem a palavra “idiota, aquele que vive sobre si mesmo, sozinho, não pensa nos outros”.

“Os cristãos na política significa a introdução do tema da fraternidade, a relação com os outros, da compreensão que só com os outros, através dos outros, só pela não indiferença podemos realizar ideia de sermos irmãos. Esta ideia de fraternidade na política, a compreensão da nossa responsabilidade, a nossa inserção na sociedade, é também responsabilidade perante a economia”, desenvolveu Guilherme d’Oliveira Martins.

O conferencista, presidente do Centro Nacional de Cultura (CNC) (2002 – 2016), acrescentou que esta economia é humana, “política no sentido de economia humana”, e a ideia de organização da sociedade, “de modelo social”, uma fraternidade real, a que “permita organizar melhor a sociedade”, e sem renunciar à responsabilidade.

CB/OC

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