LUSOFONIAS – Os três caminhos da Paz

Tony Neves

8 de dezembro de 1967. O Concílio Vaticano II já tinha fechado as portas e a Igreja vivia tempos de mudança. O Papa Paulo VI, o sucessor de João XXIII que ousara lançar o Concílio, tinha a difícil e desafiante missão de o aplicar. Neste dia da Imaculada, Paulo VI surpreendeu o mundo com uma notícia: 1 de janeiro de 1968 será o I Dia Mundial da Paz! O primeiro de muitos, segundo augurava a mensagem que escreveu. E assim se abriu mais uma página feliz na história da Igreja, pois já vem a caminho a 55ª edição! Paulo VI escreveria 11 Mensagens, J. Paulo I não teve tempo de escrever nenhuma, J. Paulo II preparou 27, Bento XVI publicou 8 e o Papa Francisco, com a que acaba de tornar pública, já vai na nona! Aponta três caminhos a percorrer para que a paz se construa.

O profeta Isaías dá o tom à Mensagem para iniciar bem 2022: ‘Como são belos os pés do mensageiro que anuncia a Paz’ (Is 52,7). O clamor dos pobres e da terra continua a fazer-se ouvir para exigir justiça e paz, como no tempo dos profetas antigos. Lamenta-se o Papa que ‘o caminho da paz permanece, infelizmente, arredio da vida real de tantos homens e mulheres e, consequentemente, da família humana, que nos aparece agora totalmente interligada’. Reconhecendo que há esforços de diálogo, é, porém, muito duro nas críticas: ‘aumenta o ruído ensurdecedor de guerras e conflitos, ao mesmo tempo que ganham espaço doenças de proporções pandémicas, pioram os efeitos das alterações climáticas e da degradação ambiental, agrava-se o drama da fome e da sede e continua a predominar um modelo económico mais baseado no individualismo do que na partilha solidária’.

Para construir a paz há três caminhos: ‘o diálogo entre as gerações’ para realizar projectos comuns; ‘a educação’, que assegura liberdade, responsabilidade e desenvolvimento; ‘o trabalho’, que torna possível a realização da dignidade humana.

O diálogo entre gerações permite encontrar um meio termo entre a indiferença egoísta e o protesto violento. Para dialogar, exige-se confiança: ‘ouvir-se um ao outro, confrontar posições, pôr-se de acordo e caminhar juntos’. A crise sanitária fez crescer os índices de solidão que afectam os mais velhos. Trouxe ainda aos mais jovens uma perda de esperança e confiança no futuro. Mas esta pandemia também fez vir ao de cima ‘testemunhos generosos de compaixão, partilha e solidariedade’. Os jovens precisam da experiência e sabedoria dos mais velhos. Estes necessitam do apoio, carinho, criatividade e dinamismo dos mais novos. O encontro de gerações é um desafio social a que é urgente responder para que haja paz.

Outro aspecto importante desta partilha entre gerações tem a ver com a urgência de se ‘visitar o passado para aprender da história e curar as feridas que às vezes nos condicionam’, bem como ‘visitar o futuro, para alimentar o entusiasmo, fazer germinar os sonhos, suscitar profecias, fazer florescer as esperanças’. Fica claro que o futuro está nas raízes e, sem estas, tudo fica comprometido.

A educação e o trabalho – os outros caminhos da paz – são lugares e contextos privilegiados deste diálogo entre gerações. Diz o Papa: ‘enquanto a educação fornece a gramática do diálogo entre as gerações, na experiência do trabalho encontram-se homens e mulheres de diferentes gerações, trocando entre si conhecimentos, experiências e competências em vista do bem comum’.

A instrução e a educação são apresentados pelo Papa como motores de paz. A Mensagem lembra que tem de haver mais educação e menos armas, se o mundo quer apostar num desenvolvimento humano integral. Estes valores ‘tornam a pessoa mais livre e responsável, sendo indispensáveis para a defesa e promoção da Paz’. São –defende o Papa – ‘os alicerces de uma sociedade coesa, civil, capaz de gerar esperança, riqueza e progresso’. Por isso, é profundamente desumano ver que muitos países investem mais em orçamentos de forças armadas que no ministério da Educação. Há que inverter esta lógica, pois as armas estão sempre ao serviço da morte, enquanto a Educação está ao serviço da vida e do futuro.

Esta Mensagem para o Dia Mundial da Paz é tão densa e profunda que merece que voltemos aqui. Desejo a quantos me ouvem e leem um Ano de 2022 cheio desta Paz que aposta no diálogo e partilha entre gerações, na Educação e no trabalho. Que o novo Ano nasça com portas abertas para um futuro de justiça, paz e ecologia integral.

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Agência ECCLESIA

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