Vacinação dos lares

Padre Lino Maia, presidente da CNIS

1. Apresentado em 3 de Dezembro de 2020, o Plano de Vacinação COVID-19 previa três fases. O grupo prioritário seria o das pessoas com 50 ou mais anos e com patologias associadas, profissionais e residentes em lares e unidades de cuidados continuados, profissionais de saúde que prestem cuidados diretos no âmbito da pandemia e forças de segurança.

Legitimamente e bem, ali estavam as UCCI’s e os lares. Todos os lares, residenciais e de idosos e, independentemente de serem da rede social solidária, lucrativos ou não legalizados, porque em todos eles, qualquer que seja a sua natureza ou legalidade, estão pessoas. Normalmente as mais frágeis e muitas vezes com um histórico de saúde complicado.

No que aos lares da rede social solidária concerne, a quem apresentou o plano foi referido que nesses lares e nos cuidados continuados, para além dos residentes, frágeis, e dos trabalhadores, dedicados, estavam “dirigentes ativos”, e que também deviam ser vacinados.

A CNIS e as suas Uniões Distritais, a União das Misericórdias, a Confecoop e a União das Mutualidades têm feito um esforço enorme para a capacitação dos dirigentes no sentido de lhes dar mais competências para serem dirigentes ativos para estarem presentes nas e dentro das instituições.

Esses dirigentes – alguns dos quais também são provedores – estão horas e horas nos lares e fazem-nos “funcionar”. Algumas vezes substituem ou complementam o trabalho dos colaboradores e estão sempre em contacto assíduo tanto com os trabalhadores como com os utentes. Nunca negam o diálogo ou a ajuda. São os tais “dirigentes ativos”. Todos os dirigentes são ativos, mas esses são-no sempre e particularmente nesta pandemia. Credores de respeito e gratidão.

Graças à dedicação tanto dos trabalhadores como desses dirigentes é que, em percentagem comparada, Portugal é o país da União Europeia com a menor percentagem de óbitos em lares (28%, quando a média europeia está nos 40%). Nesta fase, a vacinação destes dirigentes não era um privilégio mas a necessária capacitação para minorar riscos em residências coletivas de pessoas frágeis.

Refira-se, entretanto, que tanto naquele fórum em que foi apresentado o programa de vacinação como noutros fóruns, não tendo havido manifestada confirmação de vacinação dos dirigentes, também não houve negação. Aliás, num até se compreendeu positivamente a vacinação desses dirigentes por serem eles a fazer funcionar os lares…

 

2. Realce-se que, globalmente, a vacinação está a correr bem. Que, com toda a transparência, alguns “dirigentes ativos” foram sendo vacinados. Que tudo deve ser feito para evitar abusos. E que, acontecendo algum abuso, ele tem de ser condenado.

Porém, cita-se o jornalista Paulo Querido: “É completamente inconsequente esta sanha justiceirista, que tem dois efeitos: aumenta o desperdício de recursos, ficando os processos muito mais caros que as vacinas em causa, e uma vez mais desvia o olhar da corrupção grave para esta cultura de combate aos casinhos.

Não estou a branquear os casinhos nem a praticar whataboutismo: procuro enfatizar a duplicação do desperdício. É como estar a ver as famílias dos soldados a discutir a ética do campo de batalha com a guerra em curso — e entretanto os generais descobriram que não compraram munições suficientes.

Cálculo meu sobre dados parciais: até hoje terão sido ministradas em circunstâncias duvidosas +/- 500 vacinas, isto para um total de 340.000. A percentagem de desperdício é inferior a 1%. Deste sabe-se que uma grande maioria seguiu as recomendações e acabou injetada em braços dentro dos grupos prioritários. Calcula 10% a 20% de aplicações duvidosas desse 1%. 500 vacinas. Much ado about nothing. Nem vale o tempo que a ministra e o Secretário de Estado tiveram de gastar a dizer o óbvio sobre o assunto”.(https://paulo.querido.net/diario/2021/02/01)

 

3. Segundo consta, a Task Force para a vacinação estará a rever critérios ou prioridades.

Espera-se que não o faça a reboque da Ordem dos Enfermeiros, que parece querer considerar que só os enfermeiros são profissionais nos lares e que são eles quem faz com que os mesmos funcionem. Claro que, com competências diferentes mas com a mesma dedicação de outros colaboradores, os enfermeiros são muito importantes nos lares e não deixam de o ser mesmo quando optam pelo SNS…

Também se espera que a Task Force não ande a reboque de alguma comunicação social. Nomeadamente da televisão pública, que parece querer divertir-nos com a caça aos “casinhos”. Justiça seja feita, porém, às televisões privadas que, nestas circunstâncias, parece estarem a prestar melhor serviço público e a melhor valorizar os que promovem a construção de uma comunidade melhor….

Será muito grave desvalorizar o que tem valor e as Instituições de Solidariedade são um pilar estruturante do Estado Social. Desvalorizando o que tem valor, estar-se-á a provocar uma perigosa debandada dos dirigentes solidários, com evidente prejuízo para os mais frágeis.

A CNIS não tem mandato para impor nada, mas tem autoridade moral para dizer que estes “dirigentes ativos”, provedores e outros, devem ser vacinados como medida de proteção social, que é a sua missão, abraçada com generosidade.

A bem da comunidade…

Artigo publicado no Jornal Solidariedade 

 

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