25 de Abril/50 anos: Livro apresenta um diálogo entre cristianismo e marxismo no contexto de «ideologias muito sólidas»

D. Manuel Clemente e Francisco Louçã apresentaram a obra que publica o debate entre o padre Resina Rodrigues e o filósofo Sottomayor Cardia

Foto Agência ECCLESIA/PR

Lisboa, 21 mar 2024 (Ecclesia) – D. Manuel Clemente e Francisco Louçã apresentaram hoje o livro «Cristianismo e Marxismo em Debate dos Anos 70», que publica um diálogo entre o padre João Resina Rodrigues e Mário Sottomayor Cardia, no contexto de “ideologias muito sólidas”.

“Depois dos anos 70, 80, com o que a pós-modernidade trouxe, relativizou muito essas afirmações. É um mundo muito diferente do que era na altura”, afirmou D. Manuel Clemente em declaração aos jornalistas na sessão de apresentação da obra, na Capela do Rato, em Lisboa.

O historiador recordou o debate “muito recorrente” que acontecia nos anos 60 e 70 sobre cristianismo e marxismo, na Faculdade de Letras e na Faculdade de Teologia, referindo que “as coisas não se alteraram muito a partir daí quando às ideias”, mas sim “quanto às concretizações”, nomeadamente com a realização do Concílio Vaticano II e a compreensão da relação entre Igreja e o mundo, que deu “possibilidades de diálogo que a partir daí aconteceram”.

«Cristianismo e Marxismo em Debate dos Anos 70» publica a transcrição de um colóquio promovido em janeiro de 1974, pela Juventude Universitária Católica (JUC), entre o padre Resina Rodrigues, e professor no Instituto Superior Técnico e assistente da JUC, e Mário Sottomayor Cardia, filósofo e ensaísta, dissidente do PCP e já ligado ao PS, de que viria a ser um dos principais dirigentes e futuro ministro.

A coordenação da edição, com a chancela da Universidade Católica Editora, é do jornalista José Pedro Castanheira, que à época pertencia à JUC e que, no texto de apresentação, refere-se a uma “discussão, livre e aberta, entre dois homens com um pensamento autónomo” e, “meio século depois, a discussão conserva muita atualidade e até frescura”, centrada na temática dos direitos humanos.

À margem da apresentação da obra, Francisco Louçã disse em declarações aos jornalistas que o diálogo entre o padre Resina e Sottomayor Cardia tem uma “localização precisa na história”, referindo que 50 anos depois é possível “pensar de uma forma muito mais livre do que foi o caminho da Igreja”.

“Olhar par ao marxismo e para o cristianismo como um corpo de ideias, com dinâmicas sociais, como pensamentos em evolução e contraditórios é tão útil agora como foi naquela altura”, afirmou o economista.

Francisco Louçã lembrou o tempo de guerra que “rasga a terra da Palestina e destrói uma população com uma perseguição tão cruel”, afirmando que a paz era “um dos aspetos que mais unia aqueles dois homens que discutiam, há 50 anos”.

Na sessão de apresentação do livro, moderada pela historiadora Ângela Barreto Xavier, D. Manuel Clemente referiu-se ao diálogo entre o padre Resina Rodrigues e Sottomayor Cardia como o “melhor que se podia fazer neste âmbito”, naquela altura, numa época de “muita crispação”, porque “os territórios estavam muito definidos”.

“Não era um diálogo fácil, era muito crispado”, lembrou D. Manuel Clemente, adiantando que, na década de 70, aconteceram circunstâncias que “iam desfazendo essa rigidez”.

“Crescia a possibilidade de conversa e apreciação positiva em relação à outra parte”, referiu o patriarca emérito de Lisboa.

D. Manuel Clemente deu como exemplo a Carta Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa, de maio de 1973, no 10º aniversário da encíclica Pacem in Terris, do Papa João XXIII, onde se defende a “necessidade de liberdade política, participação cívica, de várias correntes presentes na sociedade e da liberdade de escolha”.

O historiador lembrou também a carta assinada por 106 sacerdotes do Patriarcado de Lisboa, entregue à Nunciatura no final de 1967, a pedir que o patriarca de Lisboa fosse o D. Manuel Falcão, nomeado bispo auxiliar de Lisboa em dezembro de 1966, para “desligar a Igreja da situação política”.

O patriarca emérito de Lisboa referiu também que o padre Resina Rodrigues e o filósofo Sottomayor Cardia “eram de espírito aberto”, tinham em comum o “lastro académico” e mostravam ser “muito livres” em relação às doutrinas em que se reviam.

“A conjugação de duas disponibilidades faz desta conversa muito interessante, num mundo muito diferente do nosso”, afirmou.

D. Manuel Clemente lembrou que, entre os dois, havia uma “capacidade mútua de diálogo, que não era tão vulgar na altura, dadas as crispações, que faz este diálogo muito interessante”.

PR

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Agência ECCLESIA

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