Vaticano: Pregador da Casa Pontifícia alertou para necessidade de «desmistificar a vingança»

Frei Raniero Cantalamessa explicou significado da «reconciliação com Deus» e a Sua «justiça»

Cidade do Vaticano, 25 mar 2016 (Ecclesia) – O pregador da Casa Pontifícia destacou a «prova suprema» da morte de Jesus e explicou o apelo à reconciliação com Deus dirigido hoje a todos no Ano favorável da Misericórdia, na celebração da Paixão do Senhor, no Vaticano.

“A morte de Cristo devia ser para todos a prova suprema da misericórdia de Deus para com os pecadores. É por isso que ela não tem sequer a majestade de certa solidão, mas é enquadrada, entre dois ladrões”, assinalou frei Raniero Cantalamessa, estar tarde, na cerimónia presidida pelo Papa Francisco.

Na celebração da Paixão do Senhor, o franciscano capuchinho explicou que se deve perceber que “o oposto da misericórdia não é a justiça mas a vingança”.

O sacerdote indicou que Jesus “não opôs misericórdia à justiça, mas à lei de talião” e exemplificou que na cruz “não pediu ao Pai que vingasse a sua causa” mas que perdoasse os seus carrascos.

“Temos que desmitificar a vingança! Ela tornou-se um mito penetrante, que contamina tudo e todos, começando pelas crianças”, alertou o pregador da Casa Pontifícia dando como exemplo que “grande parte das histórias” no cinema e nos jogos eletrónicos são “histórias de vingança”.

“Metade, se não mais, do sofrimento que há no mundo, quando não se trata de males naturais, vêm do desejo de vingança, seja nas relações entre as pessoas, seja nas relações entre países e povos”, acrescentou, sublinhando que apenas a misericórdia “pode salvar o mundo”.

“A misericórdia de Deus pelos homens e dos homens entre si. Ela pode salvar, em particular, a coisa mais preciosa e mais frágil que há no mundo neste momento: o matrimónio e a família”, alertou.

Neste contexto, observou que no matrimónio acontece algo semelhante ao que aconteceu “na relação entre Deus e a humanidade”, no início existe “amor” e não a misericórdia.

“A misericórdia só intervém depois do pecado do homem, também no casamento, no início não há misericórdia mas amor. Depois de anos, ou meses, de vida em comum revelam-se os limites pessoais, os problemas de saúde, dinheiro, filhos; a rotina, que apaga a alegria”, desenvolveu.

O religioso refletiu também sobre a reconciliação com Deus e disse que uma das razões, “talvez a principal”, da alienação do homem moderno com a religião e a fé “é a imagem distorcida de Deus”.

Na Basílica de São Pedro, explicou que para descobrir qual a imagem "predefinida" de Deus no inconsciente humano coletivo “basta fazer” a pergunta: "Que associação de ideias, que sentimentos e reações surgem em mim, antes de qualquer reflexão, quando, na oração do pai-nosso, chego às palavras ‘seja feita a vossa vontade’."

“Quem as diz é como se inclinasse interiormente a cabeça em resignação, preparando-se para o pior. É um pouco como se Deus fosse o inimigo de toda festa, alegria, prazer. Um Deus ranzinza e inquisidor”, comentou.

Para o pregador da Casa Pontifícia é um resquício da ideia pagã de Deus, “nunca erradicada de todo, e talvez erradicável, do coração humano”.

Contudo, na homilia da Celebração da Paixão do Senhor, o religioso observa que no cristianismo “nunca foi ignorada” a misericórdia de Deus mas foi-lhe confiada “apenas” a missão de “moderar os rigores irrenunciáveis da justiça”.

Na cerimónia, com 38 cardeais e 33 arcebispos e bispos, o sacerdote considerou que existe “o perigo” de se ouvir falar em justiça de Deus e “ignorando o seu significado, ficar-se com medo em vez de encorajado”.

“A justiça de Deus é o ato pelo qual Deus faz justos, agradáveis a Si, aqueles que creem no Seu Filho. Não é um fazer-se justiça, mas um fazer justos”, acrescentou o pregador da Casa Pontifícia.

CB

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Agência ECCLESIA

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