Fátima Cunha Almeida, coordenadora nacional da LOC/MTC
A proposta de Orçamento Geral do Estado para 2012 mostra o caminho por onde o atual governo pretende seguir para diminuir a dívida pública e fazer Portugal sair da crise. Algumas das medidas apresentadas têm gerado em nós muita preocupação, perplexidade e indignação. As consequências destas escolhas, reconhecidamente negativas para a economia porque recessivas, são muito gravosas para as pessoas mais desfavorecidas, e, seguramente, criarão muitas situações concretas de pobreza, mesmo entre os que vivem do seu salário, das pensões e dos apoios sociais.
Conhecemos já entre nós várias situações dramáticas de desempregados sem subsídio de desemprego, porque terminou o tempo, e que não encontram qualquer tipo de trabalho com rendimento. São homens e mulheres com responsabilidades familiares, com filhos na escola e na universidade, que não sabem como viver o hoje ou pensar o amanhã. O desespero e até mesmo o suicídio estão a tornar-se demasiado reais nas nossas comunidades. Será este o caminho? Será correto cortar nos subsídios de desemprego no exato momento em que não há trabalho para quem o procura?
São cada vez mais os cidadãos – com trabalho ou desempregados -, a estenderem a mão à caridade das instituições e dos particulares; são cada vez mais as famílias sem recursos financeiros para o seu sustento básico; é cada vez maior a pobreza declarada e envergonhada. E nós, Movimento de Trabalhadores Cristãos, conhecemos esta triste realidade porque estamos presente onde se vive e se sente tudo isto.
Os cortes drásticos em serviços públicos como a educação e a proteção social, que nas últimas décadas fizeram diminuir expressivamente o analfabetismo e a pobreza, assim como nos cuidados de saúde primária e de proximidade, que contribuíram para uma melhor qualidade e longevidade de vida, vão condicionar a qualidade e a proximidade destes serviços essenciais.
Ficamos indignados pelo facto dos políticos continuarem a enganar os eleitores nas suas propostas de campanha eleitoral para alcançar o poder e, quando o conseguem, executam de forma contrária o prometido. A austeridade, até certo ponto reconhecida como necessária para o tempo que vivemos, recai sobretudo nos trabalhadores e reformados, que perdem poder de compra. E mais gritante ainda, destrói direitos laborais a favor da precariedade e da fragilização daqueles que vivem do seu trabalho.
Estamos perplexos e indignados por nos quererem impor mais meia hora de trabalho gratuito, como solução para o aumento da produtividade. Esta medida, revela, como outras, ignorância ou estudos mal elaborados sobre a realidade empresarial e laboral do nosso país – veja-se como o caso da TSU foi deixado cair. Mais uma vez, apenas os trabalhadores são obrigados a prescindir de direitos alcançados em acordos sociais, enquanto empresários e grupos económicos não investem no trabalho dignificador e justamente remunerado, fatores fundamentais para o equilíbrio social entre trabalho e capital.
Acreditamos que há outras formas e outros caminhos que podem ser seguidos, nomeadamente, abrangendo também políticos, banqueiros e grandes grupos económicos nas medidas ou exigências de austeridade, no sentido da diminuição das assimetrias. Não deveriam ser necessárias as denúncias sobre as subvenções ou ajudas financeiras aos políticos para que prescindissem das mesmas. Por questões éticas e de responsabilidade cívica, todos os políticos as deviam renegar livremente. Mas também os empresários e grupos económicos não deviam sediar as suas empresas em paraísos fiscais com a finalidade de não pagar os devidos impostos. As empresas deverão ter presente o seu fim social, exercendo uma ética responsável. Promovendo, quando possível, a criação de mais postos de trabalho através do reinvestimento dos lucros da empresa, valorizando assim as pessoas e o crescimento económico do nosso país.
Acreditamos que há caminhos e medidas alternativos. É urgente dar vez e voz, também mediática, a outros economistas e especialistas que apresentam diferentes propostas e medidas, promotoras de um desenvolvimento justo, equitativo, inclusivo e sustentável onde cada um e todos tenham o seu lugar na mesa do bem comum. Esta nossa afirmação não é feita de ânimo leve, pois vem na sequência da reflexão tornada pública pelo grupo de economistas da Comissão Nacional Justiça e Paz, que apoiamos, assim como do recente apelo do Papa Bento XVI aos líderes das grandes economias para que “ajudem a superar as dificuldades que a nível mundial criam obstáculos à promoção de um desenvolvimento autenticamente humano e integral”.
Fátima Cunha Almeida, coordenadora nacional da LOC/MTC