Algumas reflexões sobre o Projeto de orçamento para 2012

António Soares, Comissão Diocesana Justiça e Paz de Setúbal

O Governo português entregou recentemente à Assembleia da República o Projeto de Orçamento de Estado para 2012. Já se sabe que, tendo em conta a composição da Assembleia, este projeto transformar-se-á na Lei do Orçamento da 2012, com eventuais modificações que poderão ser introduzidas após a chamada discussão na especialidade.

Antes de tecer algumas considerações sobre o texto que é conhecido, convém recordar que qualquer Orçamento de Estado é uma peça técnica de grande importância para a vida dos cidadãos, uma vez que corresponde à fixação de níveis de receita e despesas do aparelho do Estado condiciona e determina instrumentos de politica económica, fiscal e social que afetam, de forma muito significativa, não só a vida dos cidadãos dos setores público e privado, mas também a vida das empresas e outras instituições de caráter público ou particular. Em suma, o Orçamento de Estado não é uma peça inofensiva ou neutra e tem sempre associado uma certa conceção do Estado e da Sociedade, bem como um modelo ideal de relacionamento dos cidadãos.

Este Projeto de Orçamento para 2012 surge num momento histórico caracterizado por uma crise profunda que se sente à escala nacional, europeia e mundial. Portugal, como de resto outros países, ao longo dos anos, para manter e aumentar os níveis de qualidade de vida dos seus cidadãos foram recorrendo a créditos internos e externos acumulando, assim, uma dívida que ultrapassa os limites do razoável. Foi então necessário recorrer à ajuda externa e consequentemente ao estabelecimentos de acordos e compromissos com a chamada TROIKA- FMI, BCE e CE.

Compreende-se, e até se aceita, que o Projeto de Orçamento para 2012 seja um orçamento de contenção, que procure reduzir o défice das contas públicas, elimine gastos supérfluos, e respeite compromissos assumidos pelo Estado Português com os representantes dos seus Credores.

Porém, ao analisarmos com algum pormenor este Projeto de Orçamento, verificamos que ao contrário do que seria razoável, estamos em presença de um Orçamento que ultrapassa limites de contenção e metas assumidas com a TROIKA. Não conseguindo eliminar gorduras no Estado vai por um caminho «fácil» de aumentar impostos e reduzir gastos com Pessoal. (salários e remunerações acessórias).

Por este caminho o exagero na contenção terá um efeito muito negativo. A quebra do PIB (Produto Interno Bruto) de 2,8% (que o Governo prevê para 2012) será ultrapassada em muito. Para alcançar a meta do deficit fixado, o Governo esquece completamente a necessidade imperiosa de criar riqueza, condição sine qua non para a viabilidade futura do país.

Uma medida assumida no Orçamento de 2012 é o aumento do IVA – Imposto de Valor Acrescentado – por via da passagem de bens que eram taxados às taxas média e reduzida, para a taxa normal. São afetados produtos alimentares essenciais, que ficarão mais caros e a restauração. O Turismo que, como se sabe, gera importantes receitas, ficará muito afetado. Basta ter presente que outros países europeus que concorrem com Portugal têm taxas de IVA bem mais baixas. Esta subida do IVA afetará de forma cega o Consumo e não conseguirá, por via da retração, gerar as receitas que o Governo fixou

O Orçamento de 2012 é um orçamento duro, que exige sacrifícios exagerados a muitos cidadãos e que ainda por cima apresenta uma incerteza grande em relação ao alcance das metas fixadas.

Um outro aspeto crítico deste Orçamento é, como muitos tem referido, a insensibilidade social. Cortes cegos – a partir de percentagens fixadas -, na Saúde, Educação, Cultura, entre outros Setores. Também os apoios sociais aos cidadãos e à Instituições de Solidariedade Social apresentam reduções que estão para além dos limites mínimos aceitáveis.

A nível do IRS – Imposto sobre Rendimento das Pessoas Singulares – a criação de mais um escalão para rendimentos mais elevados, parece justa. Porém, ao nível das deduções à coleta, esta atinge classes mais desfavorecidas e traduzir-se-á num aumento de Imposto.

Em jeito de conclusão, julgo poder dizer-se que este Projeto Orçamento de 2012 deveria ser retocado e alterado. Deveria ser abandonada a «obsessão» pelo cumprimento do deficit e dos prazos fixados para satisfação dos compromissos. Deveria ser encarada a hipótese de baixar o IRC para estimular as Empresas a produzir, sobretudo a exportar. Criar incentivos ao investimento interno e externo. Distribuir os sacrifícios de acordo com os meios que cada um dispõe protegendo os mais desfavorecidos.

Oxalá que as alterações que venham a ser introduzidas, pelos Deputados da Assembleia da República neste projeto de Orçamento de 2012, venham neste sentido, para bem de Portugal e dos seus cidadãos.

António Soares, Comissão Diocesana Justiça e Paz de Setúbal

 

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