Um novo modelo de missionário

Na história da Igreja os modelos de evangelização têm sofrido mudanças segundo as circunstâncias, mas o centro permanece sempre o Evangelho: a Boa Nova da libertação. O próprio Jesus ordenou que o Evangelho fosse anunciado a todas as nações (Mc 16, 15). Os nossos primeiros missionários, por exemplo no Brasil, onde eu vivi minha primeira experiência pastoral, preocuparam-se em construir igrejas, hospitais, escolas, orfanatos.. Todas obras necessárias e maravilhosas que semearam tanto bem! O tempo das grandes estruturas, porém, já passou. Tudo parece indicar que chegou a hora de dar espaço a um tipo de missão mais evangélica, isto é: simples, despojada, humilde, solidária alicerçada mais no “ser” do que no “fazer”. Infelizmente, esta transição não é simples, porque exige uma metanoia, uma mudança radical de visão. Admito que pode causar medo e incerteza em nós porque exige um outro estilo de missionário para os migrantes, em parte diferente daquele para o qual fomos educados. Quanto mais se estuda a espiritualidade de Scalabrini, tanto mais se sente a exigência de mergulhar nas raízes do carisma e de questionarmo-nos: porque sou Scalabriniano? É uma pergunta corajosa que desafia sair da mentalidade do “fazer” para conduzir à relação de “ser” com Jesus e com o Espírito: único protagonista da nossa missão no mundo. Na verdade, não somos apenas seus servos? A relação de diálogo com Jesus revela a nossa identidade mais profunda, através da experiência espiritual do Fundador e da história da Congregação. Nesta relação cristológica e teológica encontra-se a espiritualidade do missionário: a força autêntica e propulsora da vocação e do próprio carisma. O nosso perfil Quais são, então, as características do missionário scalabriniano que também os animadores vocacionais e formadores de futuros missionários deverão ter presente? O scalabriniano é: – Um missionário que vive a missão com os migrantes a partir da contemplação, oração, vida fraterna em comunidade retornando “ao primeiro amor”; – Um missionário respeitoso e atento à cultura dos migrantes, que aprende a falar a língua deles e a do lugar e que, mesmo quando a situação é complexa pela diversidade de línguas e mobilidade dos missionários, se mantém um homem aberto e disponível; – Um missionário que cuida do diálogo inter-cultural e interreligioso, tanto a nível pessoal como comunitário; – Um missionário que, com humildade e lucidez, se põe a serviço da Igreja local, aceitando generosamente tarefas de animação e coordenação em organismos eclesiais (diocesanos, nacionais e regionais) e sempre pronto a ir além-fronteiras para responder à solicitação de outras igrejas e nações; – Um missionário que vive a missão na simplicidade e pobreza, evitando o protagonismo, preferindo a reciprocidade, a qualidade das relações e a escolha de meios modestos, adaptados à população local, cuidando em não cair na dependência dos mesmos; – Por fim, um missionário que se propõe viver a missão na solidariedade e na gratuidade, procurando ser sempre e em toda a parte, um defensor dos direitos e liberdade dos migrantes. A internacionalização da Congregação oferece uma contribuição nova à própria missão e enriquece o carisma scalabriniano de novas perspectivas. O dom da internacionalização não proporciona apenas um incremento quantitativo, mas contribui, de modo significativo, para a renovação qualitativa da Congregação. Momento delicado O último Capítulo foi uma ocasião providencial de reflexão sobre a situação da Congregação no sentido que avaliou o nosso modo de “ser” missionários dos migrantes, acolheu uma nova energia, descobriu novas modalidades e, ao mesmo tempo, pede que sejamos fiéis ao desígnio de Deus e fiéis na fidelidade criativa ao carisma. Esta realidade apresenta-se hoje como urgente, especialmente onde a missão com os migrantes corre o risco de descaracterização e diluição na missão global do povo de Deus, perdendo assim toda a sua força profética que encerra. O Capítulo revelou que a Congregação está diante de uma nova encruzilhada que terá que saber discernir bem. De fato, assistimos a uma série de importantes mudanças. A missão com os migrantes desenvolve-se no seio de um conjunto de fenómenos culturais, económicos e históricos nos quais a nossa “pequena” família também se encontra muito envolvida. A globalização, o pluralismo cultural e religioso, as migrações de povos com rostos novos, os conflitos étnicos e religiosos, as mudanças climáticas, o relativismo filosófico e teológico, entre outros, são fenómenos típicos do mundo pós-moderno. Esta realidade coloca-nos face a face a uma situação desconfortante: vivemos um tempo complexo e difícil, mas é também um kairós cheio de esperança. Somos chamados a viver o nosso carisma na Igreja local, mas sem deixarmo-nos absorver pelas suas urgências e o perigo de perder a originalidade do próprio carisma missionário. Não nos basta ouvir dizer que o carisma scalabriniano é necessário e desejado. Temos que ser criativos na fidelidade ao carisma pois só deste modo seremos sal da terra (Mt 5, 13) e fermento do Reino (Lc 13, 20) na Igreja e resposta efectiva para o bem dos migrantes, marítimos e refugiados. Não obstante às dificuldades encontradas, sintamo-nos animados sob o signo da esperança e do optimismo do “Ide, Eu estou convosco…” (Mt. 28, 19-20) que ressoa serenamente no nosso coração. Neste mês missionário que terá a sua Jornada Missionária Mundial no próximo domingo 21, somos convidados a renovar o nosso “ser missionário” à luz da “sequela Christi” e do Seu “mandato” na fidelidade ao carisma que recebemos do bem-aventurado Scalabrini e a o incarnarmos nas circunstâncias novas do fenómeno migratório. Roma, 14 de Outubro de 2007 Pe. Sérgio O. Geremia, c.s. e Conselho Geral

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