Sollicitudo Rei Socialis, 25 anos

João Paulo II publicava a 25 anos (30.12.1987) a encíclica ‘Sollicitudo Rei Socialis’ para assinalar o 20.º aniversário da encíclica ‘Populorum progressio’, de Paulo VI, e abordava o desenvolvimento dos povos no contexto internacional e sobre as problemáticas do trabalho e da questão social em dimensão mundial, baseando-se na experiência das suas viagens apostólicas pelo mundo.

O Papa polaco salientava a oportunidade da encíclica do seu predecessor sobre o desenvolvimento num texto em que denunciou o fosso económico-social entre o Norte e o Sul e propôs critérios para um autêntico desenvolvimento humano à luz do Evangelho.

“A Solicitude Social da Igreja, que tem como fim um desenvolvimento autêntico do homem e da sociedade, o qual respeite e promova a pessoa humana em todas as suas dimensões, manifestou-se sempre das mais diversas maneiras. Um dos meios privilegiados de intervenção, nos últimos tempos, tem sido o magistério dos Romanos Pontífices que, partindo da encíclica ‘Rerum Novarum’ de Leão XIII como de um ponto de referência, tratou com frequência a questão, fazendo algumas vezes coincidir as datas de publicação dos vários documentos sociais com os aniversários daquela primeira encíclica”, escrevia o Beato João Paulo II, na abertura do seu documento.

A Doutrina Social da Igreja não foi pensada desde o princípio como um sistema orgânico, como lembra o compêndio dedicado a esta matéria, mas foi-se formando pouco a pouco, com progressivos pronunciamentos do magistério sobre os temas sociais.

João Paulo II escreve na encíclica ‘Sollicitudo Rei Socialis’ que a Doutrina Social da Igreja pertence não ao campo da ideologia, mas ao “da teologia e especialmente da teologia moral”. Ela não é definível segundo parâmetros socioeconómicos. Não é um sistema ideológico ou pragmático que vise definir e compor as relações económicas, políticas e sociais, mas uma categoria em si mesma.

É, segundo o Papa polaco, “a formulação cuidada dos resultados de uma reflexão atenta sobre as complexas realidades da existência do homem, na sociedade e no contexto internacional, à luz da fé e da tradição eclesial. A sua finalidade principal é interpretar estas realidades, examinando a sua conformidade ou desconformidade com as linhas do ensino do Evangelho sobre o homem, e sobre a sua vocação terrena e ao mesmo tempo transcendente; visa, pois, orientar o comportamento cristão”.

A encíclica de 1987 quis sublinhar dois dados fundamentais: “por um lado, a situação dramática do mundo contemporâneo, sob o aspeto do desenvolvimento que falta no Terceiro Mundo, e por outro lado, o sentido, as condições e as exigências dum desenvolvimento digno do homem”.

O documento introduz a diferença entre progresso e desenvolvimento, e afirma que “o verdadeiro desenvolvimento não pode limitar-se à multiplicação dos bens e dos serviços, isto é, àquilo que se possui, mas deve contribuir para a plenitude do ‘ser’ do homem. Deste modo pretende-se delinear com clareza a natureza moral do verdadeiro desenvolvimento”.

João Paulo II, evocando o lema do pontificado de Pio XII, ‘Opus iustitiae pax’, a paz como fruto da justiça, comentava: “Hoje poder-se-ia dizer, com a mesma justeza e com a mesma força de inspiração bíblica (cf. Is 32, 17; Tg 3, 18), ‘Opus solidarietatis pax’: a paz é o fruto da solidariedade”.

A encíclica do beato falecido em 2005 antecipava algumas das questões mais prementes da atualidade, ao “denunciar a existência de mecanismos económicos, financeiros e sociais que, embora conduzidos pela vontade dos homens, funcionam muitas vezes de maneira quase automática, tornando mais rígidas as situações de riqueza de uns e de pobreza dos outros”.

“Estes mecanismos, manobrados – de maneira direta ou indireta – pelos países mais desenvolvidos, com o seu próprio funcionamento favorecem os interesses de quem os manobra, mas acabam por sufocar ou condicionar as economias dos países menos desenvolvidos”, alertava.

O documento deixou, no entanto, uma palavra de “confiança no homem”: “Embora conhecendo a perversão de que ele é capaz, porque sabe bem que — não obstante a herança de pecado e o próprio pecado que cada um pode cometer — há na pessoa humana qualidades e energias suficientes”, escrevia João Paulo II.

(Octávio Carmo/Compêndio da Doutrina Social da Igreja)

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