Sínodo 2021-2024: Assembleia Continental Europeia assume desafio de «sair e cuidar» de quem se sente marginalizado pela Igreja

Encontro de Praga aponta «convergência» na reflexão sobre ordenação sacerdotal de homens casados, apontada pela síntese portuguesa

 

Praga, 09 fev 2023 (Ecclesia) – A Assembleia Continental Europeia para o Sínodo 2021-2024 apontou hoje a necessidade de “sair e cuidar” de quem se sente marginalizado pela Igreja, ao encontro das “feridas existenciais” da humanidade e do planeta.

A síntese dos contributos da assembleia, iniciada este domingo em Praga, assumiu as “tensões” e questões levantadas pelos dias de debate, a partir de relatórios de 39 conferências episcopais, incluindo a portuguesa, assumiu ao símbolo do “hospital de campanha”, proposto pelo Papa, como imagem da Igreja num mundo marcado pela pandemia e a guerra.

O texto assinalou a “convergência” dos participantes sobre a possibilidade de refletir sobre “a possibilidade de ordenar presbíteros homens casados”, citando o relatório português, uma concordância que se estendeu ao debate sobre a ordenação diaconal das mulheres, em sinal contrário a uma “clara divisão” quanto à ordenação sacerdotal.

O diaconado é o primeiro grau do Sacramento da Ordem (diaconado, sacerdócio, episcopado), atualmente reservado aos homens, na Igreja Católica.

“A questão do acesso das mulheres ao ministério ordenado deve ser estudada em profundidade”, referiu a síntese, lida em inglês, durante os trabalhos conclusivos da assembleia eclesial, na capital checa.

Os participantes pediram “decisões corajosas” para dar mais a espaço a mulheres em lugares de decisão, que passam por “mudanças profundas no exercício do poder e da autoridade”.

O texto aponta a uma “liderança participada” e à responsabilização de todos, sem questionar o “valor do ministério episcopal”.

“O que diz respeito a todos deve ser discutido por todos”, indicou a síntese.

O encontro começou no domingo, com a celebração da Missa, e os trabalhos decorreram entre segunda e quarta-feira, com intervenções das delegações nacionais, encontros em grupos e sessões de trabalho no plenário, com partilha dos debates.

A síntese apresentada esta manhã assumiu que a crise de abusos sexuais “afeta profundamente” a Igreja e a sua credibilidade, deixando um elogio às “vozes corajosas das vítimas”, muitas vezes ignoradas por parte de responsáveis católicos.

A assembleia convidou a enfrentar o problema de forma “transparente”, com atenção aos “abusos de poder”.

“A Igreja está profundamente ferida e necessitada de conversão”, referiu o texto.

D. Gintaras Grusas, arcebispo de Vilnius (Lituânia) e presidente do Conselho das Conferências Episcopais Europeias (CCEE), explicou que a comissão de redação vai continuar a trabalhar no documento, durante as próximas semanas, até chegar a uma versão definitiva.

“Concluímos uma etapa da caminhada, mas não da caminhada em si”, apontou.

Na sessão de debate que se seguiu à apresentação da síntese, D. José Ornelas, presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), elogiou o “documento base deste primeiro encontro”, desejando que este “permaneça como referência”, para o futuro.

O bispo de Leiria-Fátima sustentou que, mais do que a “conclusões já feitas”, o texto deve apontar ao “caminho”, destacando tanto os pontos em que já existe convergência, como a “dignidade comum” do Batismo, e elencar as “questões em aberto”, assumindo a necessidade de as aprofundar.

O responsável português recomendou ainda que a questão da guerra na Ucrânia “seja mais bem tratada no documento”.

“A Igreja na Europa está empenhada não só em acolher aos refugiados, mas também em fazer tudo para que a paz justa possa voltar ao continente”, precisou.

Do encontro de Praga sai a proposta para uma Assembleia Eclesial para a Europa, possivelmente em 2025, nos 60 anos da constituição pastoral ‘Gaudium et Spes’, sobre a Igreja e o mundo, do Concílio Vaticano II.

Os participantes desejam uma Igreja “mais fraterna” e menos “clerical, fria e burocrática”, capaz de valorizar o contributo dos jovens.

O texto de síntese citou o contributo da CEP, no qual se apontava a necessidade de tornar as paróquias um lugar de verdadeira “cultura sinodal”, onde “todos são convidados a participar, a manifestar-se, a dar o contributo para a ação pastoral, em conselhos ou assembleias, assumindo efetiva corresponsabilidade”.

A proposta de um “novo estilo de ser Igreja” aponta à importância de criar “espaços para a experimentação” para soluções pastorais.

Os participantes assumiram a existência de pontos de vista diversos, face a temas “vastos e complexos”, em particular nos temas do casamento e da família,

“O processo sinodal levantou medos, dúvidas e perplexidades”, ouviram os participantes no encontro de Praga, realçando a tensão entre quem propõe “mudanças radicais” ou uma abordagem mais “tradicional”.

O relatório português foi também citado a respeito da importância de “dialogar com a cultura e com o pensamento contemporâneo, em temas como a inteligência artificial, a robótica ou as questões de identidade de género (LGBTQIA+)”.

“Não basta dizer que são bem-vindos, é preciso descobrir com eles o seu lugar na Igreja”, indica a síntese dos trabalhos.

Algumas delegações temem que este debate leve a mudanças “doutrinais” ou “derivas ideológicas”, colocando em causa a “identidade católica”

A crescente “secularização” das sociedades ocidentais e o impacto das migrações, bem como as “fortes tensões” na vivência da Liturgia, foram outros temas abordados.

Após esta assembleia eclesial, com a participação de 200 pessoas presencialmente e 390 online, decorre um segundo momento, de 10 a 12 de fevereiro, reservado aos bispos que presidem às 39 Conferências Episcopais da Europa.

OC

Na sequência de uma inédita consulta global às comunidades católicas, lançada pelo Papa em outubro de 2021, sete assembleias continentais que acontecem entre fevereiro e março, com a seguinte divisão: África e Madagáscar (SECAM), América Latina e Caraíbas (CELAM), América do Norte (EUA/Canadá), Ásia (FABC), Europa (CCEE), Médio Oriente (com a contribuição das Igrejas Católicas orientais) e Oceânia (FCBCO).

A primeira sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos vai decorrer de 4 a 29 de outubro de 2023; Francisco decidiu que a mesma terá uma segunda etapa, em 2024.

O Sínodo dos Bispos pode ser definido, em termos gerais, como uma assembleia de representantes dos episcopados católicos de todo o mundo, a que se juntam peritos e outros convidados, com a tarefa ajudar o Papa no governo da Igreja.

 

Sínodo 2021-2024: Delegação da Conferência Episcopal aponta necessidade de «maior transparência» e assume «tensões» na Igreja (c/fotos)

 

 

 

 

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