Cidade do Vaticano, 24 out 2019 (Ecclesia) – Três participantes indígenas no Sínodo especial para Amazónia, a decorrer no Vaticano, pediram hoje que a Igreja Católica promova uma nova abordagem com os seus povos, após “500 anos de relação assimétrica”.
Na conferência de imprensa diária promovida pela Santa Sé, o padre Eleazar López Hernández, sacerdote católico pertencente ao povo Zapoteca (México), considerou que a atual assembleia sinodal é sinal do desejo de um “novo tipo de relação com os povos indígenas”, já não colonial, mas “uma relação entre irmãos”.
“Os missionários desceram do barco [dos conquistadores] e subiram para as pequenas canoas do nosso povo”, assinalou o perito em Teologia indígena, para quem “a atitude prevalente não pode continuar a ser atirar as imagens da Amazónia ao Tibre”.
O convidado do primeiro Sínodo especial para a região pan-amazónica considera que os povos indígenas precisam de “poder manifestar a fé em esquemas próprios”, destacando ainda a importância da devoção mariana na América Latina e a compreensão de Deus, “desde o feminino”.
“Nossa Senhora de Guadalupe ajudou a entender que Deus não é só todo-poderoso mas também misericordioso”, declarou o padre Eleazar López Hernández.
Já a irmã Mariluce dos Santos Mesquita, religiosa das Filhas de Maria Auxiliadora pertencente à etnia Barassana (Brasil), convidou à valorização da “espiritualidade” própria dos povos da Amazónia, com elementos locais que já são integrados na Liturgia, “à luz da Palavra de Deus”.
Delio Siticonatzi Camaiteri, membro do povo ashaninca, grupo étnico amazónico do Peru, lamentou o ceticismo que tem encontrado perante a ideia de valorização da tradição indígena.
“Nós temos uma cosmovisão, uma forma de ver o mundo que nos rodeia: a natureza aproxima-nos mais de Deus; aproxima-nos ver o rosto de Deus na nossa cultura, na nossa vivência, em harmonia com todos os seres”, explicou.
O professor numa universidade intercultural falou da assembleia sinodal em Roma como “uma esperança”, na defesa dos direitos dos povos indígenas.
“Até hoje não nos sabem respeitar. Se começarmos a falar, matam-nos”, denunciou.
O cardeal Beniamino Stella, prefeito da Congregação para o Clero (Santa Sé), foi questionado sobre a possibilidade de criação de um Rito Amazónico, considerando que uma decisão do género tem um caráter “litúrgico, disciplinar, teológico”, pelo que precisa de ser refletida, face à “realidade muito peculiar” de centenas de etnias, com dezenas de línguas.
Quanto à proposta de ordenação sacerdotal de homens casados, em regiões remotas da Amazónia, o responsável da Santa Sé começou por dizer que a Igreja Católica é a única instituição que prega “um compromisso para sempre”, no sacerdócio, na vida consagrada e no matrimónio, e que o celibato é um elemento de “grande beleza da vida dos sacerdotes”.
“Temos de ter consciência de que o dom do celibato representa hoje um grande desafio pessoal”, acrescentou.
Com os jornalistas esteve também D. Alberto Taveira Corrêa, arcebispo de Belém do Pará (Brasil), que convidou a “valorizar as várias realidades existentes na Amazónia”, dos povos indígenas às metrópoles, elogiando a “grande sensibilidade missionária” por parte dos jovens
O arcebispo considerou que este Sínodo especial é uma “esperança muito grande” para toda a região pan-amazónica.
O documento final da assembleia vai ser votado este sábado, número a número; a aprovação depende de uma maioria de dois terços.
OC