Arquivista e bibliotecário da Santa Sé assinalou o IV centenário da morte do frade arrábido com uma comunicação sobre a sua atualidade
Setúbal, 03 jan 2020 (Ecclesia) – D. José Tolentino Mendonça afirmou esta sexta-feira no Salão Nobre da Câmara Municipal de Setúbal que Frei Agostinho da Cruz poupava no pão mas não no saber e é um “laboratório de pensamento” sobre a “comum humanidade”
“Não se fará justiça ao que foi a sua vida se não se perceber que ela foi um laboratório de pensamento acerca do significado último da nossa comum humanidade”, afirmou o cardeal português, arquivista e bibliotecário da Santa Sé.
O cardeal Tolentino Mendonça fez uma comunicação sobre a atualidade de Frei Agostinho da Cruz no âmbito das comemorações do IV centenário da morte do frade arrábido e dos 480 do seu nascimento, promovidas pela Diocese de Setúbal.
Frei Agostinho da Cruz , que nasceu em 1540, em Ponte da Barca, e faleceu em Setúbal, em 1619, foi noviço no convento de Santa Cruz, na Serra de Sintra, e viveu como eremita na Serra da Arrábida desde 1605.
A Serra da Arrábida é uma “geografia de sedentos, de mendigos do absoluto, de ascetas e visionários, de ardentes peregrinos da verdade, de mestres da vida do espírito, de gente cultíssima e destemida que se aventurava voluntariamente na extrema liberdade em relação a desapegos interiores e exteriores”, disse D. José Tolentino Mendonça.
O cardeal português lembrou que a Província da Arrábida, no tempo de Frei Agostinho da Cruz, tinha nove conventos e era expressão “mais forte e radical do franciscanismo na sua luta pelo espírito das origens” e da “vontade reformista em relação a uma vida religiosa enfraquecida e dispersa”
“Poupava-se no pão, mas não nas fontes do conhecimento e a na abertura ao saber”, afirmou o cardeal e poeta madeirense acerca da vida eremita arrábida, onde aconteciam os “debates culturais e religiosos que se travavam dentro do catolicismo e das sociedades europeias de então”
“A escola da Arrábida é de humanidade e uma ampliação da nossa capacidade contemplativa”, sublinhou.
Para o arquivista e bibliotecário da Santa Sé, Frei Agostinho da Cruz “não é uma figura para ser vivida na cerca conventual”, antes para ser escutado por todas as pessoas por dizer coisas “com significado” que interessam à “experiência de humanidade que cada um faz”
D. José Tolentino Mendonça considerou que o místico Frei Agostinho da Cruz é “um grande desafio para todos, crentes e não crentes”, porque ajuda a perceber que é “indispensável o que parece inútil” e lembra os homens que não basta viverem “acossados na luta pela sobrevivência”, mas é necessário encontrarem-se “num horizonte maior que dê sentido”.
“Frei Agostinho da Cruz faz-nos ouvir a voz silenciosa da natureza como exalação privilegiada da música de Deus”, afirmou o cardeal português, acrescentando que “o eremita e poeta arrábido teve a companhia e a ajuda da natureza para a consumação da sede amorosa de Deus que o abrasava”.
Para D. José Tolentino Mendonça, mais do que evocar a história do frade arrábido, interessa fazer um diálogo que “faça ressoar a atualidade de Frei Agostinho da Cruz”.
“Celebrar o IV centenário da morte de uma figura como a do arrábido será uma operação tanto mais fecunda quanto ousar avizinhá-lo do labirinto do presente e das mil perguntas que hoje nos ocupam”, lembrou.
IV Centenário da morte de Frei Agostinho da Cruz e os 480 anos do seu nascimento estão a ser assinalados pela Diocese de Setúbal com um programa que está a decorrer desde entre março de 2019 até maio deste ano.
A comunicação do cardeal D. José Tolentino Mendonça decorreu no Salão Nobre da Câmara Municipal de Setúbal e contou a presença da presidente da câmara, Maria das Dores Meira, que iniciou a sessão, a que seguiu uma intervenção do comissário das comemorações, Ruy Ventura, cabendo ao bispo de Setúbal, D. José Ornelas, as palavras de encerramento.
PR