Em 1993/1994, num momento em que me empenhava na busca de fundamentos teóricos que sustentassem a reconhecida importância comunicacional e pedagógica dos elementos de ordem simbólica no campo audiovisual, considerei como um instrumento de interesse para análise, a rubrica católica da RTP, Setenta Vezes Sete, que por essa altura cumpria quinze anos de existência. Daqui brotou o corpus de um trabalho de natureza académica em que quatro programas temáticos de Setenta Vezes Sete, dos anos oitenta e da autoria do Padre António Rego e do jornalista Manuel Vilas-Boas, constituíram o núcleo para uma aprofun-dada investigação sobre a natureza do simbólico e as suas potencialidades no campo educacional, com instrumentos de expressão audiovisual. Tal possibilitou a testagem daqueles programas – com aplicação de inquéritos – o que revelou as suas grandes potencialidades de comunicação (para além de outras de natureza religiosa) contidas no tratamento audiovisual de temas como a Morte, o Pão, o Silêncio e a abordagem da ritualiza-ção simbólica da vida monástica, tal como se apresentava na Cartuxa de Évora, um programa premiado internacionalmente. Esta aproximação de carácter científico ao Programa veio revelar como Setenta Vezes Sete, sobretudo nas suas manifestações de carácter temático, envolvia complexas e importantes premissas, sublinhadas por investigadores de várias disciplinas, mas todos confluindo para a revalorização do simbólico no que este possui de mais genuíno: o cósmico, o onírico e o poético, ou seja, a epifania do mistério. Na verdade, para além das traves no domínio da comunicação, estão em jogo elementos decisivos no campo da antropologia e da psicologia que estimulam valores relacionados com o dinamismo organizador da imaginação e da criatividade, essa “hipótese fecunda”, como caracteriza o filósofo francês Gaston Bachelard. O facto de a rubrica se apresentar em contexto religioso enfatizava também a problemática referente à vivência da “via simbólica” no interior da prática do cristianismo, na contemporaneidade, concretamente na Igreja Católica. Por outro lado, pelo facto de estar em jogo um programa de televisão, Setenta Vezes Sete era ocasião para se equacionar como a Igreja se relacionava com os media, à época, tendo em conta o labor conciliar. No fundo, interessava saber como se articulava o simbólico, vivido no interior da Igreja, expresso nos códigos do discurso religioso televisivo. Por tudo o que sinteticamente se enuncia verificamos estar perante programas que honram simultaneamente a Igreja e o operador televisivo que os produz, a RTP. Carlos Capucho Docente da UCP, doutorando em Ciências da Comunicação