«Saboreai e vede como o Senhor é bom»

Intervenção do Bispo do Funchal na inauguração da Domus Emmaus No ano da Eucaristia foi-me entregue uma casa deixada à Diocese. Que fazer de um edifício degradado? A carta do Papa iluminou-me a inteligência e o Espírito de Deus fortaleceu-me a vontade: Vou fazer deste edifício uma «Casa de Emaús», a «Domus Emmaus» do Funchal, para ser lugar de oração, e contemplação da Palavra de Deus, celebração da Eucaristia, além de encontros para prevenir as terríveis doenças cancerígenas que, na Madeira, ceifam numerosas vidas de crianças, jovens e adultos. No Cântico dos Cânticos, diz o esposo à sua bem amada: «Põe-me como um selo sobre o teu coração, como um selo sobre os teus braços; porque o amor é forte como a morte, a paixão é violenta como o sepulcro, os seus ardores são chamas de fogo, os seus fogos, são fogos do Senhor. As muitas águas não poderiam extinguir o amor, nem os rios o poderiam submergir» (C.C. 8, 6-7). 1. O douto São Bernardo de Claraval escreve que o esposo do Cântico dos Cânticos, é o Espírito Santo. Ele é o fogo do amor de Deus que incendeia os corações dos fiéis, é o Espírito de santidade que purifica o mais íntimo do nosso ser, é o Iluminador das consciências, o vento (ruah) que sopra onde quer e transforma a Igreja, a água, fonte de vida, que muda o deserto num jardim de Deus. A esposa do Cântico dos Cânticos, por seu lado, procura ansiosa o seu bem amado dizendo: «Durante a noite, no meu leito busquei aquele que a minha alma ama; procurei-o mas não o achei» (C.C. 3, 1). Vamos procurar este Bem amado, o Espírito Santo, dom de Deus. O Pai, segundo o padre da Igreja, S. Irineu, tem duas mãos para operar: o Seu Filho Jesus Cristo e o Espírito Santo. 2 – A 7 de Outubro de 2004, o Papa João Paulo II, deixou-nos como testamento espiritual, uma magnífica pequena carta, com o título: «Fica connosco Senhor, pois a noite vai caindo» (Lc. 24, 29). O documento é uma meditação-contemplação da cena dos discípulos de Emaús que convidaram o Senhor a ficar com eles na sua casa no próprio domingo da ressurreição. Pelo caminho, quando o Senhor, vestido de peregrino, lhes explicava as Escrituras, os discípulos sentiam o coração a arder, a Palavra do Mestre dissipava a tristeza da sexta feira santa e abria-lhes os olhos para a manhã de Páscoa. O peregrino aceitou o convite, entrou, «sentou-se à mesa com os dois, tomou o pão e abençoou-o, depois partiu-o e entregou-lho. Nisto os olhos dos discípulos abriram-se e eles reconheceram Jesus. Jesus, porém desapareceu da sua presença (Lc. 24, 30-31). Movidos pelo fogo do encontro voltam à cidade de Jerusalém donde tinham saído e unem-se ao grupo dos discípulos que tinham abandonado, para narrar o encontro com o Mestre. O Papa aconselhou a Igreja para naquela ano celebrar, adorar e contemplar o mistério da Eucaristia, na Santa Missa e na adoração eucarística. 3 – Quando há 24 anos cheguei à diocese, uma das grandes necessidades para o crescimento espiritual da comunidade cristã, era a falta de uma digna casa de retiros. Um cristão generoso ofereceu um terreno à diocese, junto do Santuário da Paz. Resolvi erguer nele uma casa para os Exercícios Espirituais, sob a protecção de Maria, mãe da Igreja. No ano da Eucaristia foi-me entregue uma casa deixada à Diocese. Que fazer de um edifício degradado? A carta do Papa iluminou-me a inteligência e o Espírito de Deus fortaleceu-me a vontade: Vou fazer deste edifício uma «Casa de Emaús», a «Domus Emmaus» do Funchal, para ser lugar de oração, e contemplação da Palavra de Deus, celebração da Eucaristia, além de encontros para prevenir as terríveis doenças cancerígenas que, na Madeira, ceifam numerosas vidas de crianças, jovens e adultos. Desta forma respeitei integralmente a vontade da doadora da casa, e o edifício será lugar de defesa da vida, tanto a do corpo como a do Espírito. No entardecer do meu ministério episcopal, surge mais um oásis de silêncio e paz para «saborear e ver como o Senhor é bom», fomentar a união com Deus e a comunhão eclesial e suscitar nos cristãos a urgência de testemunhar e evangelizar na sociedade e na cultura. Só o silêncio torna o homem capaz de interpretar o significado das palavras, só escutando a voz interior o homem se encontra perante si mesmo, sem manto, nem coberturas, nem sombras. Descobrir os sinais da presença de Deus na estrada da nossa vida é urgente, e responsabilidade de cada um. Parar e entrar na Casa de Emaús significa aceitar que os nossos projectos devem partir de Cristo morto e ressuscitado, passar do provisório ao definitivo, e reconhecer os sinais do ressuscitado nos acontecimentos quotidianos, em relação com Deus e outros caminhantes que seguem pela mesma estrada. «Para Ti, o silêncio, canta o Salmista (Salmo 65, 2), é louvor, ó Deus, em Sião». A oração tem a sua casa no Silêncio, o Silêncio é um coração que escuta e espera. É um momento gratificante inaugurar esta pequena estrutura onde os nossos fiéis possam orar e descobrir o ressuscitado ao partir do pão. 4 – O evangelho desta Eucaristia apresentou-nos o Sermão do Monte ou das Bem-aventuranças, indicou-nos quais são os bem-aventurados – os pobres em espírito, os que choram, os mansos de coração, os que têm fome e sede de justiça, os misericordiosos, os puros de coração, os construtores da paz, os que sofrem perseguição por causa da justiça. Bem-aventurado é o insultado, o perseguido, o caluniado por causa do Senhor. Nenhum profeta ou santo poderia fazer esta afirmação: «por Minha causa» (Mt. 5, 11). O profeta Elias, escondido no deserto para não ser morto por uma rainha pagã foi alimentado com o pão que lhe trazia um corvo e com a água que brotava do rochedo. Pão e água! Que sinais tão ricos e proféticos – o pão da eucaristia e a água símbolo do Espírito Santo. O Ano da Eucaristia terminou, mas não a necessidade de encontro com o Deus vivo e o Espírito de Santidade. Peço a Deus para que, a exemplo da esposa do Cântico dos Cânticos muitos dos nossos diocesanos procurem um colóquio com Deus nesta «Domus Emmaus», peço também à Virgem de Nazaré, a cheia de graça, para ser nossa mãe e Mestra e nos faça discípulos na sua escola, para podermos «saborear e ver como o Senhor é bom» (Sl.34, 9). † Teodoro de Faria. Bispo do Funchal

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