Portugal anseia pela Ordem de Cister

A Ordem de Cister deu a Portugal alguns mosteiros com a “maior tradição histórica, artística e espiritual da nação” – disse à Agência ECCLESIA José Ribeiro Dias, elemento da organização do IV Congresso Internacional Sobre Cister em Portugal e na Galiza.

De 1 a 3 deste mês decorreu em Braga e também em Oseira (Espanha) este congresso para aprofundar o papel de Cister na cultura portuguesa e da Galiza. “Os mosteiros eram foco de civilização” porque “foram eles que contribuíram para arrotear as terras do país” – sublinhou. E acrescenta: “ainda hoje se fala da agricultura de Alcobaça”.

Sobre a possibilidade do regresso da Ordem de Cister a Portugal, José Ribeiro Dias afirma que Portugal “sente a falta de uma realidade que foi uma força grande neste país”. A diocese da Guarda foi um dos locais apontados para este regresso. Segundo este elemento da organização “existe o desejo para que voltem”, mas “não existe um sítio definido”.
Num mundo secularizado, as congregações religiosas têm dificuldades no recrutamento de vocações. Apesar deste deficit vocacional, “já existem alguns noviços nos mosteiros espanhóis”. Estes também manifestam interesse “em lançar uma semente em Portugal” – disse.

Mosteiro de Alcobaça: uma jóia da arquitectura cisterciense
Uma obra admirável, tanto pelo tamanho que impressiona qualquer um como pela beleza da sua arquitectura interior e exterior. Referimo-nos ao Mosteiro de Alcobaça. Verdadeira jóia da arquitectura cisterciense na Europa, este templo foi fundado em 1153 por D. Afonso Henriques, em cumprimento da promessa pela conquista de Santarém aos árabes, sendo então doado a S. Bernardo, abade de Claraval. Nesse longínquo século, o monarca entregou aos «Monges Brancos», conhecidos como tal por oposição aos monges Beneditinos, uma vasta área, denominada couto de Alcobaça. Entrega para promover o cultivo das terras.

Nas comemorações dos 750 anos da Sagração da Igreja e dos 850 anos da Fundação da Abadia e da morte de S. Bernardo de Claraval, D. Manuel Clemente, bispo do Porto, acentuou que “os mosteiros foram e continuam a ser, no coração da Igreja e do mundo, um sinal eloquente de comunhão, um lugar acolhedor para aqueles que buscam Deus e as coisas do Espírito, escolas de fé e verdadeiros centros de estudo, diálogo e cultura para a edificação da vida eclesial e também da cidade terrena, à espera da celeste”.

Património Mundial rodeado de terrenos férteis
Com a classificação atribuída pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), em 1989, o Mosteiro de Alcobaça domina esta cidade, situada numa fértil região agrícola marcada por suaves colinas e pelos rios Alcoa e Baça. Alguns historiadores adiantam mesmo que é um dos poucos monumentos europeus que conserva intacto o conjunto das dependências medievais e a sua Igreja é a maior em estilo gótico primitivo construída em Portugal, na Idade Média.

Um patamar – para onde convergem cinco escadarias e rodeado por pináculos – conduz à entrada da Igreja do Mosteiro, de cuja fachada primitiva resta um formoso portal gótico ladeado pelas imagens de S. Bento e S. Bernardo. Estas estão encimadas por quatro virtudes e, ao centro, uma rosácea de aprimorado rendilhado. Caminhamos para a maior Igreja de Portugal e estamos perante uma das abaciais de maiores dimensões levantadas pelos cistercienses.

Esta Igreja, um magnífico templo de três naves, é um exemplo típico da arquitectura religiosa gótica. A nave central tem uma profundidade e uma altura das abóbadas de ogiva absolutamente impressionantes. No transepto, os túmulos de Inês de Castro e de D. Pedro (as melhores realizações escultóricas da tumulária medieval portuguesa) estão colocados frente a frente por vontade real, de modo que os olhares se cruzem. Um juramento de «amor eterno» – segundo a interpretação de alguns. Para outros, simboliza o imaginário cultural português. No fundo a história resume-se a uma paixão de D. Pedro com Inês de Castro, uma jovem e bela dama de honor de sua mulher, Constança de Castela.

A História da sua fundação, em 1153, está contada em painéis de Azulejos do século XVIII que forram as paredes da Sala dos Reis. Ao «lermos» estes painéis, ficamos a saber que D. Afonso Henriques, primeiro Rei de Portugal, prometeu dar a S. Bernardo as suas terras de Alcobaça se conquistasse a praça de Santarém aos mouros, o que aconteceu em 1147. No plano superior a estes painéis de azulejos, o visitante encontra as estátuas dos nossos monarcas até D. José I. Estatuária moldada pelos monges barristas de Alcobaça. O claustro de D. Dinis ou do silêncio, a Sala do Capítulo, o Parlatório, o Dormitório e a celebre cozinha deste mosteiro mostram também a grandiosidade desta jóia do gótico. No final da visita, tem-se a sensação de ter saído de uma longa aula de história.

Primeira Escola Pública do Reino
Em 1178 inicia-se a construção do mosteiro, à semelhança da Abadia de Claraval, a Casa Mãe, em França, da nova Ordem de Cister. A cidade de Alcobaça ficou ligada à obra civilizadora que os monges de hábito branco aí iniciaram: uma escola pública e o aproveitamento das terras para o cultivo. Uma Escola de Agricultura que, nos tempos actuais, ainda dá frutos proveitosos à localidade.

O poder do abade estendia-se a muitos quilómetros de distância: S. Martinho do Porto, Aljubarrota, Alvorninha e S. Pedro de Muel. Os antigos portos de Alfeizerão e da Pederneira, que actualmente não recebem as águas do Atlântico devido ao assoreamento do golfo existente na época medieval, ainda faziam parte do Couto de Alcobaça. Locais estratégicos para o comércio na altura.

De referir que foi em Alcobaça que surgiu a primeira farmácia de Portugal e a primeira Escola Pública do reino, em 1269, tendo como professores os monges. Leccionava-se Gramática, Lógica e Teologia. As pedras do mosteiro são «testemunhas» que foi ali que se escreveu grande parte dos códices medievais portugueses e se produziu o maior estudo histórico sobre Portugal (Monarquia Lusitana, século XVII) dirigido por Frei António Brandão. Por iniciativa do abade de Alcobaça foi criada em Portugal a primeira Universidade de Coimbra.

No século XVII (1648) foi criado o colégio Nossa Senhora da Conceição, Escola de Ensino Superior, que terá sido extinta em meados do século XVIII, e que conferia diplomas de valor igual aos concedidos pela Universidade de Coimbra. Naquele mosteiro chegou a existir a maior biblioteca do país e, no período áureo, uma das maiores do mundo. Um espólio riquíssimo que desapareceu com as invasões francesas e do saque que se seguiu à extinção das ordens religiosas, em 1834.

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