Polémicas do diálogo entre religiões: depois de Fátima, Paris

D. José Policarpo desvalorizou incidente na Catedral de Notre-Dame O Cardeal-Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, desvalorizou o incidente registado sábado na Catedral de Notre-Dame, em Paris, quando um jovem definiu como heresia a visita de representates de outras religiões ao Santuário de Fátima. “O Santuário de Fátima não foi manchado, até foi bom para se perceber que a polémica, que tem dado algum alimento em Portugal, tem origem em extremistas lefebrevianos”, disse à Agência Lusa D. José Policarpo, no final de uma missa que concelebrou com o Arcebispo de Paris, cardeal Jean-Marie Lustiger, na Catedral de Notre-Dame, por ocasião do Congresso Internacional da Nova Evangelização (ICNE). A intervenção de D. José Policarpo, durante o encontro dos 5 cardeais promotores do ICNE, havia de ficar marcada pela ousadia de um jovem, que diz pertencer a um movimento chamado de “Juventude Católica de França”: enquanto recordava Fernando Pessoa, este jovem de 22 anos entregava aos cinco cardeais um fotocópia com memórias de presença de ortodoxos e hindus no Santuário de Fátima, apelidando de heréticos os gestos de acolhimento que o santuário procura fazer a quem o visita. Retirado da Catedral de Notre-Dame, local onde decorreu esta conversa dos congressistas do Paris Toussaint 2004 com os cardeais, o jovem (quer pertence, claramente, a movimentos fundamentalistas que, nos últimos anos, têm tentado “assaltar” Fátima) mereceu o comentário de D. José Policarpo: “Respeitamos o seu gesto, mas pedimos também que nos respeitem a nós”. No folheto, assinado por um Movimento da Juventude Católica de França, refere-se a presença em Fátima, em 2003, de um bispo ortodoxo “cismático e herético”, a realização de um congresso inter-religioso há um ano e a ida de um grupo de hindus à Capelinha, já em Maio deste ano. Não se sabe se as culpas de D. José Policarpo passam por ter negado a alegada crise entre a Santa Sé, o Santuário de Fátima e a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP). A questão agora levantada à volta de Fátima aparece, de facto, como um acontecimento fora de tempo e de sinal contrário a toda a acção de João Paulo II, que num esforço religioso e diplomático reconhecido por todos tem procurado mostrar que o caminho para a paz é o da maturidade humana e espiritual, que conduz ao diálogo e evita o tão temido “choque de civilizações”. O Papa, que entrou em sinagogas e mesquitas, sabe que a guerra é provocada pela falta de respeito à cultura, à religião, à liberdade legítima do outro, e tem vindo a abrir a Igreja Católica ao diálogo com as outras religiões, de uma forma que até, muitas vezes, não é recíproca. Esta acção não é compreendida nem bem aceite por todos os católicos, pelo que não é surpresa que o Santuário de Fátima se veja confrontado com esta onda de contestação. Circula pela Internet a “Carta aberta aos Fiéis de Portugal sobre o escândalo no Santuário de Fátima”, onde as iniciativas inter-religiosas são classificadas como “sacrilégio”, as outras religiões classificadas de “seitas pagãs” e os cristãos não-católicos designados como “hereges e cismáticos” As manifestações de desagrado, que falam em “profanação” e “blasfémia”, começaram desde que se realizou em Fátima o Congresso sobre santuários e religiões, em Outubro de 2003. As tensões aumentaram com a vinda de um grupo de hindus ao Santuário. Para os defensores de (legítimas) posições mais conservadoras, expostas em importantes sítios católicos internacionais, o que está em causa é a intenção de abrir definitivamente o Santuário a outras religiões, como um centro inter-religioso, algo que nunca foi assumido por nenhum dos seus responsáveis. A questão foi utilizada por grupos fundamentalistas, com artigos de grande impacto na Internet, na imprensa mundial e com campanhas junto de vários episcopados. A campanha de contestação foi liderada pela revista “Fatima Crusader” (O Cruzado de Fátima) o maior periódico do mundo dedicado à Mensagem de Fátima, ligada às posições do padre canadiano Gruner, conhecido pela defesa de valores tradicionais. A campanha agressiva contra o Bispo de Leiria-Fátima e o Reitor do Santuário espalhou milhões de mensagens na Internet, criticando as intenções supostamente “panreligiosas” dos mesmos. O ecumenismo é considerado como algo que teria “horripilado todos os Papas antes de 1958” e nunca se fala em diálogo inter-religioso sem utilizar aspas. A nova basílica de Fátima, a igreja da Santíssima Trindade, é considerada como uma ameaça e classificada como “centro inter-religioso”, mesmo depois do categórico desmentido dos responsáveis do Santuário em relação a esse facto, deixando claro que “não temos, nem nunca tivemos, intenção de realizar, na igreja em construção, quaisquer celebrações que não estejam previstas nas directrizes da Igreja Católica”. Um grupo de leigos escreveu ao Papa contestando “o projecto de transformação do Santuário de Fátima num centro inter-confessional, aberto a todas as religiões”. A carta circula pela Internet, falando em “profanações pagãs do Santuário”, e faz parte de uma contra-ofensiva geral contra as “blasfémias” e “heresias” que, alegadamente, estão a toma conta de Fátima.

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