Presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN) destaca impactos da pandemia, da guerra e da crise energética
Porto, 19 jun 2022 (Ecclesia) – O padre Agostinho Jardim Moreira, presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN), alertou para o aumento “substancial” da população em risco, em Portugal, face aos impactos da pandemia, da guerra e da crise energética.
“Na pandemia que houve um aumento substancial e já estávamos com 23% da população pobre, ou melhor em risco de pobreza, sabendo que este número corresponde ao número após a transferência das prestações sociais. Sem as prestações sociais íamos para 43%: quer dizer que a realidade nacional é bastante mais sombria do que aquela que normalmente corre”, adverte o responsável, convidado da entrevista semanal conjunta Ecclesia-Renascença, emitida aos domingos.
O sacerdote da Diocese do Porto sublinha que o combate à pobreza “passa pelo desenvolvimento integral de todas as capacidades emoções, inteligência, vontade, afeto, família, comunhão”.
“Reduzir a luta da pobreza, apenas a dar um ordenado e a dar dinheiro não chega, é reduzir a pessoa à baixa condição de animal, ou pouco menos”, aponta.
Em Portugal ainda são precisas cinco gerações para que uma família saia da pobreza. Quer dizer que o dinheiro que se gasta aos milhões e milhões não tem um resultado prático na libertação de ninguém da pobreza a curto prazo”.
O presidente da EAPN sustenta que o combate à pobreza em Portugal “exige uma mudança estratégica que é também estrutural na vida e na governação do país”.
O padre Jardim Moreira lamenta o sucessivo falhanço das estratégias de combate à pobreza, com milhões de euros gastos para “alimentar a situação”, sem a mudar.
“Não se investe na transformação da situação das pessoas em pobreza”, indica.
Para o especialista, é preciso mudar o conceito de luta contra a pobreza, dirigindo-a “diretamente à família, no seu todo, ao seu agregado”.
Apontando à chamada “bazuca” e aos fundos comunitários para o pós-pandemia, o presidente da EAPN defende que este dinheiro deve servir “para a mudança da sociedade e das causas que geram este problema [da pobreza] que já é endémico em Portugal”.
A entrevista aborda a “faceta feminina” da pobreza, mundialmente e em Portugal.
“Olhar só para as mães solteiras com olhar de piedade, não basta: é preciso um olhar de justiça e de responsabilidade para com quem gera um filho”, exemplifica o convidado.
O padre Agostinho Jardim Moreira sublinha que “não é só a economia que mata, mas a pobreza mata” também, atingindo pessoas que são “vítimas da injustiça e vítimas de uma situação de desigualdade”.
“É necessário assumir que somos também coniventes no assassinato, de alguma maneira, daqueles que morrem nesta situação”, acrescenta, sublinhando que “a pobreza é uma injustiça, uma forma de corroer a democracia”.
O sacerdote comenta ainda a entrada da EAPN-Portugal na concertação social.
“Francisco Assis (presidente do CES) está empenhado em que nós participemos no Conselho Económico e Social, considerando que essa é uma das facetas indispensáveis para conjugar as políticas nacionais”, indica.
Octávio Carmo (Ecclesia) e Henrique Cunha (Renascença)