Pobreza: Estatísticas escondem casos reais e situações «crónicas»

Cáritas Portuguesa e Comunidade Vida e Paz sublinham dados indicativos de redução do número de pobres, mas afirmam que valor de 460 euros como limiar da pobreza é «irrealista»

Lisboa, 17 out 2019 (Ecclesia) – A Cáritas Portuguesa e a Comunidade Vida e Paz consideram que os dados revelados hoje sobre de pessoas pobres em Portugal devem ser consolidados com respostas de maior proximidade que atinjam os grupos “crónicos de pobreza”.

“Apesar de os dados no Instituto Nacional de Estatística e do Eurostat não corresponderem a 17%, pois apontam para pouco mais de 20%, parece ser consensual haver menos 500 mil pobres em Portugal. Isto é uma satisfação, só nos podemos alegrar. Mas é preciso que esta diminuição represente uma passagem de uma condição de pobreza para uma existência mais digna, mas de forma consistente”, assinala à Agência ECCLESIA o presidente da Cáritas Portuguesa, Eugénio Fonseca, comentando dados revelados no Dia Mundial da Erradicação da Pobreza que hoje se assinala.

Dados revelados neste Dia Mundial da Pobreza pela Pordata indicam que em 2017 se registou o menor número de pessoas consideradas pobres em Portugal desde 2003 (17,3%), numa melhoria que nos anos de crise, 2013 e 2014, atingiu cerca de 19,5% da população, um em cada cinco portugueses.

Para o diretor-geral da Comunidade Vida e Paz, Henrique Joaquim, o facto de as estatísticas indicarem cenários “macro” e ser necessário atender a dados “que indiquem situações reais” e grupos “crónicos de pobreza” como é o caso de pessoas em situação de sem-abrigo ou com doença mental.

Em Portugal é-se considerado pobre quando o salário fica abaixo dos 460 euros mensais, um valor consensualizado na União Europeia que, indica Eugénio Fonseca, deveria ser revisto: “Todos sabemos que para quem tem de orientar a sua vida diária esta verba não é suficiente e gera dificuldades no quotidiano”.

Os responsáveis alertam para a ajuda de políticas sociais a pessoas que são trabalhadoras mas que não auferem um rendimento suficiente para a sua sobrevivência ou que saem do limiar da pobreza mercê de ajudas sociais.

“Na Cáritas aparecem cada vez mais pessoas trabalhadoras mas continuam pobres porque os seus rendimentos estão abaixo destes níveis”, esclarece.

Henrique Joaquim adverte para em caso de recuo económico e nas políticas sociais em Portugal haver consequências para as pessoas mais desprotegidas.

A pobreza junto dos jovens preocupa igualmente os responsáveis, uma situação que, frisam, diminuiu a democracia e participação cívica e coloca em causa a demografia nacional.

“É um barril de pólvora: que condições têm para pensar num futuro de família e continuidade? Se não conseguem ter a sua vida assegurada como vão pensar no futuro”, questiona o diretor-geral da Comunidade Vida e Paz.

“Um país que tem cidadãos a viver em piores condições que animais não é um país democrático, não é desenvolvido. Portugal está no grupo dos países desenvolvidos, integrado na União Europeia que se tem preocupado mais com questões económicas do que com os propósitos para que foi criado”, critica o presidente da Cáritas.

Henrique Joaquim afirma ser hora de olhar para a pobreza como um “problema atual” e sinaliza a necessidade de “rever medidas sociais” que, critica, “estão focadas no sistema e não na pessoa”.

“Temos que ser ousados e criativos para encontrar medidas que completem as políticas nacionais, medidas ajustadas, concertadas, com maior proximidade e a nível local”, sublinha.

O presidente da Cáritas pede um debate da nação anual sobre a pobreza uma vez que, sublinha, a estratégia para a erradicação da pobreza já ter sido encontrada e ser necessário atender à “má distribuição da riqueza produzida”.

“O dia da erradicação da pobreza quer-nos dizer que é possível erradicar a pobreza absoluta. Essa é possível erradicar. Não é uma fatalidade ser pobre, os 500 mil que saíram do limiar são evidência disso. Temos de cuidar melhor da distribuição da riqueza e isso faz-se fazendo cair o IRS no capital e não nos rendimentos do trabalho”, sugere Eugénio Fonseca.

LS

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