Onde houver trevas levemos a luz

D. Manuel Pelino, Bispo Emérito de Santarém

Ao narrar o início da pregação de Jesus, São Mateus comenta com as palavras proféticas de Isaías: “O povo que andava nas trevas viu uma grande luz” (Mt 4, 12-17). Desta forma diz-nos que o evangelho de Jesus Ilumina a existência humana e os acontecimentos da história. Refere-se, pois, não tanto às trevas físicas, mas sobretudo às espirituais e humanas. A escuridão está presente em todos os tempos da história da humanidade e faz-se sentir agudamente no nosso tempo, apesar do proclamado “século das luzes”. Por trevas podemos entender as variadas feridas da humanidade como as causadas pela pandemia, ou pela guerra cruel e sem sentido, ou também a violência, a solidão, a pobreza, as fraudes, os escândalos, as mentiras, a distorção da verdade e tantas outras expressões da força da iniquidade. Neste contexto entendemos a importância da mensagem da luz do evangelho como caminho para a verdade, a justiça, a paz, a fraternidade, a alegria. Foi a missão de Jesus: “Eu sou a luz do mundo, quem Me segue não nadará nas trevas, mas terá a luz da vida (Jo, 8, 12)”. De facto, as Suas palavras iluminavam e os Seus gestos mostravam humildade, misericórdia e bondade para com todos. A Sua vida foi, realmente, um clarão de esperança que iluminou e transformou quantos se encontraram com Ele.

Levar luz onde há trevas é também a missão que Jesus confiou a nós seus discípulos que formamos a Sua Igreja: “Vós sois a luz do mundo. Não se acende a candeia para a colocar debaixo do alqueire, mas sim em cima do candelabro e, assim, alumia todos os que estão em casa. Assim, brilhe a vossa luz diante dos homens de modo que “vendo as vossas boas obras”, glorifiquem o Vosso Pai que está nos céus” (Mt 5, 12-16). Toda a gente procura a luz, a esperança, a alegria. No coração das pessoas habita o apelo da luz. Saberemos nós transmiti-la? Ou limitamo-nos a lamentar e a censurar as trevas? Elas existem e colocam resistência e impedimento à luz da verdade e do bem. Por isso, todos precisamos de nos purificar e converter para que a luz nos ilumine plenamente e possa irradiar a partir da experiência pessoal de cada cristão e de cada comunidade cristã de modo que as pessoas a possam “ver” e experimentar. Levar a luz é levar medicina a quem está ferido; defender a verdade contra a sua distorção; levantar quem está caído. A vocação e a missão do cristão é a de caminhar para a luz e levar a luz às “almas” (à vida concreta). Um cego não pode guiar outro cego diz também o evangelho. Se não procuramos a luz de Cristo e não nos esforçamos por nela caminhar, não poderemos irradiá-la. A ignorância religiosa e a incoerência entre a vida e a fé, são fortes obstáculos à credibilidade do evangelho.

“Revistamo-nos das armas da luz”, recomenda-nos São Paulo (Rm 13,12). A vida cristã é um combate contra as forças do mal, as trevas que nos cercam e habitam também em nós. Para este combate, o Senhor oferece-nos armas eficazes (cf Ef 6, 10-18). A eficácia destas armas espirituais vem do Espírito Santo. Para que o Espírito nos ilumine e guie, precisamos de O escutar e invocar através do silêncio, da meditação na Palavra de Deus, da oração do coração, do desenvolvimento da vida interior. Desta maneira podemos crescer na alegria da ressurreição e ser portadores da esperança e da luz pelas boas obras da caridade.

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