O Dia Mundial da Pessoa Doente

Desde 1992 que o dia 11 de Fevereiro é o Dia Mundial da Pessoa Doente e sempre para esse dia o Papa escreve uma mensagem de esperança, de amor e de fé. Na mensagem para 2004, João Paulo II insiste no seu ensinamento do papel central de Maria – escolhida para ser mãe humana do corpo humano de Jesus – como mãe espiritual de todos os que, pela Fé, são irmãos de Jesus Cristo. Assim, diz o Papa, “ aos pés da Cruz, Maria sofre em silêncio, participa de modo muito especial, no sofrimento do Seu filho estabelecida como Mãe da Humanidade está pronta a interceder para que cada um alcance a saúde como salvação”. Toda a primeira parte da Mensagem é influenciada pelo local da celebração – o Santuário de Lourdes e os seus prodígios na cura corporal e espiritual dos seres humanos – e pela circunstância dos 150 anos da proclamação, por Pio IX   do Dogma da isenção de Maria daquele orgulho humano que levou e leva a dizer “não” ao sim amoroso de Iavé. Sem esta isenção, dificilmente essa jovem e inocente judia, prometida de José segundo o costume hebraico, teria dito “sim” à proposta, enviada por Iavé, de gerar um filho sem ter “conhecido homem”. Nesta linha, o Papa desenvolve a ideia de que é possível, ao homem actual, aspirar, simultaneamente, à saúde do corpo e do espírito. O sofrimento, que tantas vezes ocupa o espírito das pessoas doentes, pertence à situação histórica do homem como ser auto-consciente; cabe a cada um aprender a aceitá-lo, juntando-o aos outros dons do espírito. Por isto, o cristão pode integrar o seu sofrimento na alegria permanente de ser irmão de Cristo, cujo sofrimento salvífico é raiz dessa alegria  e da paz e felicidade que há nela. Não se trata de retórica teológica, trata-se de realidades concretas. Tenho visto e acompanhado muitos cristãos que não se fecham sobre o sofrimento da doença mas, bem pelo contrário, se abrem à generosa comunicação da alegria de viverem em “boa saúde espiritual”, até à cura ou até à morte. E não é resignação sofrida ou tristeza emudecida, é comunicação vibrante da pessoa espiritual que se agiganta sobre as mensagens de sofrimento que o corpo doente lhe envia. Na parte final, João Paulo II é mais directo e objectivo. Os progressos científicos do nosso tempo permitem-nos conhecer melhor a vida, diz, e a este melhor conhecimento deve corresponder a obrigação de acolher, respeitar e defender a vida, desde o seu início, o embrião, até ao seu fim natural, o homem moribundo. Esta defesa, respeito e acolhimento  cabe primordialmente à família, cuja protecção tem de ser assegurada. Nela é acolhido o nascituro, nela deve o moribundo terminar os dias da sua existência terrena. Aludindo à “engenharia genética” afirma que todo o progresso autêntico neste domínio deve ser encorajado desde que tal progresso respeite sempre os direitos e a dignidade da pessoa desde a sua concepção. Porque nenhuma pessoa pode pretender ter autoridade para destruir ou manipular a vida de um ser humano. Reafirmar o primado da vida sem diabolizar a investigação biológica tem sido uma tónica presente em inúmeros discursos papais e é acolhida, em muitos centros de pesquisa, com respeito e simpatia. Os investigadores do fenómeno da vida não são, à partida, inimigos da Vida; por exemplo, quando aspiram a usar embriões humanos que os técnicos da procriação medicamente assistida, infelizmente, colocaram na situação desgraçada de não terem direito ao desenvolvimento, porque são “sobras” e estão já excluídos de qualquer projecto parental, nem terem direito à vida, já que a congelação os não conservará vivos indefinidamente, os investigadores procuram obter conhecimentos benéficos a partir de embriões cuja vida não pode já ser salva. Eu sei que uma finalidade boa e beneficente não justifica o uso de meios maleficentes, salvo em situações de força maior ou de estado de necessidade como é o caso de matar o outro para salvar a própria vida. Mesmo que a investigação torne o embrião inviável e antecipe a sua morte, o primum movens do investigador não é matar o embrião e isso deve ser tido em conta no diálogo entre a nossa posição de respeito absoluto pela vida e a posição dos que relativizam esse direito. O mesmo deve acontecer no debate sobre eutanásia como solução para os doentes incuráveis e para os moribundos. A intenção pode ser boa, embora a solução proposta seja má. Esteve agendada para a reunião plenária de 29 de Janeiro da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa uma proposta de um deputado suíço que apelava aos 43 Países do Conselho para que adoptassem, no seu ordenamento jurídico interno, leis semelhantes às que existem na Holanda e, recentemente, também na Bélgica que permitem que os médicos matem os seus doentes sem cometerem crime de homicídio e, portanto, sem serem julgados e punidos. Incapaz de perceber que o pedido de eutanásia é um pedido de ajuda e apoio a um sistema de saúde que não sabe ou não quer cuidar da pessoa que sofre, o deputado suíço Marty acha que o melhor é matá-la. Felizmente que o bom senso triunfou e a Mesa da Presidência da Assembleia deliberou retirar da Agenda do Plenário, sine die, tão insólita e ameaçadora proposta. O doente incurável e aquele que se aproxima do fim tem de sentir que o seu sofrimento é acolhido por pessoas dedi-cadas que lhe vão dar todos os cuidados de conforto, um afecto atento e carinhoso e muito respeito pela sua dignidade e pelos seus valores morais e espirituais. Aos obreiros destas tarefas de acolhimento de doentes em fim de vida – médicos, enfermeiros, outros profissionais de saúde, voluntários e, principalmente, sacerdotes – a todos o Papa agradece na parte final da mensagem para o Dia Mundial da Pessoa doente. E bem merecem o agradecimento. Cuidar de quem sofre, no corpo e no espírito, é sinal identificador do profissional de saúde cristão, mesmo que as condições para este cuidado pluridisciplinar não sejam as melhores. Acolher, neste cuidado, o sofrimento dos que se aproximam do fim é o único meio de respeitar, neles, a dignidade humana. A eutanásia não acaba com o sofrimento da pessoa, acaba é com a pessoa que sofre, por intermédio da maior das indignidades que é matá-la. Daniel Serrão

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top