Movimentos integristas e esotéricos chegam a Fátima

Entrevista ao Bispo de Leiria-Fátima, D. António Marto Em entrevista ao Diário de Notícias (edição de 13 de Maio) e ao Programa 70×7 (emissão de 13 de Maio, na RTP2), D. António Marto analisa os 90 anos das Aparições. Entrevista de Licínio Lima (DN) e Paulo Rocha (70×7) Comemora-se o 90.º aniversário das aparições. O fenómeno de Fátima foi criado pela Igreja? Fátima é um sinal extraordinário da misericórdia de Deus para com a humanidade. Um sinal surgido num período histórico de risco e de autodestruição. A Igreja começou por ter alguma prudência em o aceitar. Por isso, não se pode dizer que a Igreja impôs Fátima. Como dizia o cardeal Cerejeira, foi Fátima que se impôs à Igreja. E ao mundo… sobretudo no pontificado de João Paulo II. Quem lhe deu mais visibilidade foi, de facto, João Paulo II. De algum modo sentiu-se envolvido naquela chamada terceira parte do segredo, lendo nele não só o atentado que sofreu em 1981, na Praça de S. Pedro em Roma, mas também todas as perseguições à Igreja, incluindo os mártires da fé do século XX. É fácil para os teólogos enquadrar a mensagem de Fátima no Evangelho? É preciso encontrar chaves de compreensão, como fazemos, por exemplo, em relação à mensagem da Bíblia. Esta também nos chega em categorias, em símbolos do tempo e da região de Jesus. E nós interpretamos o que a mensagem esconde por trás das parábolas, dos provérbios, etc. Acontece o mesmo com a mensagem de Fátima. Que é uma mensagem privada… Gostaria que se distinguisse bem entre uma revelação privada e a grande revelação de Deus na história da salvação. Uma revelação privada não vem trazer novas revelações, nem novas curiosidades sobre Deus nem sobre a fé. Portanto, Fátima não é o Evangelho de Jesus, nem se substitui à Igreja. Está a relativizar o fenómeno? Não relativizo nada. Os próprios pastorinhos, sendo crianças, souberam distinguir muito bem a primazia do mistério de Deus. É interessante quando o Francisco diz: “Eu gostei muito do anjo, gostei mais de ver Nossa Senhora, mas do que mais gostei foi de ver Nosso Senhor naquela luz”. Têm chegado a Fátima muitos movimentos marianos integristas? A Fátima chega de tudo. Chega o trigo e chega o joio. Há pessoas e movimentos que às vezes querem aproveitar-se de Fátima e do clima de acolhimento que aqui se vive. Pessoas e movimentos católicos? Também católicos. E agora, segundo me consta, até há movimentos esotéricos. Aproveitando este clima que ainda não levanta suspeitas à polícia, procuram infiltrar-se aqui. Não sei com que fins ou intenções. O bispo tem de analisar a ortodoxia de cada um desses movimentos? O bispo de Fátima tem de discernir muito bem. Às vezes não se trata da questão da ortodoxia. Trata-se de desvios, de levar para extremos determinadas devoções, de explorar os sentimentos das pessoas. De explorar a generosidade económica dos fiéis. Nestas coisas eu gosto que haja muita lealdade, muita verdade, muita transparência. Há o risco de exploração económica dessas pessoas? Há esse risco. Haverá sempre. Só o risco?… Só risco, quer dizer… com uma ou outra tentativa isolada. O bispo de Leiria-Fátima foi pressionado para impedir que outras religiões e confissões rezassem no Santuário? O que aconteceu aqui foi um episódio esporádico, isolado, que depois foi empolado. Tratou-se de um grupo budista que terá feito aqui uma oração pública. Naturalmente que o Santuário é católico. Não vamos dizer que o Santuário é o santuário de todas as religiões. Mas isso não impede que esteja aberto ao diálogo ecuménico e inter-religioso. No dia 13 de Maio (hoje) estará aqui uma delegação de cristãos anglicanos, de Inglaterra. Vão estar num grupo à parte, mas são acolhidos. Há movimentos católicos contra esse acolhimento? A Igreja é plural. Não temos de nos espantar com algumas reacções de grupos mais tradicionais ou tradicionalistas. O dinheiro que o Santuário recebe destina-se também a apoiar as dioceses? Apoia muitíssimo. Quer as várias instituições de solidariedade social, quer a construção de igrejas, incluindo nos países de expressão portuguesa. E mesmo a nível mundial. O Santuário é um mecenas? Partilha. Partilha do que recebe… O que recebe permitiu pagar sem recurso ao crédito a construção da nova basílica, orçada em cerca de 60 milhões de euros… Sim. Se os fiéis deixam aqui o dinheiro é para depois ser usado naquilo que é necessário. Esta nova basílica é uma obra de arte. Queremos que essa arte seja digna, seja de qualidade, e os artistas pagam-se bem, como sabe. Mas isto não representa grande coisa se compararmos com o Centro Cultural de Belém ou com a Casa da Música. Houve derrapagens no orçamento? À volta dos 15 por cento. Está dentro do razoável. Não é uma derrapagem escandalosa. Em Outubro haverá inauguração? As promessas dos construtores vão todas nesse sentido. Os arranjos exteriores ficarão para uma fase posterior. Mas a basílica ficará aberta ao público. Nessa altura teremos cá Bento XVI? Temos a certeza de que o Santo Padre não vem. Só um milagre de Nossa Senhora é que poderia conseguir isso. Aguardemos. Transcrição da Entrevista na edição on line do DN de 13 de Maio de 2007)

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