Moderados, precisam-se!

Hugo Gonçalves, Diocese de Beja

slogan não trata de uma oferta de emprego, mas de uma necessidade premente no nosso mundo, o qual se encontra tão polarizado a nível político, social, cultural e mesmo religioso.

Infelizmente, os efeitos desta polarização fazem-se sentir também na Igreja Católica, a qual não ficou imune a esta tensão, tornando-se lamentavelmente refém das aguçadas guerras verbais (e por vezes ideológicas) entre progressistas e tradicionalistas, e onde a nobreza e o elevado nível deram lugar a todo o tipo de linguagem e considerações feitas a todos os níveis, nomeadamente nas redes sociais.

A tendência que existe é tentar ignorar as fracturas que nascem desta ‘guerra’ fratricida, mas será pertinente reconhecê-las, abordá-las e encontrar pontos de equilíbrio que permitam ajudar a superar as limitações de ambos os lados na medida em que forem ajudados a sair das suas trincheiras ideológicas e das suas teorias subjectivas e redutoras.

Como é sabido, estes conflitos não são recentes e nem começaram com o pontificado do Papa Francisco (como convém a ambas as partes fazer crer), mas são uma realidade presente desde sempre na vida da Igreja. Nesse aspecto, importa recordar o momento em que os Apóstolos João e Tiago pediram a Jesus que se sentassem um à direita e outro à esquerda do Mestre, levando a que os restantes dez se indignassem, certamente por estes se terem adiantado àquilo que todos queriam: um lugar de destaque e poder. Também o Apóstolo São Paulo, na primeira carta aos Coríntios, fala nas «rivalidades e contendas» nesta comunidade, que levaram a que uns se afirmassem como sendo de Paulo e outros de Apolo (cf. 1Cor 3, 3-9); o Apóstolo admoesta estes grupos afirmando que tais posições só revelam uma visão humana e material da Igreja e, como tal, longe de uma visão sobrenatural da mesma.

Actualmente, com os meios de comunicação e as redes sociais, estas divisões são mais visíveis e audíveis na medida em que cada grupo procura arregimentar para si o maior número de milicianos e vitórias no “campo de batalha” a que se chama Igreja. Por um lado, para os chamados ‘conservadores’, tudo o que o Papa Francisco faz ou diz corresponde a erro e, em certos extremos do tradicionalismo, chega-se mesmo a afirmar que ele não é o verdadeiro Papa. Para este grupo, a celebração da Santa Missa tem de ser segundo o Rito Extraordinário, porque essa é que é a verdadeira Missa, enquanto o ‘Novus Ordo’ nascido da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II não é válido; a Missa no Rito Extraordinário é por eles considerada como ‘a Missa de Sempre’, ignorando os diferentes ritos litúrgicos do Ocidente e do Oriente, bem como as diferentes fases de desenvolvimento do próprio Rito Romano. Na perspetiva destes nossos irmãos o único catecismo que se devia de usar para a formação dos católicos era o de S. Pio X e o cumprimento da lei e da doutrina far-se-ia de forma farisaica. O imobilismo seria, certamente para os mais tradicionalistas, o único caminho para a Igreja, contradizendo o dinamismo que a própria tem tido ao nível de todos os séculos (a prova disso é o dinamismo do Concílio de Trento).

Por outro lado, a visão que os chamados ‘progressistas ou liberais’ têm para a Igreja é a de uma instituição meramente social e associativa, predominantemente humana e residualmente divina. Com o pretexto de ouvir o mundo e discernir os sinais dos tempos, pretendem conformar a Igreja com o que o mundo pretende dela, forçando opções nascidas no mundo do mediatismo e da ideologia e não a partir do Evangelho. Neste sentido, a moral e a doutrina católica tornaram-se para eles um impedimento para a Igreja que desejam fundar; a hermenêutica bíblica é violenta e por isso procura-se uma nova linguagem que seja menos agressiva; as novas terminologias da ideologia de género são importadas para o âmbito eclesial e litúrgico; e as frágeis democracias tornaram-se modelo de uma Igreja mais democrática, onde o exercício da pastoralidade do Bispo ou do pároco fica subordinado ao autoritarismo das maiorias. É este modelo eclesial que os mesmo procuram identificar com a Igreja que procuram fundar, onde os clérigos se tornam funcionários do sagrado, onde as paróquias se tornaram uma ONG e onde os leigos são sujeitados ao activismo voluntarista sem que lhe seja saciada a sua sede de Deus.

Num tempo em que sentimos e vemos uma tão profunda convulsão e divisão na Igreja, é urgente que os moderados se ergam e se tornem instrumentos de paz e de bom senso. Na Igreja há espaço para todos, mas não para tudo; ouvir e discernir o que o Espírito Santo diz hoje à Igreja não se faz à margem ou contra a Sagrada Escritura, a Tradição e o Magistério da Igreja; nela deve de haver lugar para aqueles que querem uma Eucaristia ‘mais animada’ liturgicamente, mas também para aqueles que encontram no Rito Extraordinário a fonte para alimentar a fé e crescer na santidade; nela há espaço para a criança e para o idoso, para o que se casou recentemente e para aquele que se separou do seu cônjuge; nela há lugar para o que é heterossexual e também para o homossexual; em suma, a Igreja é a casa onde os pecadores – que somos todos nós – se encontram com Deus e com os irmãos e, em comunhão, procuram fazer um caminho de santidade, onde cada um aferirá a sua vida à luz da Verdade que é Deus, podando o que está mal, com o sofrimento que por vezes isso implica, mas desejando ser santos na Santidade de Deus.

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Agência ECCLESIA

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