“Foi uma mulher extraordinária dentro do Convento. Mas foi grande principalmente pela maneira como, em 1910, recebeu todos aqueles sofrimentos da expulsão, dispersão das Irmãs, prisão no Palácio de São Lourenço, fazendo depois da casa dos seus pais um santuário onde ela para vir à missa, à igreja de Santo António (a dois quilómetros de distância), demorava 4 a 5 horas por dia, para além da profunda influência sobre as muitas pessoas que lhe pediam orações e graças”. Este retrato íntimo e breve de Madre Virgínia feito por D. Teodoro de Faria ao JM, mostra o carácter forte da última abadessa do Convento das Mercês, no Funchal, sujeita à abominação do regime republicano implantado no nosso país em 1910. Por esta razão, entende o Bispo Emérito do Funchal, Madre Virgínia deve ser considerada “a mulher para os tempos difíceis”. Esta característica “nem sempre é própria das santas que são de uma Congregação contemplativa”, de clausura, como são as Irmãs clarissas. No entanto, “esta mulher” foi única neste aspecto. “Ela viveu num mundo difícil, cheio de complicações, de falta de liberdade religiosa, de perseguição à Igreja; e ela comportou-se de forma exemplar, a ponto de ser referência neste tempo para os cristãos. Acho que aqui temos algo que é completamente novo”, reconheceu ainda D. Teodoro. Liga de Oração a favor da beatificação Em relação ao Processo diocesano em curso para a beatificação e canonização de Madre Virgínia, o Bispo Emérito do Funchal sugeriu a criação de uma “Liga de Oração”, a exemplo do que aconteceu com o Beato Carlos de Áustria. “O Processo está muito bem escrito, mas julgo que aqui era necessário fundar uma Liga de Oração, para se atingir a profundidade necessária. O Imperador Carlos teve a rezar por ele uma Liga de Oração em todo o mundo”, lembra. O objectivo seria dar a conhecer mais rapidamente a sua identidade espiritual, o registo e testemunhos de milagres que a Congregação para a Causa dos Santos, em Roma, exige como prova irrefutável. Além disso, D. Teodoro de Faria considera ser necessário “incentivar mais na paróquia” (de Santo António) o conhecimento desta ilustre figura da freguesia porque as “novas gerações”, oriundas em grande parte de uma população vinda de fora, a desconhecem por completo. “São mais as pessoas de outros lados que visitam, por exemplo, o túmulo de Madre Virgínia da Paixão”. Entretanto, na conferência proferida ontem, perante uma assistência muito atenta e interessada, D. Teodoro Faria salientou “o dia da morte (de Madre Virgínia, a 17 de Janeiro de 1929) e o seu funeral que constituiu uma grande manifestação em Santo António como talvez não houve outro semelhante”. E referiu-se à missão que ela teve na Igreja, “principalmente a devoção ao Imaculado Coração de Maria e ao dogma da Assunção de Nossa Senhora ao Céu.” A conferência do Bispo Emérito do Funchal foi antecedida de breves palavras do presidente da Junta de Freguesia de Santo António, Marcelino Andrade, e contou com o Arcebispo de Évora, D. Maurílio de Gouveia, entre religiosos (as) de várias Congregações, sacerdotes, convidados e público em geral. “Madre Virgínia é figura cimeira” D. Maurílio de Gouveia foi uma das personalidades presentes na conferência de ontem sobre os 80 anos de Madre Virgínia Brites da Paixão. Para o Arcebispo Emérito de Évora, esta religiosa da Ordem de Santa Clara “é uma das figuras cimeiras da história da nossa diocese e da Madeira. Ela atingiu um tal nível de santidade que não é fácil de atingir. Justifica-se por isso o relevo que se está a dar a este aniversário”, disse em breves declarações ao Jornal da Madeira, “Estou feliz por participar, pois, desde a minha infância habituei -me a ouvir falar da sua santidade. Depois, como estudante e Bispo, sempre procurei estudar os seus escritos, a sua vida mística”. Entre as características destacadas por D. Maurílio, nota-se “uma inteligência especial, um grande espírito de fé da parte de Madre Virgínia que passou por uma experiência extraordinária em 1910”, facto que a obrigou a regressar à casa dos pais, onde nasceu, no Lombo dos Aguiares No meio das circunstâncias mais adversas, e apesar da sua elevada estatura como religiosa (era então Superiora do Convento das Mercês) “ela viveu como simples cristã e cidadã no Lombo dos Aguiares. Mas, ao mesmo tempo, viveu uma vida espiritual muito intensa, com fenómenos místicos que espero que a Igreja um dia, quando se concluir o processo de beatificação e canonização, possa revelar ao mundo a riqueza desta alma”, sublinhou D. Maurílio de Gouveia ao JM. A população madeirense em geral sempre nutriu “um carinho muito grande por Madre Virgínia que não se apaga com o passar dos anos”, disse também ao Jornal da Madeira a Irmã Maria da Cruz, Superiora da comunidade das Clarissas no Mosteiro de Nossa Senhora da Piedade, na Caldeira (Câmara de Lobos), sede do Secretariado da Madre Virgínia. “Este aniversário é sobretudo uma grande celebração e um dia de acção de graças para todos nós”, disse. Após a conferência, realizou-se uma concelebração eucarística na igreja de Santo António, presidida pelo Arcebispo Emérito de Évora e animada liturgicamente pelo Coro de Câmara da Madeira. Freguesia projecta busto e nome de rua Uma homenagem a Madre Virgínia Brites da Paixão por parte da Junta de Freguesia de Santo António deverá concretizar-se em forma de um “busto” e do “nome dado a uma rua”, para assinalar a canonização da “santa freirinha”. “A Freguesia sempre acolheu com profundo respeito e admiração Madre Virgínia e o processo em curso para a sua canonização é um orgulho para todos nós”, disse o presidente daquela autarquia local ao Jornal da Madeira. Para o dr. Marcelino Andrade que desde criança sempre se sentiu familiarizado com Madre Virgínia – “a minha saudosa mãe era muito devota desta religiosa e uma das coisas que me pediu foi que nunca deixasse de apoiar as Irmãs Clarissas”, a freguesia de Santo António “tem muita honra em exibir a naturalidade de Madre Virgínia e sente-se privilegiada por todos os acontecimentos que se promovem em sua memória, como esta celebração à volta do 80.ºcentenário da sua morte”, sublinhou. “São ocasiões importantes em reconhecimento de alguém que enobrece e leva cada vez mais longe o nome da nossa Freguesia”. Neste contexto, “projecta-se a inauguração de um busto e de uma rua com o nome de Madre Virgínia, o que deverá acontecer em data mais próxima da sua canonização”, garantiu ao JM o presidente Marcelino Andrade, a propósito do aniversário celebrado ontem na Junta de Freguesia de Santo António. Madre Virgínia em vasta bibliografia Para além destes projectos em forma de homenagem a Madre Virgínia, na sua freguesia de origem, é oportuno recordar que a sua identidade tem sido objecto de estudo aprofundado desde há anos, a começar pelos seus contemporâneos, como o Pe. Prudêncio da Costa que escreveu um Apontamento Biográfico de Madre Virgínia Brites da Paixão (1860-1929); até aos livros da Irmã Otília Fontoura: Uma vida de Amor (Irmãs Clarissas, Sintra, 2002); e Uma Mensagem para a Igreja. Síntese Biográfica de Madre Virgínia Brites da Paixão (Secretariado de Canonização, 2004). “Oxalá que a sua canonização seja em breve” O octogésimo aniversário da morte de Madre Virgínia Brites da Paixão foi também lembrado por D. António Carrilho que, em declarações ao Jornal da Madeira, considera importante a sua celebração pela oportunidade que dá “às gerações mais novas de conhecerem e apreciarem uma religiosa venerável e para a qual a diocese muito se tem empenhado na sua beatificação e canonização”. O Bispo do Funchal espera que o exemplo da sua “vida simples, humilde, mas grandiosa aos olhos de Deus” seja “reconhecido e vivenciado por todos os fiéis, com o mesmo brilho da fé e da esperança que iluminou a vida da Madre Virgínia”. Por outro lado, “recordar nesta data a ‘santa freirinha’ é intensificar as nossas orações pela sua canonização. Oxalá que seja em breve”, afirmou. D. António Carrilho está no México a participar no VI Encontro Mundial das Famílias que hoje encerra com uma Missa no Santuário de Guadalupe presidida pelo Cardeal Tarcísio Bertone, em representação do Papa Bento XVI. A cerimónia pode ser acompanhada através da Internet ou da televisão. Durante quase uma semana, milhares de fiéis de todo o mundo, entidades religiosas e civis, especialistas em várias áreas, reflectiram sobre os problemas da família na actualidade.