LUSOFONIAS – Senhora do Socorro à chuva…

Tony Neves, na Calheta de S. Miguel, Cabo Verde

Rezar pela chuva é petição constante em todas as celebrações em que participo aqui em Cabo Verde. A razão é óbvia, porque as nuvens esquecem-se destas Ilhas na hora de chover e as secas são uma constante na vida das populações que, apesar de todas estas contrariedades climáticas, insistem em sobreviver entre ribeiras, achadas, cutelos e outras marcas da geografia acidentada destas terras vulcânicas.

Encontrei um país de cor castanha e vou deixa-lo completamente verde. Tudo porque bastam uns pingos de chuva para mudar a cor desta terra e dar alegria a este bom povo. Estava ainda no Capítulo Espiritano na Praia, quando o povo vibrou com a queda dos primeiros pingos. Estava um calor de matar e todos diziam que era desta que a chuva vinha. Veio, é verdade, a 5 de Agosto, mas de forma ainda muito tímida. Foi, contudo, o suficiente para que o verde fosse colorindo as montanhas e os vales. E mais: quando, no dia seguinte, fiz a viagem da Praia para a Calheta, percorri 50 kms cheios de gentes a semear milho e feijão pelas escarpas rochosas da Ilha, mostrando fé, resiliência e vontade de trabalhar. Tudo germinaria, mas era precisa mais água com urgência, sob pena de tudo se perder.

E, a 15 de Agosto, numa das grandes festas da Calheta de S. Miguel, a de Nossa Senhora do Socorro, com milhares de pessoas protegidas por uma rede de sombra, eis que a chuva começou a cair, quase só parando no fim da missa. O povo agradeceu à Mãe, aplaudiu e continuou à chuva como se nada fosse, tal a alegria de ver os campos irrigados e o milho a crescer. A origem vulcânica das terras garante uma fertilidade que não se consegue imaginar. As sementes rebentam dois ou três dias depois e, em pouco dias, já temos o milho e o feijão a precisar de sacha urgente. Agora, ao percorrer diversas estradas da Ilha de Santiago, podemos ver a paisagem pintada de verde e centenas de pessoas a trabalhar os campos. Em certas encostas íngremes e pedregosas, custa a crer como é possível cultivar e dali tirar frutos…Mas o pedido de mais chuva continua, pois não está garantido que as plantas resistam com a ainda pouca humidade dos solos e, sobretudo, com o calor insuportável que nos banha de suor e quase impede de respirar…

Basta passar um mês com este povo para perceber a sua fé, a sua coragem e a sua capacidade de remar contra ventos e marés. Bastam uns pingos de chuva para as pessoas acreditarem que o ano agrícola vai ser excelente…

Esta terra e esta Igreja percorreram já um longo caminho. 2033 marcará os 500 anos da criação da Diocese de Santiago. É das Igrejas mais antigas implantadas fora da Europa. Celebrar meio milénio de Missão da Igreja católica pede uma longa preparação, acompanhada de muita reflexão e oração. Por isso, a Diocese de Santiago está já a preparar-se para tão grande evento. O lema das comemorações jubilares está escolhido: ‘Ide e ensinai…Eu estarei sempre convosco’ (cf. Mt 28, 19-20) e o tema é ‘Diocese de Santiago de Cabo Verde – 500 anos de uma Igreja consciente e missionária’. Há já uma Comissão a trabalhar, tendo apostado na investigação histórica. A Evangelização começou pela Ribeira Grande, sendo a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, na Cidade Velha, a mais antiga, construída a partir de 1495. Depois de vários séculos de missionação, a Igreja de Cabo Verde contou com a presença dos Missionários do Espírito Santo desde 1941, com a nomeação do P. Faustino Moreira dos Santos para Bispo. Os Espiritanos estão a celebrar 80 anos de presença missionária em Cabo Verde.

Os investigadores que se dedicaram à história destes quase 500 anos de presença da Igreja católica em Cabo Verde consideram decisivo o contributo que esta instituição deu e continua a dar para o bem estar das populações, marcando a identidade do povo.

Agora, venha mais chuva e acabe de vez esta pandemia que está a asfixiar a economia e a impedir que a pobreza se combata e as famílias se reúnam e façam festa. Se desse para resumir as orações do povo, eu diria: ‘pela chuva e contra a pandemia!’.

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