Tony Neves, em Rennes, na Bretanha
A França está a ferro e fogo. O que fez explodir a reação popular foi a aprovação de uma lei que aumenta a idade da reforma. Embora muita gente reconheça que a atual situação exija mudanças na lei, boa parte do povo, liderado pelos sindicatos, queria outras respostas que não o aumento puro e duro da idade em que os trabalhadores vão poder deixar os seus trabalhos e receber as suas reformas. A violência tem aumentado de dia para dia, com manifestações em todas as cidades, havendo sempre lugar para excessos, seja da polícia seja de manifestantes, com gente ferida, carros e casas incendiadas, vitrinas partidas e muito lixo por todo o lado. A calma está longe de garantida e as sucessivas greves param muitos aviões e comboios e bloqueiam estradas e acessos a fábricas, como tem acontecido com refinarias, estando boa parte das bombas de gasolina já fechadas por falta de combustível. Trata-se de uma novela complicada, com ambas as partes a gritar as suas boas razões, mas com o povo simples a ser sempre a maior vítima.
Mesmo neste ambiente de luta social, consegui chegar de Roma a Paris (mudando de voo, pois o primeiro foi cancelado!) e, dali, fui até Lille, seguindo de lá para Rennes. Optei por viagens cedo, apanhando os manifestantes e a polícia a dormir e descansar dos distúrbios das vésperas.
Foi em Rennes, na Bretanha, no longínquo ano de 1679 que nasceu um jovem com um futuro muito promissor: Cláudio Poullart des Places. Filho de gente rica, o objetivo dos pais era manda-lo estudar em Paris para regressar, em grande, ao Parlamento de Rennes. Enquanto adolescente e jovem, Cláudio passava muitas horas nas Igrejas, muitas vezes acompanhado por um amigo que, tal como ele, viria a fundar uma Congregação: Luis Grignon de Monfort, também ele nascido em Rennes, deu origem aos Monfortinos. Mas, como conta a história, há intervenções de Deus que nos desinstalam e viram os projetos do avesso. Assim aconteceria com Cláudio que, uma vez em Paris, usava a mesada dos pais para acolher e apoiar jovens pobres que queriam ser padres e não tinham condições para estudar. Numa manhã de Pentecostes, em 1703, bem antes de ser ordenado Padre, Poullart des Places deu início aos Espiritanos.
Por esta razão, há 50 anos – desde que entrei no Seminário – que tinha esta vontade enorme de peregrinar nos passos do Fundador e vir a Rennes. Aconteceu estes dias.
Rennes é uma cidade muito antiga e cheia de monumentos, sobretudo belas e imponentes Igrejas. Aproveitei todas as pausas dos encontros de trabalho – a visita canónica do Conselho Geral às duas comunidades Espiritanas – para percorrer esta bela cidade, no intervalo dos constantes aguaceiros frios que assolaram a cidade estes dias. Rezei nas Igrejas por onde o fundador passou, lá onde foi batizado, onde rezou. Passei junto à casa onde nasceu e cresceu. Estive no parlamento onde fez uma conferência brilhante que lhe poderia ter aberto as portas uns anos depois.
Rennes acolhe duas comunidades Espiritanas. A Comunidade Poullart des Places teve início de 2011 e marcou o regresso dos Espiritanos a esta cidade para aprofundar a espiritualidade e o carisma missionário do fundador da Congregação do Espírito Santo, aqui onde ele nasceu. É uma Comunidade que vive no coração da cidade e acolhe gente do mundo inteiro, sobretudo membros da família espiritana, para sessões de formação sobre os fundadores desta grande Congregação Missionária. A outra comunidade está num bairro de periferia e tem a responsabilidade da Paróquia Ozanam, desde 2009. Aqui vivem três Espiritanos (originários da Nigéria, Camarões e França), coordenando a pastoral de duas grandes comunidades com Igreja enorme (São Lourenço e S. João Maria Vianney) e apoiando a capelania dos estudantes, trabalho tanto mais importante quanto mais aumentam as ofertas académicas em Rennes. Para minha alegria, uma das ruas laterais da Igreja de S. João tem o nome de Cláudio Poullart des Places, por decisão camarária de há 60 anos, muitos anos antes dos Espiritanos assumirem a responsabilidade da Paróquia.
Voltarei a Rennes, mas passarei também por Lille, Langonnet e Nantes para falar da bela missão que ali aconteceu ao longo de largas décadas e ainda hoje vivem e trabalham numerosos missionários. Lá iremos.