Lusofonias: A arte de envelhecer

Tony Neves

Visitar África ajuda a compreender o papel decisivo que os mais velhos têm na sociedade e na Igreja. A memória é fundamental para que passem, de geração em geração, os valores que cimentam e expressam o que de melhor têm as culturas.

As nossas sociedades ocidentais, assentes no lucro e no sucesso, têm dificuldade em capitalizar a riqueza da experiência acumulada dos anciãos. E mais grave ainda: não encontram lugar digno para eles enriquecerem a sociedade nos últimos anos das suas vidas. É triste e dramático verificar que as pessoas idosas, nos contextos mais capitalistas liberais, são um peso enorme e um custo insuportável para as finanças familiares e sociais, quando deveriam ser um tesouro a preservar, defender e agradecer.

É muito bom olhar para exemplos de sucesso neste crescer com a sabedoria dos mais velhos. Tenho, na minha Congregação Missionária, muitos padres e irmãos que, para além dos oitenta, continuam a ser pedras preciosas para a Missão. Vou dar alguns exemplos, escolhendo apenas dois Padres e um Irmão Espiritanos portugueses. O P. José Maria de Sousa tem 98 anos e vive no Seminário Espiritano do Porto. Uma presença sempre feliz e bem disposta, desde as tenras horas da manhã, quando todos ainda estão mais a dormir que acordados! E, nestes quase cem anos de vida, tem um curriculum de Missão invejável, desde de professor nos Seminários, à coragem missionária na época da fome em Cabo Verde, ao acompanhamento pastoral dos imigrantes caboverdianos nos EUA, terminando com a sua persistente Missão em tempo de guerra em Angola. O Irmão Acácio Morais, nos seus mais de oitenta anos de vida, continua de pedra e cal em Angola. Ali viveu mais de 50 anos, a maioria deles num contexto de cruel guerra civil, com todas as implicações que tal situação traz à Missão. É o responsável pela economia da Procuradoria Espiritana em Luanda, local por onde todos os missionários têm de passar, o que torna a logística muito complicada. E dá gosto passar na Comunidade e ver a alegria e a disponibilidade constantes deste santo Irmão Acácio. Do outro lado do atlântico, no Brasil, está o Padre Laurindo Marques, com noventa e bastantes anos, a viver e trabalhar nas periferias pobres e violentas do Rio de Janeiro. Iniciou Missão em Angola e, após a independência desta ex-colónia, rumou ao Brasil. A saúde é débil, mas a vontade de anunciar o Evangelho aos pobres continua a dar-lhe vida e motivação para a partilhar.

É preciso saber envelhecer com qualidade e alegria, mas também é preciso que a sociedade e as famílias dêem vez e voz a quem tem muito que partilhar. O que de mais valioso nós temos, como humanos, é a nossa vida. Então, ousemos mudar tudo o que é urgente mudar para que as verdadeiras riquezas sejam postas ao serviço de todos.

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Agência ECCLESIA

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