Sandra Cortes Moreira, Diocese do Algarve
No presente, ser-se literato implica, SABER sobre muitas coisas.
A UNESCO, por exemplo, na sua proposta sobre os conhecimentos necessários no presente, refere-se a uma ecologia de saberes, destacando a relação quase simbiótica que existe entre tudo o que integra o conhecimento. Mais, refere-se à relação desta necessidade de saber e do conhecimento como estando intimamente ligados à Literacia Mediática e Informativa (MIL). Autores como Divina Frau Meigs ou Alton Grizzle, que trabalharam na elaboração das competências MIL refletem, precisamente, sobre estas questões. Outros autores, entre muitos, como Sonia Livingstone, José Manuel Perez Tornero, David Buckingham, também o salienta,
Ser literato é, pois, ser capaz de compreender, usar e analisar os media. E esta relação com eles faz-se presente em todas as áreas de atividade humana, pois, como diz Aguaded: «A literacia mediática pode ser entendida como ter acesso aos media, conhecer as suas várias facetas, ter uma perspetiva crítica dos seus conteúdos e criar comunicação em múltiplos contextos». Logo, o saber, o conhecimento é a base material do funcionamento da sociedade hodierna.
Tanto, que já falamos de uma literacia transmediática, que Carlos Scolari aponta ir muito além dos aspetos cognitivos (saber) e pragmáticos (fazer), pois implica emoção, consciência cívica, ou seja, promovem uma abordagem holística e de desenvolvimento integral do ser humano.
À partida, podemos dizer que quem mais conhecer, terá melhores possibilidades de viver mais sustentavelmente….
Neste contexto de multi literacias e face à observação do que acontece no mundo do Turismo, parece ser sensato que uma Literacia Turística, associada a um processo em que os participantes necessariamente se preparam, experimentam e contam todo o processo que envolve as viagens faz sentido, bem como falar de competências próprias (CTL).
Esta Literacia Turística será um processo educativo, que implica a capacidade de interpretar diferentes sinais, relacionando-os com o conhecimento sobre um lugar (costumes, história, idioma, arte, etc.); implica, ainda, que mediadores as apliquem na sua relação, na construção de experiências e produtos comunicativos, fazendo uso da multimodalidade e multiculturalidade associados à convergência (relacionadas com distintas áreas: cultura, linguagem, meios, etc.).
Tudo isto, para que o Turismo seja o mais produtivo e respeitoso para com visitantes e visitados, se valorize a dimensão da relação/diálogo, ligada ao Ethos da literacia mediática (participação, cidadania, criatividade, sustentabilidade). Salientamos esta dimensão, pois ela marca a maior ou menor qualidade da aprendizagem, maior ou menor nível de Literacia Turística, o que, acreditamos, levará a menos turismofobia e outros fenómenos extremos (como acontece aqui ao lado, em Espanha, já não apenas em cidades como Barcelona, mas com o Governo a ponderar medidas de restrição à entrada de turistas em diversas zonas do país).
Gostaria de salientar a importância da mediação e dos mediadores neste processo de aprendizagem permanente, ou seja, todos os que trabalham nesta indústria (anfitriões, Organizações de Gestão de Destinos, meios de comunicação e, claro, turistas). Enquanto agentes neste processo, quanto mais competências nesta área possuírem, melhores desempenhos terão e maior contributo darão para a sustentabilidade.
Não esquecer que um mediador é um educador não formal, que deve desenvolver, em si e nos outros, competências nesta área, reconhecendo os media como um ambiente mais útil para esse seu trabalho educativo, tendo consciência deste seu papel e da responsabilidade que tal acarreta, nomeadamente no que toca a pôr em prática os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que têm plena ligação com a atividade turística, mas, também, com a questão da Literacia Turística. Sobretudo, porque são normalmente eles e as suas produções comunicativas que estabelecem uma relação com o ambiente, a cultura, o lugar de visita. Não esqueçamos que a imagem que é colocada numa rede social pode ter uma carga muito forte de Literacia Turística, ou revelar a total ausência dela. O mediador, independentemente de quem seja, é chave para o desenvolvimento das CTL e dos ODS.
Por isso, se pensarmos que o sujeito possuidor de Competências de Literacia Turística terá:
- Uma melhor compreensão do valor patrimonial, mas, sobretudo, da cultura e da identidade;
- Um olhar ético, resultante da sua habilidade para acolher a diferença e a respeitar;
- Capacidade de valorizar a pessoa e a comunidade, facto que é promotor de melhores condições de vida, de uma economia mais forte e de um meio ambiente mais saudável;
- Uma sensibilidade para os valores espirituais, que pode não praticar na totalidade, mas reconhece como importantes para a humanidade;
Então, será possível dizer que quem tem Literacia Turística não olhará para a religião e para o Turismo Religioso/Espititual como algo estranho, mas como fator de valorização do OUTRO.
E., além de estarem aqui fortemente presentes os ODS, estamos perante o conceito proposto pelo Papa Francisco, de ECOLOGIA INTEGRAL (na Carta Encíclica Laudato Si), uma ecologia que assenta precisamente no conhecimento – reforço, conhecimento! – do mundo, do outro, da cultura, das religiões, da economia, do ambiente.
Na verdade, a Literacia Turística pode e deve ser uma ferramenta de reflexão e melhoria dessa compreensão, que aponte caminhos de melhoria para esta indústria, assente no pressuposto de que precisamos e uma EDUCAÇÃO E ESPIRITUALIDADE ECOLÓGICAS e que mais e melhor Literacia Turística (ligada a uma melhor Literacia Mediática) garantirão melhores mensagens, melhores experiências e mais ética em todas as abordagens e dimensões desta indústria.
No fundo, a Literacia Turística pode ser o sustentáculo para uma CONVERSÃO ECOLÓGICA, uma proposta que ponha em equilíbrio, como diz Francisco, «o interior consigo mesmo, o solidário com os outros, o natural com todos os seres vivos, o espiritual com Deus».