A impossibilidade de partir em missão levou a enfermeira a inscrever-se no SNS 24
Porto, 28 abr 2021 (Ecclesia) – A missionária e enfermeira Isabel Sousa disse à Agência ECCLESIA que decidiu prestar serviço na Linha Saúde 24 quando não pôde partir em missão devido à pandemia e afirma que a sua “ação não termina ao desligar o telefone”.
“A minha ação não termina ao desligar o telefone porque são muitas horas em que ouço as pessoas, seja a pedir ajuda, informações, a esclarecer dúvidas ou mesmo a encaminhar para as urgências, e, na minha comunidade, ao fim do dia, vou partilhando as histórias e vamos rezando, claro”, disse Isabel Sousa à Agência ECCLESIA.
Enfermeira há cerca de 20 anos, Isabel Sousa já passou por Moçambique, onde fez o seu estágio e, estando em Portugal devido à pandemia Covid-19, decidiu inscrever-se na Linha Saúde 24.
“Estava a dar apoio como enfermeira num lar de idosos e, em março de 2020, no meio das incertezas, decidi inscrever-me, uma vez que precisavam de enfermeiros para esse serviço; só fui chamada depois em novembro, fiz uma formação e comecei a fazer oito horas semanais”, recorda a consagrada.
Já em janeiro de 2021 a responsável pelo instituto das Missionárias da Boa Nova optou só pelo trabalho no call center da linha Saúde 24, no Porto, passou a fazer 30 horas, “numa altura em que chegavam muitos mais pedidos, cerca de 90% eram casos Covid”.
“Foi uma novidade enorme para mim: cada chamada é uma surpresa, não sabemos quem está do outro lado e as necessidades que tem; também as dúvidas que me surgiam e os limites que este tipo de resposta tem”, refere.
A missionária descreve a “angústia” de atender chamadas a idosos solitários, “que não se conseguem deslocar a um hospital sozinhos e a quem falta a retaguarda” ou então a “adolescentes e jovens com dúvidas sobre doenças venéreas ou a pedir informações para abortar”.
“Havia chamadas que, depois de desligar, me sentia impotente, apetecia-me largar tudo e ir à procura daquelas pessoas que precisavam de outros tipos de ajuda”, afirma a missionária.
Isabel Sousa põe limites às suas conversas por causa da “imparcialidade, o não julgamento e a gravação dos telefonemas” uma “dupla responsabilidade”, no entanto destaca que “no pouco que se fala há sempre uma interação”, seja para agradecerem o serviço dos profissionais mas também para reagir pelo que é dito.
“Por um lado sou uma profissional ao serviço dos outros, mas sinto-me instrumento em tempo de pandemia. Considero positivo ir ao encontro dos outros por esta via e quero acreditar que possa ser uma diferença”, revela.
O ambiente de call center é de “uma tristeza enorme” para Isabel Sousa que “não conhece os colegas” que ali trabalham, permitem-se “apenas a trocas de olhares” e, eventualmente, algum comentário, “conhecendo um ou outro com quem já fez troca de turnos”.
“Esta é a minha primeira experiência de trabalho sem convivência entre colegas, não há hora de café, nem horas de almoço, não se entra nem sai à mesma hora, quem chega é para fazer as suas horas, não nos conhecemos, nem sei o nome”, lamenta.
Uma “parte dolorosa” desta forma de chegar e ajudar os utentes a que Isabel Sousa se alistou e lhe deu a oportunidade de “um trabalho em anonimato pleno”.
“Era uma área que me assustava, porque não domino todos os assuntos, e foi mesmo face a esta situação que decidi; tenho aprendido muito! Por exemplo aprendi a importância da voz e quanto pode ser diferente, acarinhar, informar, aproximar ou não, depois a escuta e os tempos, onde em emergência nem há tempo para pensar”, partilha.
Ao longo das horas a atender telefonemas na Linha Saúde 24, a missionária e enfermeira Isabel Sousa tem por hábito abrir o “evangelho do dia” que, “de propósito”, fica aberto “para olhar durante aquelas horas” e dar “ânimo para as chamadas futuras”.
SN