D. José Ornelas lamenta desvalorização das conquistas democráticas e teme populismo alimentado por falhas na Justiça
Lisboa, 25 abr 2021 (Ecclesia) – O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), D. José Ornelas, mostrou-se preocupado com o regresso de “nacionalismos exacerbados” e convidou a valorizar as conquistas democráticas.
“Democracias perfeitas não existem. Quem ainda viveu no tempo da antiga senhora sabe o que isso significa e o que me dói é ver, mesmo gente jovem, com saudades de um tempo em que não viveu”, alerta o bispo de Setúbal, convidado desta semana da entrevista conjunta Ecclesia/Renascença.
Questionado sobre o percurso percorrido desde o 25 de abril de 1974, o responsável realça o aumento da abstenção.
“Eu não entendo que haja pessoas que não votem. Não entendo”, realça, lembrando que o direito a vota é “algo de que tanta gente, milhões e milhões de pessoas nesse mundo, estão à espera”.
D. José Ornelas sublinha a importância de “entender o preço e a preciosidade” da democracia, que implica “aceitar a diversidade”.
O presidente da CEP recorda que, durante a ditadura, existiu um enquadramento “muito ideológico” que valorizar a ideia de luta “pelo império e pela fé”, admitindo que seria de esperar melhor “de gente com mais consciência”.
O responsável evoca figuras “brilhantes” da Igreja Católica, como D. António Ferreira Gomes, bispo do Porto, e D. Manuel Vieira Pinto, bispo de Nampula (Moçambique).
“Graças a Deus, tivemos muitas mentes conscientes”, num movimento de contestação à ditadura que foi “crescendo”, prosseguiu.
A celebração do 25 de abril acontece pelo segundo ano consecutivo num contexto marcado pela pandemia e o presidente da CEP mostra-se preocupado com o aumento das desigualdades sociais e com a lentidão da Justiça, considerando que esta agrava os populismos.
“O pior que pode acontecer a um país é não ter um sistema de Justiça que funcione, porque não há esperança nenhuma”, refere, advertindo para o risco de se querer fazer justiça “na rua”.
O bispo de Setúbal reafirma a sua preocupação com a crise económica no pós-pandemia, que atinge também as instituições católicas, sublinhando que a Covid-19 mostrou que “este mundo a duas velocidades não funciona”.
“Uma sociedade equilibrada e sustentável não pode ter diferenças deste género, e quando pensamos nas grandes fortunas que se fizeram durante a pandemia, com o aumento até dos rendimentos de quem mais ganha, é um contrassenso”, denuncia.
O presidente da CEP elogia o processo de vacinação em curso, e diz que foi o “respeito pela vida” que levou a Igreja Católica a decidir suspender as celebrações comunitárias, sempre em diálogo com as autoridades sanitárias.
“Enfrentamos uma situação perigosa para as pessoas, e, portanto, o respeito pela vida é o fundamental. Para isso, precisamos das autoridades”, acrescenta.
Octávio Carmo (Ecclesia) e Ângela Roque (Renascença)