Jovem de Coimbra, autora do livro de poemas «Pandesia», fala da importância de haver espaço de escuta, «mesmo quando não concordamos» e de quanto o Papa Francisco procura compreender os jovens
Lisboa, 22 nov 2023 (Ecclesia) – Alice Cardoso, jovem de 25 anos da diocese de Coimbra, aprendeu no Secretariado diocesano de Pastoral Juvenil, a rezar com músicas comerciais “não beatas” e a reconhecer uma “linguagem comum” na humanidade que gera encontros.
“As pessoas têm de deixar de achar que as palavras são ofensivas, porque alguém as considerou super ofensivas. Alguém diz uma coisa aparentemente errada, e antes de percebermos porque a pessoa o diz, vamos logo com forquilhas e chamas na mão. Não me interessa quem canta as músicas, mas se elas me disseram alguma coisa é ótimo e tantas vezes tiro um sentido humano ao que ouço. Há mais coisas a unir-nos do que a separar-nos”, constata a jovem à Agência ECCLESIA.
Autora do livro de poesia «Pandesia», que escreveu durante o tempo de pandemia e publicou este ano, a jovem tradutora de inglês e alemão diz que falta “olhar para a poesia”.
“As pessoas sentem falta de coisas que lhes digam algo, mas não percebem isso. Tudo passa num instante neste tempo de redes sociais – é difícil percebermos o que as coisas nos dizem. As pessoas não estão habituadas a pensar. Falta também o espaço para as pessoas dizerem o que sentem mesmo que outros não concordem. Porque parece que tudo espera um rastilho para gerar uma explosão. As pessoas não estão disponíveis para ouvir”, lamenta.
Alice Cardoso descobriu a importância das palavras já na adolescência mas recorda palavras do pediatra ter dito à sua mãe: «Quando esta menina crescer, ponha-lhe uma caneta na mão, que esta menina precisa é de escrever muito».
Os pais deram-lhe uma flauta transversal e a música foi ganhando espaço na sua vida, mas na escola conheceu Antero de Quental e Cesário Verde e entrou no mundo da poesia, quando percebeu que em poucas palavras poderia dizer muito.
“Eu achava, não sei porquê, que ser escritora era vergonhoso. Só no secundário quando estudei poesia, com Cesário Verde e Antero de Quental, pensei que talvez isto fosse para mim”, recorda.
Escrever deixa esta jovem de 25 anos “mais apaziguada e libertada”, surpreende-se com o exercício de espelho que a escrita pode representar: “A poesia pode ser uma forma de expressar o que sinto mas quando és poeta não tens necessariamente de escrever sobre o que sentes”.
“Quando escrevi os poemas do livro nunca foi a pensar que seriam publicados mas porque eu sentia-me bem a escrevê-los. Quando o fiz não tinha noção que escrevia sobre mim”, recorda.
Alice Cardoso foi convidada a participar na elaboração do Relatório da União Europeia do KAICIID, uma organização intergovernamental que promove a paz e a compreensão através do diálogo inter-religioso e intercultural, sobre a inclusão dos jovens nas cidades, e foi também convidada pela Conferência Episcopal Portuguesa a representar os jovens católicos portugueses no Youth Net, da COMECE, Comissão das Conferências Episcopais da União Europeia.
Estas experiências permitiram a Alice Cardoso o encontro com jovens de diferentes proveniências religiosas mas que “se ouviam e concordavam”.
“Todos tínhamos os mesmos problemas, as mesmas dificuldades e partilhávamos a importância de chamar os jovens à participação. Foi essencial os bispos chamarem os jovens para os escutar”, explica.
“O Papa Francisco está a tentar que os jovens sejam compreendidos. E isto era mesmo necessário. A comunidade LGBT é cada vez mais um assunto na Igreja e o Papa aborda assuntos para que se discutam na Igreja. Eu muitas vezes penso que se Jesus aqui estivesse Ele não iria querer que determinadas pessoas fossem descriminadas, por isso é bom o Papa falar sobre isso”, acrescenta.
Nesta conversa com a Ecclesia, emitida esta noite na Antena 1 e disponibilizada no podcast «Alarga a tua tenda», Alice Cardoso fala ainda de saúde mental e do porquê de considerar que ler poesia é melhor do que tomar medicamentos.
LS