Lisboa, 25 nov 2014 (Ecclesia) – A Primeira Guerra Mundial, no início da primeira república portuguesa, originou a criação de um serviço pastoral que hoje são as capelanias militares através do testemunho de “heroicos sacerdotes” que em “condições penosas” fizeram-se “próximo dos militares”.
“No tempo da República existiam cerimónias públicas em que participava de facto um grande número de pessoas mas não havia um corpo institucional e habitual que os acompanhasse. A primeira assistência deve-se a estes [padres] voluntários que, indo de graça, sofrendo perigos enormes e acompanharam o corpo expedicionário português na frente europeia”, explicou o bispo da Diocese das Forças Armadas e Segurança.
À Agência ECCLESIA, D. Manuel Linda frisou que é aos primeiros sacerdotes enviados para a guerra que para além do “exemplo” deve-se a fundação do que “hoje se chama Ordinariato Castrense”.
Entre os capelães na França, o padre José do Patrocínio Dias destacou-se e é recordado ter percebido que a missão no campo de batalha era sempre junto dos que sofrem.
“Levou uma cruz para a frente de batalha que dava a beijar aos nossos soldados, é a arma do sacerdote. Demonstra identidade e proximidade e muitas altas patentes partilhavam mais tarde a sua admiração”, relembrou o padre Luís Miguel Fernandes, da Diocese de Beja.
O padre Diamantino Teixeira, capelão militar em Beja, continua este serviço e recorda uma situação no Afeganistão em Kabul, na província de Kandaar, onde com os soldados teve de refugiar-se num bunker.
“Era o dia 13 de maio, estávamos a pensar no que iria acontecer e decidimos celebrar a missa. Depois um sargento pediu para rezar o terço e rezamos o rosário. Na hora da verdade é que as pessoas se voltam para Deus, para a fé”, recordou.
Hoje compreende “como as dificuldades” na guerra mudam a “personalidade e a maneira de ser e de estar para sempre” e destaca a “imprescindível” presença do capelão que “é muito querida”.
“Posso dizer que depois destes acontecimentos muitos vieram falar comigo e propuseram-se a fazer os sacramentos de iniciação cristã porque confrontaram-se com questões de fé”, desenvolveu o padre Diamantino Teixeira.
O diretor do Museu de Marinha recorda que na Primeira República a lei da Separação entre Estado e religião criou “um vazio de assistência religiosa” mas que a guerra influenciou a mentalidade anticlericalista de republicanos que associam a Igreja à Monarquia e a uma das razões para o atraso económico português.
“A guerra teve uma influência grande nesta mudança de atitude, há muitos republicanos que depois vão reconhecer que a lei da separação foi algo que contribuiu para o declínio da própria República”, recorda o Capitão Costa Canas.
Nesse período, o cardeal patriarca D. António Mendes Belo escreveu ao Presidente da República a destacar que os militares “iam viver situações limites” e que a Igreja “pensa que será fundamental o apoio religioso”, acrescenta.
“[Os sacerdotes] celebram missas muitas vezes antes de situações de combate e a própria hierarquia percebe que em determinadas circunstâncias os soldados vão com muito mais ânimo. Afinal os capelães são contributo válido”, desenvolve o Capitão Costa Canas.
Os sacerdotes portugueses criaram a ‘Casa do Soldado’ que servia de apoio à ocupação dos tempos livres, um serviço semelhante ao apoio protestante ‘Triangulo Vermelho’.
“O que não significa que houvesse aqui um conflito entre diferentes confissões cristãs. Há descrições de celebrações conjuntas”, observou o oficial da marinha.
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