Igreja/Ambiente: Cáritas lança campanha para dar voz aos deslocados climáticos

Organização católica apresenta testemunhos na primeira pessoa, evocando milhões de vítimas da degradação ambiental

Roma, 26 out 2023 (Ecclesia) – A confederação internacional da Cáritas lançou um ano de ação global, com a campanha ‘Juntos’, apresentando hoje em Roma um relatório dedicado aos deslocados climáticos, um problema que afeta milhões de pessoas.

“Estamos no caminho certo para um mundo com mais três graus [celsius], e isso significa vidas impossíveis para os mais pobres e mais vulneráveis, os que menos fizeram para causar esse aumento”, afirmou, em conferência de imprensa, Allistair Dutton, secretário-geral da Cáritas Internationalis (CI).

O responsável destacou a experiência da organização católica na resposta a “desastres” como cheias e secas, ciclones e furacões, ajudando as pessoas a reconstruir as suas vidas, mas sublinhou que o clima está a tornar-se “mais errático, mais extremo”, pelo que estas pessoas “não conseguem recuperar”.

Allistair Dutton apontou o dedo à retórica “preguiçosa” dos “migrantes económicos”, para recusar o reconhecimento do estatuto dos refugiados climáticos.

“Temos uma responsabilidade moral relativamente a isso”, indicou

Foto: Ricardo Perna

Alfonso Apicella, gestor das campanhas globais da CI, evocou as “mulheres e famílias com crianças forçadas a deixar as suas casas, por causa da degradação ambiental, incluindo as alterações climáticas”.

“Como é que a voz destas pessoas pode ser tida em conta nas decisões políticas?”, questionou.

A nova campanha visa dar voz “às pessoas e comunidades afetadas pela degradação ambiental, incluindo as que estão deslocadas, dentro e fora do seu país, por causa das alterações climáticas”.

Angola

O relatório alerta para uma situação de “terras secas e reservas de alimentos esgotadas”, em Angola, onde 100 mil crianças estão em situação de “desnutrição aguda grave, com graves efeitos no seu desenvolvimento físico e mental”.

“As secas prolongadas da última década fragmentaram enormemente a unidade de muitas famílias. Os homens deixaram as mulheres, como chefes de família, e migraram para as cidades, onde tentam ganhar o seu salário”, refere a CI.

A organização católica adverte que “muitas comunidades rurais e as minorias étnicas tiveram de abandonar as suas áreas de origem”.

O relatório ‘Deslocados por um clima em mudança: vozes da Cáritas sobre a proteção e apoio às pessoas em movimento’ resulta da colaboração entre organizações nacionais de diversas regiões.

“Este documento procura contribuir para o debate global sobre como abordar as lacunas existentes em matéria de planeamento, finanças, legislação e proteção política, a fim de evitar a ocorrência de violações dos direitos humanos e das perdas e danos associados”, indica a CI.

Foto: Caritas Internationalis

Cécile Stone, autora principal do relatório, recordou que há 20 milhões de pessoas deslocadas, por ano, devido a eventos meteorológicos extremos, mas há mudanças “lentas”, como o aumento da temperatura dos oceanos, a salinização ou a desertificação, em que é difícil estimar quantas pessoas se deslocaram.

“O número é, provavelmente, muito alto”, apontou, antes de pedir uma ação climática “mais ambiciosa”.

“Há um vazio deixado pelos governos e, em muitos lugares, a Cáritas tenta preencher esse vazio, mas os seus esforços representam uma gota no oceano, em comparação com a magnitude do problema. As pessoas não devem ser deixadas sozinhas, a arcar com os impactos da deslocação”, denunciou.

Foto: Ricardo Perna

Cristina dos Anjos da Conceição, conselheira nacional para Migrações e Refugiados da Cáritas Brasil, assinalou a importância de “dar visibilidade a esta questão, à vida de tantas pessoas que sofrem com esta realidade de serem deslocadas por causa das alterações climáticas”.

A CI anunciou a presença de uma delegação da Cáritas, na próxima cimeira do clima, a COP 28 (30 de novembro a 12 de dezembro), no Dubai, para recordar “aqueles cujas histórias não são ouvidas ou reconhecidas nos fóruns internacionais”.

OC

Moçambique

“Temos de viver aqui na Escola Primária de Manhaua [cerca de 1500 km a norte de Maputo], que oferece abrigo temporário a mim, à minha família e a centenas de pessoas que perderam as suas casas devido ao ciclone e às inundações. Depois deste lugar, não sabemos para onde vamos, porque a minha mãe disse que não vamos voltar para a nossa terra”.

Saludi Dina, 9 anos

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