Homilia do Cardeal-Patriarca na Peregrinação e Ultreia Europeia dos Cursilhos de Cristandade

Que a vitória de Cristo seja a nossa vitória 1. Estamos a celebrar a Páscoa. Este tempo litúrgico sublinha a centralidade de Cristo ressuscitado e da força do Espírito que Ele nos comunica, na vida cristã, toda ela uma epifania da novidade pascal. Nesta celebração é espontâneo procurar a incidência deste mistério na maneira como os Cursos de Cristandade a procuram viver. Comecemos pela oração colecta: “Senhor… que renovais nas águas do Baptismo os que acreditam em Vós, protegei os que renasceram em Cristo…”. O Baptismo é o início da nossa identificação com Cristo ressuscitado. Diz que as suas águas renovam a fé dos crentes, porque lhe dão a dimensão sobrenatural de participação na fidelidade de Deus. É um processo de transformação que só terminará na eternidade: dar à nossa fé, enquanto adesão humana a Jesus Cristo, a qualidade participativa na relação que Deus Pai tem com o Seu Filho. Ser cristão é viver o Baptismo, abandonar-se a essa força regeneradora da água que nos purificou e transformou. Os Cursos de Cristandade são uma pedagogia baptismal: convidam a reviver, num anúncio querigmático, essa novidade inaudita e procuram incentivar a coerência de toda a vida com a graça baptismal. Mas a oração colecta continua: “protegei os que renasceram em Cristo, para que, vencendo todos os ataques do mal, conservem fielmente os dons da vossa graça”. A longa caminhada de fidelidade ao Baptismo é um combate, que podemos vencer com a força do Espírito do ressuscitado. O mal existe, e existe o maligno, que inimigo de Deus e do homem, procura desviá-lo da vida nova que nos foi comunicada no Baptismo. A Sagrada Escritura chama-lhe “o homem inimigo”, “homicida desde o primeiro momento”. É uma ingenuidade perigosa pensar que ele não actua, não faz o seu jogo. Os Cursos de Cristandade propõem uma pedagogia e sugerem uma espiritualidade, ambas marcadas pela decisão corajosa de travar esta luta pela vida. Propõem decisões corajosas e radicais de conversão, numa luta que quer o triunfo da graça, o triunfo de Jesus Cristo, ou melhor, que quer que o triunfo de Jesus Cristo seja o nosso triunfo, na certeza confiante de que, com Ele, podemos vencer essa luta. “Não tenhais medo, Eu venci o mundo”. 2. Para confirmar esta certeza confiante, a leitura dos Actos dos Apóstolos mostra-nos como a Igreja está enriquecida com todos os poderes de Jesus Cristo: como Ele, cura paralíticos e ressuscita mortos. Esta luta é para ser travada em Igreja, com a força da Igreja. Esta é, sempre e hoje mais do que nunca, um Povo em combate. Mas nunca esqueçamos que as manifestações do poder de Deus, na Igreja, é Ele que as decide. Não caiamos num “milagrismo” fácil, como se fossem necessárias maravilhas visíveis, curas e ressurreições dos mortos, para se manifestar o poder de Jesus Cristo, na Igreja. Deus age no coração dos homens e da Igreja e é aí que se manifestam os sinais do Seu poder. Uma conversão sincera, prolongada coerentemente num caminho de fidelidade, é um milagre maravilhoso. Aliás a caridade enquanto participação no amor de Deus é sempre um milagre. Sentimos aí como a descendência de Adão esmagou a cabeça da serpente. 3. Na luta pela fidelidade cristã temos de identificar onde estão as reais dificuldades, causa da nossa fraqueza. Temos de aprender a fazer uma leitura sobrenatural do nosso itinerário cristão. O Evangelho identifica uma dessas dificuldades, talvez a maior, com mais consequências do que as nossas fragilidades naturais: a dificuldade em escutar e seguir a Palavra de Deus. “Muitos discípulos, ao ouvirem Jesus, disseram: «Estas palavras são duras. Quem pode escutá-las»”. E são. A Palavra de Deus é exigente, convida-nos a adoptar na nossa vida os critérios de Deus, nunca esquecendo o que diz o Senhor: “As palavras que Eu vos digo são espírito e vida”. Esta é, talvez, a maior fragilidade da Igreja no nosso tempo: não aprendemos a escutar a Palavra de Deus. E porque nem sequer a ouvimos, não temos a força para acertar o ritmo da nossa vida com o ritmo de Jesus Cristo. Neste Ano Paulino, em que a Igreja se vai reunir em Sínodo para reflectir sobre os caminhos da Palavra de Deus na Igreja, os Cursos de Cristandade, fiéis à sua graça própria, têm de dar esta prioridade absoluta à escuta da Palavra de Deus. Que as vossas ressonâncias sejam sempre ressonância do coração de Deus. É que se não escutarmos a Sua Palavra, a nossa caminhada será conduzida só com critérios humanos, e esses não garantem que a vitória de Jesus Cristo seja a nossa vitória. Santuário de Fátima, 12 de Abril de 2008 † JOSÉ, Cardeal-Patriarca

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