A Eucaristia, sacramento de amor e unidade!
Ao cair da tarde de Quinta-Feira Santa, damos início ao Tríduo Pascal e celebramos a Ceia do Senhor, para fazer memória da instituição do admirável mistério da Eucaristia. Dom gratuito da Santíssima Trindade, a Eucaristia é o maior tesouro espiritual da Igreja, fonte de comunhão e unidade com Cristo e o seu povo.
A Eucaristia é o Pão vivo descido do céu, para alimento da caminhada da nossa vida, como projeto de felicidade e rumo à eternidade em Deus. Cada vez que celebramos a Eucaristia, renova-se nos nossos altares a Ceia de Cristo, todo o seu mistério Pascal de Paixão, Morte e Ressurreição. É a ação sagrada por excelência!
Memorial das maravilhas do Senhor
No Livro do Êxodo escutámos o relato pormenorizado da Ceia Pascal judaica, onde não podiam faltar os pães ázimos e o cordeiro pascal. Memorial das maravilhas do Senhor, a tradicional festa da páscoa judaica evocava o importante evento salvífico da libertação do cativeiro do Egipto. “Esse dia será para vós uma data memorável, que haveis de celebrar com uma festa em honra do Senhor” (Ex 12,13). A Ceia dos judeus prefigurava a Ceia de Cristo, imolado como verdadeiro Cordeiro Pascal. A Eucaristia foi instituída durante a celebração da festa anual da Páscoa, no Cenáculo.
A primeira carta aos Coríntios é o relato mais antigo da instituição da Eucaristia, por volta do ano 56. S. Paulo coloca a Eucaristia no centro do mistério da Igreja e a exigência mais forte da vida fraterna e da comunhão eclesial. “Na verdade, todas as vezes que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, anunciareis a morte do Senhor, até que Ele venha” (1 Cor 11, 26). Comungar o Corpo de Cristo é uma graça e um dever de partilhar a vida e os dons com os irmãos e irmãs. Somos convidados a ser pão partido e repartido, uns para os outros, na nossa vida transformada em oferta de amor, a cada instante. A Eucaristia é um ato de suprema obediência ao Pai e o grande “sinal” do amor inefável e libertador de Deus.
A Ceia do Amor
No Cenáculo, à volta da mesa, os Apóstolos celebram com Jesus a Ceia Pascal. Assistem surpreendidos aos seus gestos e escutam as suas palavras absolutamente novas, palavras de Vida eterna, de Luz e de Amor. Como agradecer ao Senhor todos os dons que Ele nos dá? Com o salmista fazemos ressonância deste salmo: “Oferecer-Vos-ei um sacrifício de louvor, invocando, Senhor, o vosso nome” (Sl 115).
Os gestos de Jesus na última Ceia, são de uma novidade absoluta, dignos da sua condição e poder divino, como Filho Unigénito de Deus, consubstancial ao Pai: Jesus institui a Eucaristia e o Sacerdócio, dá-nos o Sacramento da Caridade. No entanto, na Ceia do Amor, tão ardentemente desejada, pesa a sombra triste da traição de Judas, um dos doze. “No decorrer da ceia, tendo já o demónio metido no coração de Judas Iscariotes, filho de Simão, a ideia de O entregar”. Jesus sabia e já havia anunciado anteriormente que nem todos estavam limpos.
Sacramento de comunhão e unidade
Na última Ceia de Jesus, sobressai o profundo gesto de humildade de baixar-se para lavar os pés aos discípulos. “Eu estou entre vós como quem serve”. A simbologia do lava-pés significa toda a missão de Jesus, a sua Paixão e morte por amor, a sua entrega incondicional a Deus e aos homens.
“Como Eu vos fiz, fazei vós também!” (Jo 13,15). O amor toca a relação e a vida de todos, particularmente dos pobres, dos doentes e excluídos, dos que vivem sós. Jesus convida-nos a estar diante dos nossos irmãos e irmãs carenciados, para os servir, amar e ajudar a erguer. E a sua palavra de Vida eterna ressoa no nosso coração de discípulos: “Dou-vos um mandamento novo, diz o Senhor: Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei (Jo 13,34). O lava-pés, a Eucaristia e o amor fraterno estão intimamente unidos. É o Amor que sobrevive aos dramas da história da humanidade.
No Corpo entregue e no Sangue derramado, Jesus dá-se para ser nosso alimento e para estar sempre connosco. “No pão e no vinho, sob cujas aparências Cristo Se nos dá na ceia pascal (Lc 22, 14-20; 1 Cor 11, 23-26), é toda a vida divina que nos alcança e se comunica a nós na forma do sacramento” (Sacramento da Caridade,8).
A Eucaristia é o sacramento da unidade e comunhão eclesial. Quem comunga o Corpo do Senhor permanece n’Ele. Deve comungar igualmente as alegrias, os sofrimentos e as esperanças dos irmãos, quer os que convivem connosco com laços de parentesco e amizade quer os de mais longe. Na Eucaristia o Povo de Deus encontra força para cam9nhar, amar, perdoar as ofensas, vencer as dificuldades inerentes à vida e construir um mundo novo, mais humano e mais fraterno.
O Papa Francisco, nas catequeses sobre a Eucaristia, sublinha a riqueza e o oceano de graças que recebemos na Missa: “Com a Eucaristia, Jesus liberta-nos da morte física e do medo de morrer, bem como da morte espiritual, que é o mal e o pecado”. No Sacramento do Altar encontramos a plenitude de todos os bens e a esperança escatológica.
Getsémani – Adoração eucarística
O Corpo e o Sangue do Senhor, entregues na Ceia Pascal, continuam na Igreja como sinais do sacrifício perfeito de louvor ao Pai. Na sua última noite neste mundo, o seu sangue começou a ser derramado no Jardim das Oliveiras, durante a oração de Jesus, num “Sim” incondicional ao Pai: “Faça-se a vossa vontade e não a minha”.
“A Igreja acolhe, celebra e adora este dom, com fiel obediência”, afirma Bento XVI. Conforme secular tradição da Igreja, depois da missa da Ceia do Senhor e durante esta noite, continua a solene Adoração Eucarística. O povo de Deus acompanha e responde ao pedido de Jesus, em agonia, no Jardim do Getsémani: “A minha alma está triste até à morte. Ficai aqui e vigiai comigo” (Mt 26,38).
No mistério do sofrimento de Cristo podemos contemplar os sofrimentos da humanidade. Cristo em agonia ensina-nos a rezar incessantemente, quando somos atingidos pelos sofrimentos e dificuldades da vida. Em todos os momentos Ele nos convida a fazer sempre a vontade do Pai.
Unidos a Jesus, Pão vivo descido do Céu, façamos da nossa vida uma Eucaristia perene.
Maria, Mulher Eucarística, rogai por nós!
Funchal, 29 de Março de 2018
†António Carrilho, Bispo do Funchal