Homília do bispo do Algarve no Dia de Páscoa

Irmã e irmãos caríssimos, saúdo-vos a todos fraternamente, com uma referência particular a quantos vos encontrais no Algarve a passar esta quadra festiva, e vos associais a nós na celebração desta Eucaristia, em Dia de Páscoa.

Na Palavra de Deus que acabámos de escutar, encontro, hoje, para todos nós, um triplo convite:

– a celebrar e professar a fé em Cristo Ressuscitado;
– a acolher a alegria e a esperança, frutos da Ressurreição de Cristo;
– ao anúncio de Cristo ressuscitado, apoiados no testemunho pessoal.

  1. Convite à fé em Cristo ressuscitado

O texto de Evangelho de hoje, descreve-nos a agitação, a tristeza e o desencanto de Maria Madalena, quando, de manhãzinha ainda escuro do primeiro dia da semana, verificou que o sepulcro estava vazio e correu a comunicá-lo a Simão Pedro e a João: levaram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde o puseram.

Agitação e surpresa que levou os dois apóstolos a correr para o sepulcro, para verificarem, eles próprios e no sepulcro, a veracidade da notícia que acabam de escutar. Ao chegarem lá, entraram no túmulo e veem o que Madalena já antes havia visto: as ligaduras no chão e o sudário (lençol) enrolado à parte.

Madalena concluiu que tinham roubado o corpo de Jesus: João, sem nos reportar a conclusão a que chegou Pedro, deixa-nos o seu testemunho de fé: viu e acreditou. Não vê Jesus Ressuscitado. Naquele momento, para acreditar bastam-lhe os sinais do sepulcro vazio e as ligaduras e o lençol dobrado à parte. Conclui que o Corpo de Jesus não foi roubado. Ressuscitou tal como tinha anunciado, mais que uma vez na sua vida pública…

Há uma diferença entre o acreditar de João, vendo apenas estes sinais, e o ver para acreditar de Tomé, ou dos dois discípulos que se dirigiam, desencantados e abatidos, para Emaús, que vendo e caminhando com Jesus, só o reconheceram no momento da experiência eucarística (ao partir do pão); ou mais tarde o encontro de Jesus com Pedro junto ao lago, após a pesca milagrosa; ou mesmo a experiência de Paulo a caminho de Damasco para aí perseguir e prender os cristãos: Quem és tu? Eu sou Aquele que tu persegues

Para João bastam as ligaduras e o lençol, como sinal decisivo para a sua fé na ressurreição de Cristo. Pedro e Maria Madalena também os viram… mas só João acredita. Para ele que fizera a experiência da transfiguração no monte Tabor e permaneceu fiel até ao Calvário, quando todos os outros o abandonaram, o negaram ou o traíram; ele que, junto à cruz, recebeu Maria, como sua mãe, basta um pequeno sinal, para acreditar…

João pretende ensinar-nos que deixar-se amar por Cristo e corresponder ao seu amor, se torna caminho que conduz à autenticidade da fé, presente em tantos sinais, que só quem vive esta intimidade consegue passar do ver ao crer, mesmo sem compreender a verdade (Pessoa) em que acreditamos.

A própria fé torna-se caminho de compreensão da verdade revelada: “intellige ut credas, crede ut intelligas”: “eu creio para compreender e compreendo para crer melhor” (S. Agostinho [Tagaste 354-430] Sermão 43). Acredito em tudo o que compreendo, mas não compreendo tudo aquilo em que acredito.

É verdade que a fé conserva sempre um aspeto de cruz, certa obscuridade que não tira firmeza à sua adesão. Todavia, há verdades que se compreendem e apreciam só a partir desta adesão que é irmã do amor, para além da clareza com que se possam compreender as razões e os argumentos. Por isso, é preciso recordar-se de que cada ensinamento da doutrina deve situar-se na atitude evangelizadora, que desperte a adesão do coração apoiada na proximidade, no amor e no testemunho (cf EG 42).

  1. Convite à alegria e à esperança: frutos da Ressurreição de Cristo

Este é o grande convite que a Palavra de Deus nos faz em dia de Páscoa: alegremo-nos e nele exultemos! (Salmo 117 [118])

Porquê? Porque Cristo ressuscitou! Venceu a morte! N’Ele exultemos e nos alegremos, porque a sua ressurreição é garantia da nossa própria ressurreição. Alegremo-nos porque se com Ele morremos com Ele viveremos para sempre!

Sepultados com Ele, na morte, pelo Batismo, com ele ressurgimos para a vida! Pela sua Encarnação assumiu a nossa humanidade, entrou na nossa vida. Com Ele é toda a humanidade que participa da sua vitória sobre o pecado e sobre a morte. A luz que brota da sua ressurreição ilumina a nossa vida com todas a suas vicissitudes; estimula-nos a prosseguir como peregrinos, que sabem que não têm aqui morada permanente; dá um sentido novo ao sofrimento humano; infunde nos nossos corações a alegria e a esperança.

A Páscoa é, verdadeiramente, meus irmãos, a festa da alegria e da esperança! Alegremo-nos e rejubilemos porque Cristo nossa Páscoa, ressuscitou.

  1. Convite ao anúncio, apoiados no testemunho pessoal

Comemos e bebemos com Ele depois de ter ressuscitado dos mortos. Mandou-nos pregar ao povo e testemunhar…

Na 1ª leitura, do livro dos Atos, Pedro faz uma síntese da vida e da identidade de Cristo com o apelo à fé e ao anúncio de Cristo Ressuscitado.

Apesar do caminho que Pedro precisou de percorrer para entender a opção de Jesus, do qual fez parte a sua negação, será o seu testemunho, enquanto chefe dos apóstolos, que vai fundamentar a fé da Igreja na ressurreição e levará a comunidade cristã a proclamar: o Senhor ressuscitou verdadeiramente e apareceu a Pedro.

Meus irmãos, acolhamos com renovada decisão e consciência pessoal, esta ordem de Jesus recordada por Pedro à Igreja nascente: Nós somos testemunhas de tudo o que Ele fez… mandou-nos pregar e testemunhar que Ele foi constituído por Deus, juiz dos vivos e dos mortos.

Aspirar e afeiçoar-se às coisas do alto, para utilizar a expressão de Paulo na carta aos Colossenses, hoje proclamada, significa acompanhar com o nosso testemunho pessoal o anúncio de Cristo vivo e ressuscitado e viver de acordo com a vida nova recebida no batismo. O cristão, inserido no mundo e sem se alhear da missão a que é chamado, não pode perder de vista o fim para que foi criado: “quando Cristo, que é a vida se manifestar, também vós vos haveis de manifestar com Ele na glória.

Toda a ação pastoral na Igreja tem como fonte e ponto de convergência a pessoa de Cristo ressuscitado, rocha imprescindível na construção da vida cristã e de todas as formas de vida na Igreja.

Conclusão

Levemos connosco, meus irmãos, desta Eucaristia Pascal, este triplo convite: à fé em Cristo Ressuscitado; à esperança e à alegria como frutos da Sua ressurreição; ao anúncio da sua ressurreição, apoiados no nosso testemunho pessoal.

Ao acolhermos esta verdade de fé, situamo-nos no coração do Evangelho, núcleo fundamental do qual sobressai a beleza do amor salvífico de Deus manifestado em Jesus Cristo, morto e ressuscitado (cf EG 36).

Levemos a todos esta verdade que hoje professamos, celebramos e testemunhamos. Cristo ressuscitou verdadeiramente, aleluia, aleluia! Feliz Páscoa para todos|

Faro, 01.04.2018
D. Manuel Neto Quintas
Bispo do Algarve

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