Nesta manhã do domingo pascal, os cristãos celebram e anunciam a Boa Nova da Ressurreição de Jesus. Depois de morto na cruz e sepultado, ao terceiro dia ressuscitou e está vivo. Este é o núcleo essencial da fé que proclamamos no Credo. Comecemos por acolher e saborear esta alegria maior que constitui a vitória de Cristo sobre a morte e, por consequência, a afirmação plena da vida e da esperança.
O evangelho desta celebração pascal termina com uma observação de São João, segundo a qual os discípulos «ainda não tinham entendido a Escritura segundo a qual Jesus devia ressuscitar dos mortos». Ele próprio, acompanhado de Pedro, foi testemunha privilegiada do sepulcro vazio. Viu e acreditou e assim entrou no mistério da Páscoa do Senhor.
O acontecimento pascal é o mistério fundamental da nossa fé. Importa que o meditemos para crescermos numa fé mais pascal e assumirmos todos os compromissos a que ela nos chama. Nesse percurso podemos aprender com o evangelho e com os que viveram aquela manhã de Páscoa.
Maria Madalena foi a primeira a ir muito cedo ao túmulo e a verificar que pedra estava rolada e o sepulcro vazio. A atitude daquela mulher é típica de quem, apesar do sofrimento, não se resigna, não desiste. Ficou assustada e preocupada porque não sabia onde estava o corpo de Jesus. Ainda em plena noite, o seu sobressalto foi o primeiro sinal, o indício da novidade que iria irromper.
Celebramos esta Páscoa num contexto em que abundam sinais de guerra, de violência e morte. Para as vítimas um véu negro se abateu sobre as suas vidas e para o mundo o horizonte parece sombrio. Temos a sensação de que o poder do mal parece uma pedra inamovível que fecha a porta à liberdade e condiciona a vida. Na Páscoa de Cristo, porém, celebramos o acontecimento que supera todas as expectativas humanas: a vida suplanta e vence a morte. Uma vivência cristã desta festa há de ajudar todos a serem capazes de ver sinais de luz onde predominam trevas, a perceber e promover sinais de esperança e de reconciliação, onde abunda ódio e destruição.
Segundo o evangelho, Maria Madalena foi partilhar a sua descoberta e contagiar outros com o seu sobressalto. Por isso Pedro e João partiram e foram a correr ao sepulcro. Viram que Jesus já não estava e acreditaram na sua palavra. Os dois discípulos tinham feito um caminho de três anos com o Mestre, e esse parecia ter terminado na cruz. Por isso a corrida até ao sepulcro foi o momento transformador em que tudo parecia de novo fazer sentido, afinal nada tinha sido em vão.
A Páscoa não se pode limitar a um ritual anual mas deve constituir um sobressalto, um despertar que lembre ao mundo que o que parece inalcançável, pode ser real. A humanidade precisa hoje de um sobressalto que a leve a acordar de algum marasmo que tem facilitado que o crescimento de tanto joio. Além dos problemas climáticos e de uma grave pandemia, têm crescido as ameaças à paz, os condicionamentos à liberdade, a desinformação, a desigualdade e a pobreza. É necessário um sobressalto que faça acordar para a urgência de promover um futuro com vida, paz e liberdade. É urgente acordar e acelerar o passo porque já vamos atrasados nesta tarefa.
Para Pedro e João a experiência daquela manhã foi o início de uma etapa nova que já não imaginariam possível. A ressurreição de Cristo originou um verdadeiro renascimento espiritual dos discípulos. Da mesma forma, nós cristãos fomos batizados na Páscoa de Cristo e por isso ressuscitamos com Ele para uma vida nova. A celebração pascal em que fazemos a renovação do nosso batismo deve significar para cada cristão um verdadeiro renascimento. Ele é ainda mais importante porque os últimos meses têm evidenciado a existência de cristãos cansados e acomodados.
O centro da Páscoa é a novidade da presença de Jesus Ressuscitado que nos comunica a sua vida. Ressuscitar com Ele, como sublinha o apóstolo, implica a revisão das nossas aspirações. Como cristãos não nos podemos limitar ao que já temos ou fazemos, precisamos de aspirar ao mais alto. Este «aspirar às coisas do alto» significa que os nossos critérios não se limitam ou coincidem com os do mundo. Aspirar às coisas do alto implica a consciência de que essa é a nossa meta e horizonte que nos motiva; implica um compromisso com os valores e princípios que o Senhor nos ensinou. Aqueles princípios aos quais Jesus foi fiel até ao fim e que o Pai do céu ratificou chamando o Filho de novo à vida. Páscoa é manifestação clara de que o chamamento à paz, ao perdão, à bondade, à misericórdia e à verdade vêm do alto e elevam a humanidade. Só estes valores darão vida plena e a sua negação só trará destruição e morte.
Os discípulos que correram ao sepulcro e acreditaram na ressurreição não mais pararam de correr o mundo a proclamar a Boa Nova. Confirmados com o dom do Espírito, foram enviados a cumprir a missão de anunciar a presença do Ressuscitado. E assim como Jesus foi novidade quando começou a pregar na Galileia, também os discípulos iniciaram um tempo novo, uma missão que surpreendeu e transformou o mundo.
A marca distintiva de Jesus era a de «passar fazendo o bem». Ele é sempre o modelo inspirador para todo aquele que é batizado e por isso discípulo missionário. Nesse sentido a vivência pascal não se limita a celebrar um evento ou a reforçar princípios e convicções mas significa entrar na dinâmica pascal de um cristianismo que não nunca pode parar. Precisamos de cristãos que mexam e se mexam, capazes de falar da sua fé e de a testemunhar no modo como vivem o quotidiano. Não basta defender princípios, afirmar convicções ou refugiar-se em tradições, por mais sagrados que sejam, é necessário que cada cristão os torne patentes na vida concreta. Hoje são necessários cristãos mais pascais, comunidades mais pascais, no fundo, um cristianismo de rosto mais pascal.
Não deixemos extinguir o fogo de vida nova que a Páscoa de Cristo acendeu no meio do mundo. Não escondamos a luz de esperança que a Ressurreição fez brilhar nos corações. Não calemos a mensagem de paz que a presença de Cristo representa.
Cristo Ressuscitou. Aleluia! Santa Páscoa para todos!
Vila Real, 17 de abril de 2022
D. António Augusto de Oliveira Azevedo