Sé de Aveiro, 12 de Maio de 2007. 1.A diocese de Aveiro celebra hoje solenemente Santa Joana Princesa de Portugal, nossa Padroeira. A nossa cidade sempre reconheceu santa Joana como sua protectora. Damos graças a Deus por tão fiel e dedicada protecção. Agradecemos ao Santo Padre Paulo VI que em 1965 no-la deu como Padroeira e louvamos o carinho que a cidade e a diocese lhe manifestam em formas tão belas e em iniciativas tão nobres. A presença de tão numerosa assembleia é a expressão desta dimensão espiritual que nos identifica e caracteriza numa matriz cultural cristã, fonte de valores que assumimos, herdeiros de caminhos percorridos e continuadores de pessoas, iniciativas e instituições que modelaram a alma da cidade que somos. A celebração da solenidade litúrgica de Santa Joana, Padroeira da cidade e da diocese, convida-nos a fazermos uma peregrinação às raízes da nossa história, tão próxima está esta soberana princesa do nosso itinerário como povo, mas ajuda-nos sobretudo a descobrir que são os caminhos do amor a Deus e do serviço à cidade e ao seu povo que mais frutos produzem e que mais perduram no tempo. Com Santa Joana descobrimos que são sempre os caminhos da santidade os que alimentam a alma de um povo e definem o rumo do futuro de uma cidade. Tem todo o sentido recordar o lema da nossa diocese, aprendido na vida e no exemplo de Santa Joana: “Amar a Deus é servir”. 2. A Solenidade de Santa Joana centrada na Eucaristia, celebrada nesta Sé Catedral, aqui tão perto do convento que ela escolheu para viver, trocando o fausto do palácio real pela simplicidade livre de uma vida disponível para fazer o bem, ajuda-nos a reflectir sobre a nossa missão de cristãos ao serviço da cidade. A Igreja faz parte da cidade e não se pode dispensar de se interrogar em permanência sobre a sua missão na cidade. Esta missão consiste essencialmente em estabelecer um diálogo de acolhimento solidário e fraterno e um compromisso de nova e contínua evangelização. A harmonia de uma sã convivência social, o esforço conjunto de um progresso justo e sustentado, o respeito sagrado pela vida e pela dignidade humana, a paz e a segurança com que cruzamos as nossas ruas, a preparação de um futuro feliz para as crianças e jovens, o sentido de gratidão para os que construíram a cidade que somos, o sentido do divino e do transcendente, o lugar de Deus na cidade dos homens passam necessariamente por aqui. O contributo dos santos de que Santa Joana é para Aveiro um exemplo paradigmático foi sempre este: revelar os valores do Evangelho e a alegria de ser Igreja. É este também o contributo que vos quero dar como bispo da Igreja e em comunhão e unidade com todos os cristãos: sacerdotes, diáconos, consagrados(as) e leigos(as). O exemplo de Santa Joana ensina-nos o que o evangelho sempre nos disse: a missão da Igreja nunca foi dominar mas sim humanizar e servir, com particular e fraterno afecto aos mais pobres, esquecidos ou desamparados pela vida e pela sorte. Neste dia solene, o primeiro que vivo convosco, nesta Igreja que o Espírito de Deus me enviou a servir, sinto o dever de dizer aos pobres e aos que sofrem que não receiem bater à porta da Igreja de Aveiro neste limiar do século XXI como o faziam à porta do Convento de Jesus no tempo de Santa Joana. A Igreja, a exemplo de Jesus, o seu mestre e fundador, nunca esgotou a ousadia da caridade, da justiça, do amor e da compaixão. 3.O nascimento de Santa Joana em Lisboa a 6 de Fevereiro de 1452 causou grande entusiasmo e alegria, pois D. Afonso V, seu pai e rei de Portugal não tinha sucessor. Reuniram as Cortes para lhe darem o direito de sucessão e assim ela fora jurada princesa herdeira do reino, o que pela primeira vez acontecia entre nós. Foi-lhe dada educação cristã e nem a morte da Rainha, sua Mãe, D. Isabel, quando ela tinha apenas 4 anos a impediu de continuar a sua formação cristã. Neste ano pastoral dedicado à família gostaria de realçar o valor da vida, o acolhimento sagrado que toda a vida merece e exige, a importância do despertar religioso no seio da família, a educação cristã dos filhos, o ambiente de harmonia e de respeito que consolide o amor fiel e abençoado e o espaço de liberdade para a opção vocacional dos jovens. Santa Joana é modelo desta decisão de liberdade, vencendo constrangimentos, projectos diferentes ou sonhos ambiciosos que outros para ela iam delineando. Foi a sua decisão reflectida, ponderada e corajosa que prevaleceu. Deixou-se guiar pela voz de Deus, sem se perturbar pelos ruídos do mundo nem pelas seduções da Corte. Urge aprender com Santa Joana esta cultura vocacional. Ela anima-nos neste esforço determinado e neste dinamismo corajoso que a Igreja de Aveiro quer imprimir pastoralmente em todos os sectores e a todos os níveis da vida eclesial. Precisamos da sua bênção e sabemos que contamos com a sua protecção. Até porque sabemos que o chamamento de Deus implica uma profunda experiência de fé, uma capacidade de renúncia a si mesmo e transcende os sonhos e os projectos individuais. As vocações surgem ao ritmo da densidade da fé vivida, celebrada, testemunhada e proclamada. A fé alimenta-se da Palavra de Deus e dos sacramentos, sobretudo da Eucaristia. Os dados biográficos de Santa Joana dizem-nos a beleza e a autenticidade da sua fé, falam-nos do tempo dado à oração e da alegria e verdade com que vivia a sua consagração. Ninguém estranha por isso que as pessoas a ela recorressem para sentirem a necessária ajuda de Deus e força e consolação nas dificuldades. 4.Compreendemos, assim, a importância da palavra do Evangelho, hoje proclamado, que Santa Joana assumiu como lema, orientação e sentido de vida e de consagração: “Se alguém quiser seguir-me, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga – Me”(Mt.16,25). Também ela poderia dizer com S. Paulo: “Considero todas as coisas como prejuízo comparando-as com o bem supremo, que é conhecer Jesus Cristo, Nosso Senhor”(Fil.3,8). Mas faz-nos bem ouvir e meditar as palavras do Apocalipse que pela voz de S. João nos diz: ”Eis a morada de Deus no meio dos Homens”(Ap.21,3). Celebrar a Padroeira da nossa cidade e diocese é afirmar com a certeza da fé que nos anima, que Deus estabeleceu morada no meio do seu povo e lhe dá a sua bênção e protecção. Procurarei que os cristãos sejam este rosto de bênção e esta certeza de protecção, através da coerência de vida, da coragem com que defendem e promovem os valores cristãos, da presença discreta mas eficaz na vanguarda das grandes decisões e empreendimentos, da experiência fecunda da oração, do exemplo de famílias sólidas e felizes e da disponibilidade permanente diante das causas do bem. Não esqueçamos que por entre todos estes propósitos sobressai o contributo dado pela Igreja através das comunidades que diária ou pelo menos semanalmente se reúnem para rezar e para celebrar a fé como fermento de renovação e certeza de redenção para a humanidade. “A oração é um força silenciosa de humanização da cidade”. Vamos, por isso, incrementar espaços de oração, promover a abertura ao culto, à oração e à visita as nossas Igrejas e templos cristãos durante mais tempo, garantindo segurança mas oferecendo simultaneamente verdadeiros oásis de espiritualidade onde a fé se alimente e se rejuvenesça. Para que mesmo onde nos parece que escasseiam forças humanas para fazer face a tantas necessidades e resolver complexos empreendimentos não nos falte nunca a confiança que na oração se encontra e reparte. 5. Merecem uma particular referência neste dia em que celebramos uma santa religiosa dominicana, lembrar e agradecer a presença de todas as Comunidades e Institutos de vida religiosa e consagrada da diocese. Eles são a expressão mais próxima da vida e da consagração de Santa Joana que a Igreja nos deu como Padroeira. Que Santa Joana desperte nos jovens de hoje a alegria de descobrir a beleza e o encanto da vocação para a vida consagrada. 6. As atenções do mundo cristão voltam-se, hoje, para o Brasil onde se encontra o Santo Padre Bento XVI, na grande cidade de S. Paulo e no Santuário de Nossa Senhora da Aparecida e os caminhos de Portugal são chão sagrado de peregrinos de Fátima. Queremos viver com todos em comunhão de Igreja esta nossa celebração que assim alarga os seus horizontes à dimensão do mundo e à comunhão da Igreja. Permiti-me que recordando a carta que um dos meus predecessores escreveu em nome de Santa Joana aos jovens vos dirija a vós jovens uma particular saudação com as palavras que o Santo Padre Bento XVI ontem dirigiu aos jovens no Brasil: “Jovens, vivei intensamente a vossa juventude: Consagrai-a aos elevados ideais da fé e da solidariedade humana. Vós jovens não sois apenas o futuro da Igreja. Vós sois o rosto jovem da Igreja e da Humanidade. A Igreja precisa de vós, como jovens, para mostrar o rosto de Jesus Cristo”. 7. Senhor, concede-nos a graça de celebrar dignamente a festa de Santa Joana nossa Padroeira e de descobrir no seu exemplo a fortaleza da fé, a alegria da vocação, o amor a Deus e o desejo de servir generosamente Aveiro e os aveirenses. D. António Francisco dos Santos, Bispo de Aveiro