Euro

A Europa, por razões múltiplas, anda a trabalhar-nos no coração: o festival europeu de futebol de que somos anfitriões, marcado, como todos os desportos, pela magia do imprevisto e pela “liturgia” das multidões em estádio, televisões e rua; as recentes eleições europeias que continuam a merecerem as mais desconcertantes e por vezes contraditórias leituras, deixando clara a distância entre povo e a política; a aprovação genérica da Constituição Europeia que, quase como o futebol, se assemelha a uma cartola surpreendente, com vinte e cinco coelhos, na luta por uma convivência pacífica, ainda que desconfiada. Assim vamos, na alternância do efémero e do perdurável, da estridência emotiva e da construção sólida de um Continente que umas vezes se lamenta de ser velho e outras de estar perdido nas torrentes da modernidade. Os factos não têm todo o mesmo peso e a mesma importância histórica. Um dos riscos que hoje corremos, a nível global, é o de fazermos da história do passado e do presente um pastel sem recorte, profundidade ou perspectiva, simplesmente definido pelo mais vistoso, instantâneo, e pelo que maior alarido produz. Possivelmente essa é a nova reciclagem de que a Europa precisa para colher e distribuir todos os frutos dum passado bimilenar que a gerou, moldou e intimamente a sustenta. Parte da África e muito da Ásia se foram revelando ao longo do tempo. As Américas – segundo algumas versões – entraram no mapa por mero lapso de Colombo ao tentar rumar para as Índias. A Europa, com tudo isso foi aprendendo, com as virtudes e defeitos de Jerusalém, Roma, Bizâncio, monges, descobridores, missionários, santos, doutores, sábios, poderosos, alianças e guerrilhas, choques de poderes, artes e ciências em escolas permanentes de humanidade e fé. Não pode, neste momento, por um acomodamento disfarçado a leis do mercado, dobrar-se a oportunismos fruto, alguns, de histerismos de pseudo intelectuais que fabricaram teorias para consumo próprio. A Europa é muito mais que tudo isso e traz inscrita na alma uma nobreza que é muito mais que um império. Recusar-lhe a matriz cristã é negar-lhe a identidade. A União Europeia dos Vinte e Cinco é um grande passo de coragem e esperança para o futuro. Só possível pela grandeza da sua história espiritual. Importa nunca esquecer ou rejeitar essa semente, a mais sólida e perdurável do velho continente. As velhas ementas dos conventos são, inequivocamente, mais saudáveis que os hambúrgueres e seus congéneres. António Rego

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